O Globo
A dificuldade que o presidente Bolsonaro
está tendo para encontrar sua décima legenda partidária não se deve, como é
óbvio, à questão programática, mas a seu egocentrismo político. Tendo sido
sempre do Centrão, como admitiu recentemente, ele trocou de legenda no mesmo
grupo, mas nunca teve papel relevante dentro dele. Integrante do baixo clero
legislativo, Bolsonaro nunca teve importância política e quer descontar o tempo
perdido.
Em vez de “rachadinhas” de gabinete, ele agora quer o controle dos fundos
eleitoral e partidário e encontra dificuldades para açambarcar o dinheiro que
jorra desses dutos. No entanto todos os partidos já têm donos que, no momento,
não têm razões para abrir mão do controle partidário para um Bolsonaro que
declina na opinião pública.
Os partidos do Centrão querem sugar o máximo que puderem do governo
fragilizado, mas não uma relação estável com Bolsonaro. O PP é exemplar dessa
dificuldade. Recebeu de bandeja o controle político do governo, pela nomeação
do senador Ciro Nogueira para a Casa Civil, mas não quer Bolsonaro como seu candidato
à Presidência. Pode até apoiá-lo numa coligação partidária, mas quer estar
livre para mudar de barco no meio da campanha se isso significar sua
sobrevivência política.
Até mesmo no que seriam redutos políticos seus, Bolsonaro está recebendo
críticas desde que se abriu ao Centrão como tábua de salvação, com receio de um
impeachment. Agora mesmo tem de, mais uma vez, fazer malabarismos para vetar o
fundo eleitoral de quase R$ 6 bilhões sem deixar seus amigos de infância
política na mão. Precisa vetar para manter as aparências, mas ontem garantiu
pelo menos dobrar o fundo, de R$ 2 bilhões para R$ 4 bilhões, uma cifra tão
indecente quanto a que saiu do Congresso.
O próprio Bolsonaro está tendo dificuldade de explicar a seus eleitores a opção fisiológica que assumiu; dificuldade, aliás, que revela como se enganaram esses eleitores que acreditaram realmente que, votando em Bolsonaro, votavam a favor do combate à corrupção. Está metendo os pés pelas mãos, dizendo que, se não pudesse contar com políticos que são réus em processos, quase não sobraria ninguém no Congresso.
Não o fez como crítica, mas como constatação. Que já fora feita por muitos eleitores, que queriam justamente mudar esse quadro e votaram nele na crença ingênua de que se imporia sobre um Congresso corrupto. Mas, como seu rabo é maior do que aparentava na campanha presidencial, a margem de manobra de Bolsonaro nunca foi muito grande.
A ponto de ter advertido ontem seus presumíveis eleitores de que, se continuarem a criticá-lo como têm feito, podem ter de escolher entre Lula e Ciro Gomes num segundo turno. A deputada bolsonarista Alê Silva também está preocupada: “Enquanto os da direita ficam batendo nos da direita, puxando o tapete dos da direita, não querendo dialogar, criando muros entre a gente, do lado de lá, os reais inimigos da nação estão se organizando, estão se unindo e podem vencer”.
A possibilidade de Bolsonaro não estar no segundo turno é um cenário cada vez mais real. A estratégia de Bolsonaro está clara, ele quer ser o único que pode derrotar a esquerda na eleição presidencial do ano que vem. Por isso, diz que não acredita em terceira via, longe dos extremos partidários, e cola Ciro em Lula. O ex-presidente também despreza a terceira via, querendo transformar-se em alternativa moderada para o eleitorado de centro e centro-direita.
Nenhum dos dois, porém, é talhado para esse papel. Bolsonaro transformou-se em alternativa ao PT em 2018 porque os candidatos de centro, como Geraldo Alckmin, João Amoêdo e outros, não tiveram postura afirmativa numa campanha radicalizada. O ex-presidente Lula também não veste mais o modelo “Lulinha Paz e Amor”, que deu certo em 2002. Uma terceira via parece cada vez mais possível, e a campanha eleitoral deverá fazer essa decantação.
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