O Estado de S. Paulo
Bandeira nacional não é exclusiva dos atos
golpistas, nem a do PT é a única nos atos de oposição
As ruas não estão mais dominadas só por
atos golpistas, que a pretexto de apoiar o presidente Jair Bolsonaro atacam
o Supremo, o Congresso e a mídia e pedem a volta do regime militar. As ruas,
agora, voltaram a ter manifestações que, além de serem contra o presidente
Jair, defendem a democracia, as vacinas e a vida. E com bons motivos.
Os dois grupos promovem aglomerações, mas
um segue o “mito”, com muitos sem máscara, e o outro segue
a ciência, como todo mundo de máscara, sim, senhor. Mas há duas
grandes novidades: a bandeira verde e amarela do nosso Brasil não é mais
exclusividade dos atos golpistas e as bandeiras vermelhas não são mais as
únicas nas manifestações de oposição a Bolsonaro.
As imagens das multidões de sábado, em São Paulo, Brasília e por aí afora, são salpicadas de vermelho do ex-presidente Lula, dos sindicatos e movimentos sociais ligados ao PT, mas elas mostram também faixas, cartazes e manifestantes em cores neutras ou ostentando o verde e amarelo, que é de todos, não de bolsonaristas nem de petistas.
Não é correto menosprezar os atos
pró-Bolsonaro e antidemocracia, mas também não se pode deixar correr solta a
fake news que apontava 1,3 milhão de pessoas na “motociata” em São Paulo. Pela
polícia, eram uns 12 mil e, pelo pedágio, pouco mais de 2 mil. Seja quantos
forem, o fato é que tinha bastante gente, mas essa gente não é a maioria.
Do outro lado, o desafio é ampliar o leque
de adesões, replicando o principal e mais consequente movimento de massas deste
País, as “diretas, já”. A esquerda, mais organizada, sai na frente, mas não é
dona das manifestações, da oposição, nem da condenação à ação nefasta na
pandemia devastadora.
Se as manifestações forem “do PT”, milhares
que são contra Bolsonaro, mas não votam em Lula, ficarão em casa. Vão da
centro-esquerda até a direita que se recusa a ser confundida com esta direita
absurda no poder, anticiência, antiambiente, anticultura, anti-educação,
antivacina, antimáscara. E merece espaço para protestar.
Essa maioria silenciosa não engole a
provocação do presidente ao atacar uma jornalista e a mídia nacional ontem,
dois dias depois da marca dos 500 mil mortos: “Tudo o que eu falei sobre a
covid, infelizmente para vocês, deu certo”. É uma loucura. Bolsonaro acorda
todo dia ruminando: “como vou irritar o povo brasileiro hoje?” E seu estoque é
inesgotável: “gripezinha”, jet ski nos cem mil mortos, “não sou coveiro”, a
pandemia “no finalzinho” em novembro, condenar a máscara, processar
governadores por isolamento social, negar o número de mortos...
Tudo isso é chocante, patológico, mas nada
é mais irresponsável do que o desleixo, a ignorância e a péssima gestão das
vacinas, que poderiam ter começado a chegar em dezembro, mas só engrenaram,
mesmo assim aos solavancos, depois de o governador João Doria e o Butantan
deixarem o governo federal comendo poeira.
Os vídeos de Bolsonaro combatendo a vacina,
em vez de combater a pandemia, são incontestáveis. Ele atacou a “vacina chinesa
do Doria” e desprezou a Pfizer, mas comprou, rapidinho, e bem mais caro, a
Covaxin. É esquisito, como a implicância. Tanto que o general Luiz Eduardo
Ramos tomou a vacina escondido do chefe: “Eu quero viver, pô. Se a ciência e a
medicina ‘tão’ dizendo que é a vacina, quem sou eu para me contrapor?”. E quem
é Jair Bolsonaro para se contrapor?
Ao dizer que tudo o que falou “deu certo”, o presidente mobiliza a grande massa indignada para mais e mais protestos. Como “deu certo”? Os 500 mil mortos são a prova macabra de que ele falou tudo errado, fez tudo errado e colhe o que plantou. E, como a cloroquina não colou, a nova obsessão é o voto impresso. Assim como ameaça a vida, ameaça a democracia.
Nenhum comentário:
Postar um comentário