Na
última quarta-feira entrevistei o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Às
vésperas de completar 90 anos, ele não demonstra muita fé na possibilidade de
seu partido, o PSDB, ou mesmo de outras forças de centro se contraporem à
disputa entre Jair Bolsonaro e Lula em 2022. E, sem tergiversar, declara voto
no petista em caso de segundo turno com o presidente (em 2018, diz ter anulado
o voto na disputa entre Bolsonaro e Fernando Haddad).
A entrevista foi publicada no GLOBO desta sexta,
e a declaração de voto em Lula foi o que mais repercutiu. FH só lembrou do PSDB
quando foi questionado, e tratou logo de ir dizendo que, no seu entender, o
candidato alternativo a Lula e Bolsonaro não precisa ser tucano.
A
sinceridade reflete o momento avacalhado pelo qual passa o PSDB. Aliás, não é
um momento: a fase avacalhada vem, pelo menos, desde 2017, quando foi revelado
o diálogo de Aécio Neves, então o principal líder tucano, com Joesley Batista.
Desde então tem sido ladeira abaixo, com os partidos que sempre foram satélites
do PSDB mais ou menos a reboque.
Tucanos, democratas e adjacências colheram alguns bons resultados estaduais em 18 e municipais em 20, mas até aqui não conseguem vocalizar um projeto alternativo para o país que, como diz FC, dialogue com o povo, tenha um "sentido da História", entenda o que está em jogo no Brasil depois da nuvem de gafanhotos do bolsonarismo.
Pelo
contrário: as lideranças do PSDB, do DEM e de outros partidos hoje apenas
médios parecem ter resolvido praticar autofagia.
João
Doria Jr. tenta colocar em pé seu projeto presidencial, com enormes
dificuldades partidárias e eleitorais. O lance mais recente dessa estratégia se
deu nesta sexta-feira, com a filiação do vice-governador de São Paulo, Rodrigo
Garcia, ao PSDB.
Por
quê? Porque Doria não confia que terá o DEM em seu palanque, e precisa honrar o
compromisso de fazer de Garcia o candidato à sua sucessão. O risco é que ele
tampouco tem a garantia de que conseguirá ser candidato a presidente pelo PSDB,
abrindo espaço para Garcia disputar o Palácio dos Bandeirantes.
Aécio
Neves é hoje o verdadeiro dono do PSDB. É combinado com o deputado que age o
presidente da sigla, Bruno Araújo, que Doria um dia achou que seria seu aliado.
Aécio prefere que o PSDB não lance candidato à Presidência. Quer se tornar um
Gilberto Kassab tucano, fazendo do PSDB um partido de deputados, e, portanto,
de lauto fundo partidário. Mais: não quer que o partido gaste com candidato a
presidente o fundo que tem hoje, para que sobre mais para os candidatos ao
Legislativo.
Coisa
de partido provinciano, não de uma sigla que já levou a Presidência duas vezes
em primeiro turno. Coisa de político que se contentou em ser eminência parda
depois de queimar o filme da própria trajetória política.
Doria
não conseguiu convencer as demais seções tucanas da viabilidade de sua
candidatura. Prova disso é o surgimento de nomes como o do governador Eduardo
Leite e o do senador Tasso Jereissati para prévias que hoje são apenas conversa
mole para boi dormir e para enrolar o próprio Doria.
No
plano paulista, a chegada de Garcia pode levar à saída da legenda de Geraldo Alckmin,
que mesmo depois da derrota acachapante em 2018 quer voltar ao jogo político,
disputando de novo o governo paulista. Se não conseguir que haja prévias, ele
pode migrar para outro partido -- na lista de opções estão o PSD de seu
ex-inimigo Gilberto Kassab e o Podemos.
E
o DEM? Depois de uma campanha brilhante em 2020, ACM Neto achou por bem agir
como um coronel e empenhar o futuro do partido no altar do bolsonarismo,
traindo Rodrigo Maia e o empurrando porta afora do partido. Agora, vendo que a
debandada será maior e que não só Bolsonaro derrete nas pesquisas como a volta
de Lula leva vatapá para o acarajé do PT na sua Bahia, se desespera e fica
bravinho com a saída de Rodrigo Garcia. Foi ele quem plantou essa lambança.
É
vexaminoso ver uma geleia geral de siglas que não têm nada de relevante para
dizer a uma população vitimada pelo vírus, pela fome, pela economia em
frangalhos, pelo esgarçamento dos valores e das instituições, pela barbárie na
segurança pública, pelas ameaças autoritárias diárias do presidente, pela falta
de perspectiva.
Lideranças
políticas que passam os dias com brigas patéticas em que se xingam de baixinho
ou de gordo ou de feio, bobo e chato enquanto deixam se consolidar a
polarização entre Bolsonaro e Lula.
De nada adianta lançar mão de clichês sem substância como a procura do "Biden brasileiro" quando o que se tem são nomes que não conseguem sequer reunir uma tropa mínima e dizer a que vieram, quanto mais operar uma estratégia como a do Partido Democrata para unir suas alas e vencer o trumpismo.
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