Folha de S. Paulo
O governo Bolsonaro, tão patriota, até
agora não planejou a festa dos 200 anos de Independência
Decerto é algum trauma de infância: nunca
esqueci a musiquinha. Outro dia me peguei cantando: "Marco extraordinário/
Sesquicentenário da Independência/ Potência de amor e de paz/ Esse Brasil faz
coisas/ Que ninguém imagina que faz". E fiquei imaginando a festa que o
governo Bolsonaro, tão patriota, irá preparar para os 200 anos do
Sete de Setembro.
Que tal outra Taça da Independência? A minicopa de 1972 contou com as seleções da Argentina, França, Iugoslávia e Irã, entre outras. Na decisão, o Brasil venceu Portugal com gol de Jairzinho aos 44 minutos do segundo tempo, tudo perfeito, como se tivesse sido combinado. Com os craques portugueses, visitaram o país os restos mortais de dom Pedro 1º.
As paradas militares reuniram multidões com
bandeirinhas. Nos palanques, homens de casaca e mulheres de chapéu aplaudiram o
"milagre econômico". O Hino do Sesquicentenário trazia a promessa de
dias ainda melhores: "E vamos mais e mais/ Na festa do amor e da
paz". Composto por Miguel Gustavo —o mesmo do hit "Pra Frente
Brasil"—, foi gravado em duas versões, a da dupla Miltinho e Shirley e a
de Ângela Maria. Tocado sem parar no rádio e na televisão, virou sucesso nos
bailes de Carnaval. "É dom Pedro 1º/ É dom Pedro do Grito/ Esse grito de
glória/ Que a cor da história/ À vitória nos traz", divertiam-se as
odaliscas montadas nos ombros dos havaianos. Que farra, eu pensava com meus 10
anos, morrendo de inveja.
Mas parece que o regime atual, para variar,
apronta mais um desgosto. Já não temos feijão e arroz no prato, e podemos ficar
sem circo. Instalada em 2019, a Comissão Interministerial Brasil 200 Anos até
agora não planejou a festa. Nem sequer uma reles motociata. Diplomatas
portugueses têm estranhado o silêncio dos brasileiros.
Não há de ser nada. É capaz de o ministro-sanfoneiro compor uma sofrência. Ele não é Miguel Gustavo, mas não se pode querer tudo na vida.
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