Há
uma vaga aberta no País para uma liderança de credibilidade
O
eleitorado terá seu momento de decisão nos Estados Unidos em apenas duas
semanas. Minha expectativa é de uma derrota decisiva de Trump. Há razões
importantes para isso.
Em
primeiro lugar, sua política para a economia doméstica foi um grande fracasso.
Sob o governo Trump, a expansão funcionou bem até esse ano, por um motivo
significativo. O déficit fiscal federal seguiu alto durante o mandato dele,
possibilitando uma alta no consumo e a construção de novas habitações.
Mas,
com os juros mantidos em patamares baixíssimos, não havia problema nisso. A
inflação foi trivial. A lógica pedia um auxílio federal maior para o terceiro
trimestre, como anteriormente nesse ano, mas ele não conseguiu fazer com que o
senado republicano agisse. Eles preferiram concentrar suas atenções na vaga
para a Suprema Corte.
Em
segundo lugar, sua política externa apresentou pouco progresso. Trump pareceu
atraído principalmente por ditadores estrangeiros, e seus assistentes (uma
equipe que ele renovou várias vezes) jamais conseguiram acompanhar sua
insistência em glorificar-se publicamente. Seja ao lidar com a Coreia do Norte,
com a China, as Filipinas, Arábia Saudita, Turquia, Ucrânia, Rússia e outros
países, ele pensou que seu estilo simplista de administração invariavelmente
funcionaria. Em se tratando da Europa Ocidental e da Otan, ele ofereceu pouco
de positivo – além de seus campos de golfe, quem sabe.
Em
terceiro lugar, suas preferências em termos de políticas sociais foram
abomináveis. A atitude em relação aos imigrantes foi desprezível. Todos lembram
da incapacidade de Trump de estabelecer um consenso quanto às etapas viáveis
positivas para reduzir o crescente fluxo de imigrantes, e do seu interesse na
deportação forçada. Mas a questão do desejo por uma melhoria no ensino não pode
ser tirada do quadro. A questão da restauração do foco em sistemas públicos de
qualidade em todo o país não é trivial, seja para o ensino dos jovens ou
daqueles em idade universitária.
Por
outro lado, os americanos quase pobres fracassaram feio em acompanhar os ricos,
beneficiados por impostos muito mais baixos. Eles não receberam novo
treinamento para desenvolver habilidades para novas ocupações. É claro que se
trata de um problema desafiador, mas uma questão que pouco preocupou Trump.
Em
quarto lugar, sua incapacidade de compreender a necessidade de uma política
coerente de saúde remonta ao seu ódio em relação ao Obamacare. O nome em si era
suficiente para irritá-lo profundamente e provocar sua insistência em
substituir o programa por algo menos caro e infinitamente melhor. Mas há
claramente um problema. Atualmente, os EUA gastam cerca de 18% do PIB em
atendimento de saúde, muito mais do que outros países desenvolvidos. Mas os
americanos não têm cobertura universal.
Mudanças
são necessárias. Se não ocorrerem, o gasto seguirá aumentando conforme a média
etária continua subindo. O mesmo vale para novos arranjos para o financiamento
dos pagamentos de seguridade social, situação na qual, seguindo a mesma mudança
demográfica da média etária, o sistema será incapaz de garantir o pagamento de
benefícios cada vez maiores. Em ambos os casos, Trump (e o Partido Republicano)
jamais chegaram sequer a apresentar um plano convincente.
Em
quinto lugar e, talvez, resumindo os demais pontos, a visão de Trump do poder
presidencial como janela de oportunidade para ganhos materiais para seus
parentes mais próximos não é a qualidade de liderança executiva exigida. Sua
insistência maníaca nas mentiras - a contagem oficial já passou de 20 mil -
sugere a necessidade de tratamento psiquiátrico, e não de uma reeleição.
O
Brasil também terá pela frente uma eleição no mês que vem, mas envolvendo o
nível municipal e um terço do Senado. Como Bolsonaro decidiu criar um novo
partido no ano que vem, seu envolvimento tem sido modesto, porém crescente nas
semanas mais recentes. Após a conclusão do pleito, certamente haverá mudanças
no nível federal como preparativos para 2022.
Bolsonaro
reteve (e até melhorou) sua aprovação popular em pesquisas recentes. A maioria
das estimativas para o ano que vem no Brasil mostram a expectativa de um
crescimento de 3% a 4% do PIB - muito melhor do que os 5% de declínio previstos
para esse ano. Mas, para tanto, pode ser necessário um desempenho melhor na
Europa e nos EUA, coisa que as novas quarentenas motivadas pelo retorno do
coronavírus talvez impeçam. China e Índia certamente crescerão bastante.
Será
que o desempenho econômico melhorado servirá como alavanca para as esperanças
de Bolsonaro quanto à sua reeleição? Não necessariamente. Muito vai depender do
quanto essa melhoria for parte de uma estratégia articulada de prazo mais
longo, ou apenas uma recuperação cíclica seguida por crescimento medíocre.
Ainda sabemos pouco a respeito de quem vai dirigir a transformação do comércio
encolhido para o comércio expandido, do consumo para o investimento, da
expansão em novas áreas de investimento coordenado como parte da globalização.
Por outro lado, o nível de endividamento e os déficits fiscais funcionarão como
novas distrações.
Cada
vez mais, essas questões virão para o primeiro plano conforme a atividade se
recupera mais plenamente e a doença alcança possíveis novos patamares com o
público correndo para as praias e a primavera se transformando em verão. Há uma
vaga aberta para uma liderança de credibilidade. / Tradução de Augusto
Calil
* Economista e cientista político, professor emérito nas universidade de Columbia e da Califórnia em Berkeley.
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