Por
Alvaro Gribel (interino)
A
inflação subiu em má hora e voltou a preocupar. O país ainda vive o pior da
recessão no mercado de trabalho, mesmo que tenha atenuado parte de seus efeitos
com as políticas de governo e o auxílio emergencial. Os preços sobem nos
produtos que os pobres mais consomem. Os índices do atacado dispararam, criando
um problema no mercado de imóveis alugados que só será superado com muita
negociação. A inflação acelera num momento de dúvida sobre os juros futuros. De
um lado, a economia precisa de estímulos, de outro, os sinais confusos do
governo na área fiscal pressionam o custo da dívida. O IPCA está baixo, mas a
natureza desta inflação, a hora em que ocorre, o peso sobre os alimentos, tudo
isso se tornou um complicador.
A inflação de setembro foi a mais alta para o mês desde 2003. Se a análise sobre os índices de preços não pode se concentrar no dado de um único mês, também não dá para ignorar o que diz a trajetória. E a taxa acumulada em 12 meses também voltou a acelerar. Saiu de 1,88% em maio para 3,14% em setembro. É verdade que está bem abaixo da meta do ano, de 4%, mas esse movimento surpreendeu os economistas e deve aumentar a cautela do Banco Central. A possibilidade de um novo corte da Selic já era baixa e agora ficou praticamente descartada. Ontem foi dia de revisões para cima nas projeções de inflação em bancos e consultorias.
Os
alimentos foram responsáveis por mais de 70% da inflação de setembro. Isso tira
renda das famílias porque são itens essenciais de compra. Mas os economistas
dizem que esse choque será temporário e tem pouca capacidade de se espalhar
para outros produtos. Ou seja, está muito concentrado, o que é uma boa notícia.
Ainda assim, o departamento econômico do Bradesco chamou atenção para a
inflação dos serviços, que saiu de -0,47% em agosto para 0,17% em setembro.
Esse dado será monitorado com lupa nos próximos meses.
Em
situações normais, a inflação no patamar atual preocuparia pouco, porque a taxa
em 12 meses permanece abaixo da meta. Mas ela ocorre em uma conjuntura de piora
dos indicadores fiscais, de aumento do dólar, risco de rompimento do teto de
gastos e estresse de vários ativos financeiros. Já não se trata apenas de
números ligados à bolsa de valores, mas sim de aumento do custo da dívida do
Tesouro. Nessa circunstância, voltar a falar de inflação é tudo que o Brasil
não precisava.
Risco de
indigestão
O
gráfico mostra a inflação dos alimentos em domicílio.Pelas projeções do banco
ABC Brasil, ela vai continuar acelerando em 12 meses, até 18,71% em novembro,
para fechar ao ano em 14,11%. Muito elevada.
Emprego prejudica Trump
A
economia americana sempre surpreendeu na abertura de vagas em períodos
pós-crise, mas isso não está acontecendo agora. Segundo levantamento do
economista Marcel Balassiano, do Ibre/FGV, as duas principais pesquisas de
emprego nos EUA mostram que o país perdeu cerca de 20 milhões de vagas, mas só
recuperou em torno de 11 milhões. Esses dados podem atrapalhar as chances de
reeleição do presidente Donald Trump. No mercado financeiro, uma vitória
folgada de Biden também seria bem recebida, porque diminui a chance de Trump
questionar o resultado judicialmente. O pior cenário seria uma vitória apertada
do democrata. Isso poderia estressar as bolsas.
Nem
pensar
O mercado financeiro não quer nem ouvir falar na prorrogação do auxílio emergencial no ano que vem. Pelas palavras de um gestor, a reação seria “horrorosa” caso o governo e o Congresso acionem novamente o orçamento de guerra, dentro do pacto federativo, para driblar o teto de gastos. De um jeito ou de outro, a despesa irá pressionar o déficit e a dívida bruta, ainda que legalmente não descumpra a regra do teto.
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