A
gente se divertiria com o que dissesse a personagem de Paulo Gustavo
Sentada
na cadeira do presidente no Palácio
do Planalto, a personagem Dona Hermínia, criada pelo genial Paulo Gustavo, falaria assim sobre
a covid-19. “É um vírus novo, ninguém
sabe se nasceu em laboratório ou nasceu por algum ser humano ingerir um animal
inadequado. Mas está aí. Os militares sabem o que é guerra química,
bacteriológica e radiológica. Será que não estamos enfrentando uma nova guerra?
Qual o país que mais cresceu o seu PIB? Não vou dizer para vocês.”
Dona
Hermínia gostaria e ao mesmo tempo se cansaria de lidar o tempo todo com seu
principal auxiliar, o ministro Paulo Guedes, em quem daria broncas como fazia
com o ex-marido Carlos
Alberto ou a empregada Valdeia. “PG, pode sair e ganhar
dinheiro por aí, mas não me tira poder.” Mas, por ser tão mãezona, Dona
Hermínia admitiria que às vezes tem de negociar. “Obviamente, com o passar do
tempo, vou dando minhas peruadas no Paulo Guedes e ele vai dando na
política para mim.”
Quando ficasse brava, Dona Hermínia explodiria rápido e não toleraria ser contestada, especialmente por jornalistas, gente que ela teria certeza de que não serve para muita coisa a não ser criticá-la injustamente. “Vontade de encher tua boca de porrada.” É um tipo de desejo que, seguramente, Dona Hermínia expressaria também em relação a senadores que tentassem encher o saco dela com CPIs. “Vou ter de sair na porrada.”
Pessoas
que não sabem ficar dentro do seu cercadinho, como ministros do STF,
levariam Dona Hermínia a lembrar a educação que deu aos filhos – impondo
limites, sabendo dizer “não”, aplicando uma coça de vez em quando. Seus filhos
sempre baixaram a crista quando avisava “que estão esticando muito a corda, e
já está bem esticada”. Dona Hermínia acha que as pessoas entenderiam muito bem
o que poderia acontecer quando ela decidisse “baixar um decreto para garantir o
direito de ir e vir, e não ouse contestar”.
Para
o lado dela Dona Hermínia teria certeza de que a corda não iria arrebentar,
graças ao “seu” Exército. Que lhe obedeceria sem piscar os olhos,
principalmente para proteger o povo de gente malvada como governadores e
prefeitos que não pensam em outra coisa senão prejudicá-la gastando o dinheiro
que Dona Hermínia mandou para eles combaterem a pandemia e agora sabe-se lá que
fim essa grana levou. “Meu Exército não vai às ruas agir contra o povo”, diria
Dona Hermínia.
Mas
Paulo Gustavo se foi, ceifado como outras centenas de milhares de brasileiros
por uma tragédia sem precedentes de saúde pública, agravada em primeiro lugar
por documentada incompetência governamental, mas também – é obrigatório que se
diga – por irresponsabilidade coletiva, num país que carece de líderes. A perda
é grande, pois o humor é a melhor autocrítica da qual possa dispor uma
sociedade, e a brasileira vai se despedindo rápido daquilo que sempre gostamos
de chamar da malandragem simpática do brasileiro, da sua irreverência, do seu
sorriso aberto.
A
Dona Hermínia de Paulo Gustavo que conquistou o coração de milhões de pessoas
é, no fundo, um personagem carinhoso, solidário, engraçado no melhor sentido da
palavra, que criou entre todos nós uma profunda identificação pelas suas
dúvidas, suas incertezas, suas dificuldades em entender o mundo. Mesmo a acidez
e palavras duras mal disfarçavam o coração enorme e mole de mãe. Atrás dos
palavrões, das ameaças e do sarcasmo da personagem está uma figura doce,
divertida, amiga, preocupada com o mundo e as pessoas que a cercam.
Infelizmente, não há mais chances de Dona Hermínia ocupar o Palácio do Planalto.
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