Casos
de grande comoção às vésperas de pleitos podem influenciar o voto
Casos
como o assassinato
de João Alberto Silveira Freitas, de 40 anos, por espancamento seguido de
asfixia numa loja do Carrefour em Porto Alegre,
ocorrido na última quinta-feira, quando acontecem próximos de eleições,
costumam ter o condão de virar tema das campanhas e mobilizar setores do
eleitorado.
O exemplo recente mais rumoroso vem dos Estados Unidos e tem muitos pontos de contato com o caso João Alberto: foi o assassinato de George Floyd por asfixia por policiais em Minneapolis, em maio. Lá como aqui, a ação dos assassinos foi filmada. A frase repetida por Floyd, “I can’t breath”, que significa “Eu não posso respirar”, virou mote de manifestações que cobriram o país.
O
movimento Black Lives Matter, ou Vidas Pretas Importam, surgido anos
antes, ganhou dimensão nacional e deu força a grupos locais, que tiveram grande
engajamento nas eleições presidenciais e peso real na vitória de
Joe Biden sobre Donald Trump em Estados como a Geórgia.
No
Brasil, os casos mais conhecidos de comoção nacional às vésperas de pleitos são
a greve da siderúrgica CSN em Volta Redonda, em 1988, e o massacre do
Carandiru, em 1992, em que 111 presos foram chacinados pela Polícia Militar
para conter uma rebelião.
No
primeiro, operários da Companhia Siderúrgica Nacional, ainda estatal, entraram
em greve por reajuste salarial e redução de jornada e tomaram a planta de Volta
Redonda (RJ). Quatro dias depois do início da greve, em 9 de novembro, o
Exército e a PM invadiram a empresa e três grevistas foram assassinados.
As
eleições municipais nas capitais ocorreram no dia 13 e, em São Paulo,
venceu Luiza
Erundina, feito inédito do PT numa capital. As pesquisas até as
vésperas apontavam vitória tranquila de Paulo Maluf, e cientistas
políticos e historiadores veem grande peso de Volta Redonda na virada.
Quatro
anos depois, o massacre do Carandiru ocorreu na noite de 2 e outubro,
a sexta-feira anterior à eleição. Ali, no entanto, a tragédia não teve
influência no pleito, porque a Secretaria de Segurança Pública abafou os dados.
Paulo Maluf venceu e o candidato do governador Luiz Antonio Fleury Filho,
Aloysio Nunes Ferreira, ficou em terceiro lugar.
E
agora, como o caso João Alberto vai ecoar nas urnas? Em Porto Alegre,
onde ocorreu o assassinato, Manuela D’Ávila (PC
do B) enfrenta uma eleição dura, em que foi, ao longo de toda a
campanha, alvo de ataques ferozes dos adversários e agora aparece nas pesquisas
em desvantagem em relação a Sebastião Melo (MDB).
Ela se engajou de imediato nos protestos pela morte de João Alberto.
Em São
Paulo também pode haver influência do crime. Foi aqui que ocorreu o maior
protesto depois do assassinato, com o quebra-quebra numa loja do Carrefour nos
Jardins. Guilherme
Boulos não participou. O candidato do PSOL tem
lutado na campanha contra a pecha de “radical”. As urnas
mostraram que candidaturas em defesa de direitos civis, equidade e diversidade
encontraram um eleitor disposto a investir nessas agendas, antes
tachadas pejorativamente de “politicamente corretas” ou “identitárias”.
A
sanha com que Jair
Bolsonaro oprimiu minorias, ou mesmo maiorias sem
representatividade política, provocou reação oposta dois anos depois de sua
eleição. No caso João Alberto, o presidente
só se manifestou 24 horas depois, para negar racismo no ocorrido e
sem mencionar o nome da vítima nem se solidarizar com sua família.
Os próximos dias vão mostrar se o caso João Alberto vai virar tema central da campanha ou se os protestos vão perder fôlego. E o que terá mais peso: o voto de protesto contra a recorrência de fatos como esse ou a reação maior de parte da sociedade ao que ela chama de “vandalismo” que ao assassinato em si?
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