A
Amazônia não está em chamas. O aquecimento global é uma ficção. O Brasil nunca
teve ditadura. A Covid é só uma gripezinha. Não há mais corrupção no governo.
Na
sexta-feira, o vice-presidente Hamilton Mourão deu uma nova contribuição à
galeria de mentiras oficiais. “No Brasil não existe racismo. Isso é uma coisa
que querem importar”, afirmou o general.
O
negacionismo é um dos pilares do bolsonarismo. O capitão e seus aliados travam
uma guerra permanente contra a verdade. Não se trata de discordar do
politicamente correto. A ordem da extrema direita é desacreditar os fatos, a
ciência e as instituições que fiscalizam o poder: imprensa, universidades,
organizações não governamentais.
Mourão
negou a existência do racismo no Dia da Consciência Negra, criado para lembrar
o que figuras como ele tentam esconder. Neste ano, a data foi banhada de
sangue. Na véspera do feriado, dois seguranças brancos espancaram um homem
negro até a morte numa filial do Carrefour em Porto Alegre.
A
negação do racismo é coerente com o histórico de declarações do general. Em
agosto de 2018, ele culpou a miscigenação por uma suposta aversão dos
brasileiros ao trabalho.
“Temos
uma certa herança da indolência, que vem da cultura indígena. Eu sou indígena.
Meu pai é amazonense. E a malandragem, nada contra, mas a malandragem é oriunda
do africano”, afirmou, numa palestra em Caxias do Sul.
Dois
meses depois, Mourão fez uma piada racista ao elogiar a aparência do neto. “Meu
neto é um cara bonito, viu ali? Branqueamento da raça”, disse, em Brasília.
O
crime do Carrefour escancara o que hoje é chamado de racismo estrutural. João
Alberto Silveira Freitas pode não ter sido morto por ser negro, mas
provavelmente estaria vivo se fosse branco. Brasileiros pretos e pardos sabem o
que é entrar numa loja e serem tratados como suspeitos em potencial. Estão mais
expostos a revistas, humilhações e espancamentos.
A
rotina de discriminação se reflete nas estatísticas da violência. Negros têm
2,7 vezes mais chances de serem assassinados, informa o Fórum Brasileiro de
Segurança Pública. Representam 56% da população e 74% das vítimas de homicídio
doloso no país. Oito entre dez brasileiros mortos pela polícia são pretos ou
pardos. João Alberto foi espancado até a morte por um PM e um segurança
particular.
O
racismo sempre esteve entre nós, mas agora se instalou no gabinete
presidencial. Bolsonaro já responsabilizou os negros pela escravidão, chamou a
política de cotas de “coitadismo” e equiparou quilombolas a animais que têm o
peso medido em arrobas. A Procuradoria-Geral da República o denunciou por crime
de racismo, mas o Supremo arquivou o caso às vésperas da eleição de 2018.
Cada ofensa que permanece impune vira um novo incentivo à violência. No poder, o capitão entregou a Fundação Palmares a um provocador profissional, cuja única tarefa é atacar ativistas negros. O general Mourão não está na Vice-Presidência por acaso. Apesar das divergências eventuais, ele é um legítimo representante da turma.
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