Notas
taquigráficas indicam rumos da CPI da Covid
Descontados
os intervalos, já se passaram 38 horas e 46 minutos de depoimentos desde que o
senador Omar Aziz (PSD-AM), presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito
(CPI) que apura as ações e omissões do governo federal no enfrentamento da
pandemia, convocou para se sentar à mesa a primeira testemunha: o ex-ministro
da Saúde Luiz Henrique Mandetta.
Desde
então já foram realizadas seis oitivas de personagens que, em diferentes partes
do roteiro, foram protagonistas ou coadjuvantes, vilões ou mocinhos, neste
filme de terror que já teve mais de 435 mil vítimas.
Já subiram ao palco da CPI os ex-ministros da Saúde Mandetta (cuja audiência durou 7 horas e 20 minutos) e Nelson Teich (5 horas e 26 minutos), o atual responsável pela pasta Marcelo Queiroga (8 horas e 2 minutos), além do diretor-presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária Antônio Barra Torres (5 horas e 27 minutos), o ex-secretário de comunicação social do governo Fabio Wajngarten (7 horas e 17 minutos) e o gerente-geral da farmacêutica Pfizer na América Latina Carlos Murillo (5 horas e 14 minutos).
Ao
se analisar a íntegra dos depoimentos de todos os convocados até agora, aqueles
que gostariam de ver o presidente da República sendo encurralado desde as
primeiras perguntas podem ter se decepcionado. Durante os depoimentos dos
ministros da Saúde, o nome de Bolsonaro foi muito pouco mencionado - para ser
mais exato, apenas quatro vezes (uma por Mandetta e Teich e duas por Queiroga).
À
medida que a CPI começar a convocar testemunhas que tiveram envolvimento mais
específico e direto com os diversos aspectos da gestão governamental da
pandemia, o risco de exposição de Bolsonaro e de sua família começa a aumentar
consideravelmente. Prova disso é o fato de que o sobrenome “Bolsonaro” foi
citado 18 vezes por Fabio Wajngarten e mais oito vezes pelo executivo da Pfizer
Carlos Murillo.
Na
nuvem de palavras proferidas nos seis primeiros debates da CPI, podemos
encontrar outra pista sobre o rumo que as investigações podem tomar. O tema da
cloroquina teve 84 menções, a maioria concentrada nas respostas dos ministros
da Saúde e do presidente da Anvisa. No entanto, o termo “vacina” e seus
derivados foram utilizados 586 vezes, apresentando alta incidência em todos os
testemunhos feitos, o que indica que esse é um assunto com um potencial
explosivo muito maior para o governo.
Do
outro lado da mesa, também podemos encontrar informações interessantes sobre o
andamento dos trabalhos da Comissão. Tentando captar o tamanho da participação
de cada membro da Comissão nos depoimentos, realizei um exercício bastante
simples. Compilei a íntegra das notas taquigráficas de cada sessão da CPI
disponível na página do Senado na internet e contabilizei o total de caracteres
utilizados por cada parlamentar durante suas perguntas e comentários dirigidos
aos depoentes.
Conforme
pode ser visto no gráfico, o protagonismo é exercido pelo relator da CPI, Renan
Calheiros (MDB-AL), seguido do presidente Aziz e do vice-presidente Randolfe
Rodrigues (Rede-AP). Até aí não há nada demais, visto que esses três postos têm
prerrogativas regimentais para conduzir os trabalhos da comissão, o que
justifica terem mais tempo e espaço para falar. Mas há alguns pontos
interessantes a serem observados.
De
acordo com a mesma métrica, a defesa de Bolsonaro vem sendo capitaneada por
Marcos Rogério (DEM-RO) e Luis Carlos Heinze (PP-RS), enquanto Ciro Nogueira
(PP-PI) tem uma das atuações mais apagadas da CPI. Com o governo atravessando
um de seus piores momentos desde a posse, o relativo silêncio do poderoso
cacique do Centrão vale mais do que mil palavras.
Do
lado da oposição ao governo, uma das vozes mais críticas contra a gestão de
Bolsonaro na pandemia ainda se mostra discreta na comissão. Tasso Jereissati (PSDB-CE)
recentemente chegou a cogitar publicamente a possibilidade de concorrer à
presidência em 2022. Ao não tomar para si os holofotes na CPI da Covid,
contudo, o tucano dá margens a se pensar de que esse desejo talvez não seja tão
forte assim.
Voltando
à nuvem de palavras, as referências a “Manaus” e “oxigênio” apareceram somente
em 53 ocasiões nas duas primeiras semanas de trabalhos da CPI, indicando que
esse é um flanco que ainda foi pouco explorado, pelo menos por enquanto.
Mas
se o general Pazuello tiver a coragem de encarar os senadores na próxima quarta
(19/05), pode sair daí a palavra-chave para se começar a demonstrar a
responsabilidade do governo neste morticínio.
*Bruno Carazza é mestre em economia, doutor em direito e autor de “Dinheiro, Eleições e Poder: as engrenagens do sistema político brasileiro”.
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