- Folha de S. Paulo
Enquanto isso, governo faz espuma no Congresso e ora pela reforma da Previdência
Qual foi a última vez que você leu a formulação “Em novo embate entre a ala militar e os olavistas do governo...”? Faz tempo, ao menos dentro da perspectiva da realidade distorcida por esse buraco negro que se chama gestão Jair Bolsonaro, no qual semanas duram meses.
Objetivamente, salvo uma rusga aqui e outra ali, uma trégua intranquila se mantém ativa desde o episódio em que os militares da ativa convocaram o venerando general da reserva Villas Bôas para enquadrar o ideólogo Olavo de Carvalho —o que significou, na prática, buscar pôr freios na primeira-família que finge reger o Brasil a partir de redes sociais.
O resultado, como se sabe, acabou num meio-termo ruim para os militares. Bolsonaro acabou passando a mão na cabeça do escritor atormentado de Virgínia, e os militares engoliram a seco.
O silêncio que se percebe decorre dessa interrupção de artilharia, mas não de um armistício. As feridas estão abertas e ainda deverão gerar inconvenientes, ainda que efetivamente Olavo tenha recolhido seu arsenal de impropérios por ora.
Uma das principais vítimas do processo foi o general Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional), visto entre os homens da ativa como alguém que poderia ter contido o chefe com conselhos. Seu prestígio de Golbery do governo caiu um tanto —teve de endossar os atos a favor do governo do dia 26 de março após buscar tirar Bolsonaro da linha de frente deles.
No Alto Comando do Exército e entre generais da reserva com assento no governo há uma sensação generalizada, explicitada em um sem-número de mensagens eletrônicas trocadas todos os dias, de que o núcleo olavista está apenas esperando para dar o bote novamente em alguma área afeita aos fardados.
Enquanto isso, brincam alhures. O pessoal protagoniza histrionismos, como a dancinha do guarda-chuva do inacreditável titular da Educação. Existem poucos lugares em que a visão de mundo deformada do grupo pode fazer tanto estrago quanto no MEC; a reação das ruas à esquerda, mas não só, é um sinal desse impacto.
Com o foco da confusão transferido para a relação Planalto-Congresso (onde está mesmo o tal pacto de Poderes?), voltamos a um certo feijão com arroz. Qualquer coisa do interesse do Planalto que passar em votação será vendido pela Bolsosfera como prova do triunfo da vontade popular. Derrotas, mesmo pontuais, anunciarão um apocalipse ao resto da plateia.
Enquanto a aliança protagonizada pelo mercado faz um esforço hercúleo para ver aprovada a reforma da Previdência, algo que parece ter voltado aos trilhos após o alerta de hecatombe de duas semanas atrás, o governo vai gerando espuma. Como no caso das mudanças relativas ao trânsito, um amontoado que une banalidades a propostas de fato perigosas ao bem comum. Com sorte, terá o destino de produtos análogos: borbulhar e sumir.
É uma dinâmica frágil, como são governo e oposição neste momento. O silêncio militar busca a retomada de um papel de instância moderadora, algo que vinha sendo depredado desde a adesão efetiva ao governo Bolsonaro, num momento em que o Judiciário se expôs indevidamente com a empolgação de Dias Toffoli no episódio do tal pacto.
Para bem e para mal, não parece uma situação fadada a ser perene.
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