O Globo / Folha de S. Paulo
Ele foi a Roma para brigar na rua
As cenas da passagem da comitiva de
Bolsonaro por Roma foram um aperitivo do que pode acontecer durante a campanha
eleitoral do ano que vem. Ganha uma viagem a um garimpo ilegal da Amazônia quem
souber de uma ideia apresentada pelo capitão durante sua passagem pela cidade e
pela reunião do G20.
Pisou no pé da chanceler alemã Angela
Merkel, teve uma conversa desconexa com o presidente turco, conversou com
garçons e, por não usar máscara nem tomar vacina, ficou sem o aperto de mão do
primeiro-ministro Mario Draghi.
Bolsonaro aproveitou a viagem para seguir um roteiro sentimental e, na segunda-feira, foi a Pádua. Lá aconteceu um choque de manifestantes com a polícia, que bloqueou uma marcha. Quem viu as cenas testemunhou um encontro de militantes organizados, mesmo agressivos, com forças da ordem civilizadas. A polícia usou canhão de água e cassetetes para conter a passeata. Uma só manifestante foi detida. Usou-se a força sem violência indiscriminada. Isso em Pádua.
Em Roma, na véspera, milicianos agrediram
jornalistas com socos na barriga, empurrões intimidadores e a clássica
apropriação indébita de um aparelho celular. Como bem disse um jornalista
agredido: “Tá maluco?”.
Bolsonaro foi à Itália com cinco ministros
e preferiu bispar a reunião da COP26 de Glasgow. Se tivesse recorrido a um
aluno do primeiro ano do curso de formação de diplomatas, teria conseguido uma
agenda mais robusta, ainda que vaga. Para isso, existem os diplomatas. Em 1971,
o presidente Emílio Médici foi a Washington com uma agenda declaradamente
vazia, porém cerimonialmente dignificante.
É verdade que 15 chefes de Estado foram à
Fontana di Trevi para uma cena ridícula, durante a qual jogaram no laguinho
suas moedas da sorte. Logo naquele delírio barroco celebrizado na cena noturna
de Marcello Mastroianni com Anita Ekberg no filme “La dolce vita”.
A agenda romana do capitão poderia ter
dispensado seu momento miliciano. As manifestações contra Bolsonaro são
organizadas, as dos seus apoiadores, com balões verdes e amarelos, também. É o
jogo jogado, mas uma senhora bolsonarista foi jogada no chão pela milícia.
A ação de milicianos em manifestações
públicas tem tudo para vir a ser um ingrediente tóxico na campanha eleitoral do
ano que vem. A existência dos celulares será um inibidor dessas práticas, desde
que as autoridades policiais estejam dispostas a reprimir violências. É sempre
bom lembrar que, ao terrorismo de esquerda, disparado no Recife em 1966,
juntou-se, em 1968, o terrorismo de direita contra teatros, tripulado por
agentes do Estado.
Assim como o ministro Alexandre de Moraes
tornou-se o xerife da legislação eleitoral no controle das milícias
eletrônicas, a imprensa e o Judiciário poderiam buscar uma fórmula para conter
as milícias urbanas. Em junho do ano passado, quando o inesquecível general
Eduardo Pazuello resolveu mexer nas estatísticas da pandemia, a pronta e
inédita formação de um consórcio de veículos passou a computar diariamente os
números que o negacionismo queria manipular. Deu certo, e ninguém pergunta
quais são os dados do pelotão sanitário de Brasília, atualmente comandado pelo
“coronel” Marcelo Queiroga, aquele que pretende passear em Haia para debochar
da CPI.
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