- O Globo
O procurador-geral da República menosprezou o dossiê que fichou professores e policiais antifascistas. O relatório secreto do Ministério da Justiça listou três acadêmicos e 579 agentes de segurança pública. “Parece ter havido um alarme falso, talvez um exagero”, desdenhou Augusto Aras.
No julgamento de ontem, o chefe do Ministério Público voltou a se comportar como advogado do governo. Segundo Aras, ninguém foi prejudicado ou teve a privacidade invadida. Assim, o Supremo Tribunal Federal não teria motivo para se dedicar ao assunto.
“Relatórios de inteligência são comuns e rotineiros”, comentou o procurador, que foi indicado ao cargo pelo presidente Jair Bolsonaro. Só faltou exigir que os espionados pedissem desculpa pela espionagem de que foram vítimas.
“A fala do Aras é absurda. Eu fui prejudicado, sofri uma exposição grotesca”, diz Paulo Sérgio Pinheiro, que comandou a Secretaria Nacional dos Direitos Humanos no governo FH. “Trabalho na ONU há 25 anos e de repente fui citado, no meu país, como alguém capaz de praticar atos criminosos”, protesta.
O professor afirma que o dossiê o deixou numa situação “muito desagradável”. “Aos 76 anos, não pensei que fosse voltar a enfrentar isso no Brasil”, desabafa. Ele integrou a Comissão Nacional da Verdade, que investigou crimes da ditadura militar e despertou o ódio do então deputado Bolsonaro.
O antropólogo Luiz Eduardo Soares também viveu uma experiência amarga ao saber que foi fichado pelo governo. “Minha sensação foi de falta de chão. Como se o que nos garante a liberdade e a estabilidade de repente desaparecesse, e tudo se tornasse possível”, descreve.
A ministra Cármen Lúcia farejou o cheiro do autoritarismo no dossiê. Ontem ela votou pela proibição de relatórios e informes “de cunho inquisitorial” que reúnam informações sobre a vida privada e as opiniões políticas de cidadãos.
“Triste termos que voltar a este assunto quando já se acreditava ser apenas uma fase mais negra da nossa História”, lamentou.
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