Ao contrário de 2018, a eleição atual não produzirá surpresas
Há
nas nossas eleições
municipais uma característica singular —que não é exclusividade do
nosso país— já investigada a fundo por pesquisadores, conhecida como “desvantagem
do incumbente”.
O
efeito é contraintuitivo pois o ocupante de um cargo pode utilizar os recursos
diversos que dispõe —desde assessores à própria máquina pública— na disputa
eleitoral. Isto explicaria as “taxas soviéticas” de reeleição para muitos
cargos eletivos: em 2018, na Câmara dos Deputados nos EUA, a taxa de reeleição
alcançou 96,7% (e ainda mais alta no nível local).
São
múltiplos os fatores que explicariam as desvantagens para os incumbentes: nas
democracias novas os que alcançaram o cargo sob o antigo regime gradativamente
perdem poder; há muitas necessidades insatisfeitas; os partidos fracos são
pouco informativos, convertendo a performance individual dos políticos na
principal pista para o voto etc.
Nas
eleições municipais deste ano, 3.082 prefeitos tentam a reeleição (55,3%
do total), e só podem fazê-lo uma vez. Em 2016, 2.708 tentaram e pouco menos da
metade —1.270, ou 46,8%— tiveram sucesso. Para os vereadores o quadro é mais
vantajoso: 2/3 lograram reeleger-se.
Neste
ano o quadro pode mudar: podemos esperar excepcional vantagem pró ocupantes do
cargo. Sim, este é mais um dos efeitos da pandemia.
São
várias as razões: o efeito “união de todos contra a emergência” beneficia quem
já está no poder; os atuais incumbentes desfrutam de enorme exposição na mídia;
lockdowns são obstáculos para os desafiantes; a campanha será mais curta.
Há
também fatores negativos: situações de calamidade funcionam como lente de
aumento sobre os ocupantes do poder executivo (não
vereadores).
A
maior vigilância se traduz em maior punição ao mau desempenho e mais premiação
ao bom: os resultados dependerão do contexto.
O
resultado líquido dessas forças contraditórias será que provavelmente os
incumbentes terão mais vantagens que desvantagens, revertendo a tendência
contrária.
Há
no entanto uma variável nova na atual eleição cujo efeito é difícil de
estabelecer: a proibição das coligações proporcionais. Ele já pode ser
observado na redução de partidos na disputa eleitoral. O número médio de
partidos passou de 14 para 7, como mostrou
Guilherme Russo (FGV).
Por
outro lado, o número de candidatos aumentou em 10% na média, e muito mais que
isso nos municípios grandes, porque agora os partidos têm que alcançar o
quociente eleitoral sozinhos, sem coligar-se.
A
mudança já produziu também expressiva
migração dos pequenos para os grandes partidos. Ao contrário de 2018,
trata-se de reacomodação profunda, mas sem rupturas.
*Marcus André Melo, professor da Universidade Federal de Pernambuco e ex-professor visitante do MIT e da Universidade Yale (EUA).
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