No alinhamento entre Trump e Bolsonaro, convém examinar as intenções americanas
Embaixador em Washington e depois chanceler no início da ditadura militar de 1964, Juracy Magalhães cunhou uma frase que se tornaria perene na discussão em torno das relações com a superpotência: “O que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil”.
Nem mesmo os presidentes das etapas posteriores do regime concordavam muito com o postulado, fosse devido a suas inclinações ao intervencionismo econômico, fosse por simples desconfiança.
Afinal, desde a chamada Doutrina Monroe, no século 19, os EUA veem as Américas como sua área de influência natural.
O relacionamento seguiu dinâmica oscilante desde então. Entretanto Jair Bolsonaro (PSL) é explícito ao pregar a reversão do antiamericanismo que teria dominado a política externa brasileira nos 13 anos de governos petistas.
Tal guinada já começara no governo de Michel Temer (MDB), e Bolsonaro vendeu joio com trigo: se de fato havia ranço esquerdista no Itamaraty lulista, o mundo unipolar pós-Guerra Fria se transmutava e exigia novas alianças. A questão era mais de dosagem.
De todo modo, soam como música para o bolsonarismo, a lidar com declarações ruinosas do presidente, os recentes movimentos do congênere Donald Trump.
Primeiro, o republicano abriu negociação para um tratado de comérciocom o Brasil. Depois, confirmou o país como aliado militar preferencial fora da Otan, a aliança ocidental que lidera.
A negociação comercial é da maior relevância para uma economia ainda muito fechada. Mas há detalhes a serem observados.
Num mundo em que EUA e China se digladiam, como as novas tarifas sobre importações vindas de Pequim evidenciam, as commodities e mesmo o mercado interno potencial do Brasil se colocam como ativo a ser disputado.
Note-se, por exemplo, que o secretário de Comércio americano, Wilbur Ross, levantou dúvidas sobre a exequibilidade do tratado Brasil-EUAcaso seja aprovado no todo o acordo encaminhado entre Mercosul e União Europeia.
Não será descabido suspeitar que os americanos tenham interesse em ver o acordo com a Europa naufragar, em favor de melhores condições para si.
Já a aliança militar traz uma série de oportunidades, mas que por ora são apenas teóricas. A Argentina passou anos com tal status e viu suas Forças Armadas definharem com o resto do país.
E há o risco, exacerbado pelas inclinações militaristas do clã Bolsonaro, cujo filho Eduardo foi indicado para ser justamente embaixador em Washington, de subserviência aos interesses de Trump na região —crise na Venezuela à frente.
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