“O
medo de ser superada por Atenas, levou Esparta à guerra”, afirmou o general e
historiador ateniense Tucídides, que viveu entre os anos 460 e 400 a.c. Sua
principal obra, “História da Guerra do Peloponeso”, tornou-se um clássico por
sua preocupação com o exame cuidadoso dos fatos, o que não era costume à época.
Ele
ainda foi precursor da imunização ao notar que os atenienses que caiam doentes
numa pandemia, numa segunda rodada ficavam imunes. A armadilha de Tucídides
pode ser usada na interpretação das causas das guerras, a exemplo da I Guerra
Mundial, que opôs Inglaterra e França à ascensão vertiginosa da Alemanha, a
Guerra do Paraguai ou, ainda, ao longo conflito entre os Estados Unidos e a
União Soviética, que só não desandou numa guerra, devido ao risco de destruição
mútua, via confronto nuclear.
No
presente, estamos assistindo a algo similar no confronto entre a China e os
Estados Unidos, líder global crescentemente desafiado pelos chineses, nos
campos bélico, econômico e tecnológico. Em “Destinados à Guerra”, Graham Wilson
afirma que o que definirá a ordem mundial futura é se os EUA e China
conseguirão evitar cair na armadilha de Tucídides.
Já
Henry Kissinger, no último capítulo do seu livro “Ordem Global”, espera que as
duas nações ainda possam cooperar entre si. No passado, nações conseguiram
escapar de serem tragadas pelo confronto em situação semelhante, ao custo de
ajustes compulsórios que exigiram extraordinária energia e liderança política,
internamente e entre o desafiante e o desafiado.
Foi
o caso de Portugal e Espanha no século XV. À época, o Império Espanhol ampliava
seu poder e influência nas rotas de comércio do mundo, ameaçando a liderança
portuguesa. A saída foi alcançada com a mediação papal e os líderes das duas
nações cumprindo limites negociados, a exemplo da Bula Inter Coetera e o
Tratado de Tordesilhas.
No
quadro atual, a diplomacia brasileira deveria manter-se equidistante, buscando
cooperar para evitar o choque que se prenuncia, maximizando ganhos para nossas
posições e obtendo vantagens nas mesas de negociação.
Mas
não. Aferra-se a uma dependência submissa à política externa dos EUA, causando
prejuízos ao interesse nacional, obtendo quase nada em termos bilaterais e de
comércio, em detrimento do nosso principal parceiro comercial, a China.
Nós
nos tornamos reféns da armadilha de Tucídides deles.
*Raul Jungmann - ex-deputado federal, foi Ministro do Desenvolvimento Agrário e Ministro Extraordinário de Política Fundiária do governo FHC, Ministro da Defesa e Ministro Extraordinário da Segurança Pública do governo Michel Temer.
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