Bolsonaro enfrenta dificuldades pouco usuais para aprovar medidas provisórias
Por vias tortas, o sucesso em editar e aprovar medidas provisórias se tornou indicador da capacidade do presidente da República de comandar a agenda nacional.
Em teoria destinadas a providências urgentes e relevantes, as MPs entram em vigor de imediato, mas perdem a validade se não forem aprovadas pelo Congresso em até 120 dias. Na prática, servem de atalho para criar todo tipo de legislação a gosto do Palácio do Planalto.
Empregadas quase sempre de modo abusivo, consomem parcela expressiva das atividades do Parlamento —não sem a cumplicidade de deputados e senadores que incluem nos textos em tramitação artigos de seu interesse.
Por essa métrica um tanto espúria, o desempenho de Jair Bolsonaro (PSL) se mostra sofrível. Nas duas últimas semanas, o governo enfrentou dificuldades pouco usuais para articular a votação de uma dezena de MPs, a maior parte editada ainda sob Michel Temer (MDB).
Entre elas, duas propostas importantes, ambas de 2018, ficaram pelo caminho —um ajuste na regulação do setor de saneamento, meritório, e uma flexibilização das regras do Código Florestal, levada a um excesso pernicioso pela atuação da bancada ruralista.
Na MP 870, que reorganizou os ministérios a partir de 1º de janeiro, o Executivo teve de abrir mão da ideia de transferir o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) da área econômica para a pasta da Justiça.
Por fim, a medida provisória que institui um promissor programa de combate a fraudes nos benefícios da Previdência foi aprovada na noite de segunda (3), a pouco mais de três horas do fim de seu prazo.
Podem-se atribuir os percalços à resistência de Bolsonaro em participar do que chama de “velha política” nas negociações com os partidos. O mandatário, entretanto, em nada inova no furor legiferante, similar ao dos antecessores.
Nos primeiros cinco meses de mandato, editou 14 medidas provisórias, além de decretos questionados por invadir competências do Congresso —como o que ampliou o porte de armas.
Parlamentares, por sua vez, ensaiam assumir maior autonomia diante de um governo avesso à composição. Como noticiou esta Folha, apresentou-se no Senado proposta para fixar um teto de cinco MPs por ano, que não poderiam tratar de temas já contemplados por projetos de lei em tramitação.
Essa não é, porém, a forma mais inteligente de lidar com o problema. Não há como descartar, afinal, que em determinado período surjam mais emergências a demandar, de fato, providências imediatas.
Recorde-se que deputados e senadores já dispõem da prerrogativa de rejeitar MPs não consideradas relevantes ou urgentes. Tal prática deveria ser normal em um Legislativo que abandonasse a tradição de subserviência interesseira.
Nenhum comentário:
Postar um comentário