Folha de S. Paulo
Presidente faz do país um lugar tão
repulsivo quanto seu comportamento
Nos encontros do G20, Jair
Bolsonaro se comportou como o grosseirão que é, incapaz de conversas
humanas e um provinciano da pior espécie. Foi desprezado (por Mario Draghi,
Itália), tratado
com tédio desinteressado (por Recep Erdogan, Turquia) ou condescendente
(por Angela
Merkel, Alemanha).
E daí? Para os interesses do país, tamanho
vexame faz diferença? Pouca. Por vezes, a proximidade entre governantes pode
ajudar a desembaraçar um aspecto de uma crise grande ou facilitar um início de
negociação. No mais, interesses econômicos e projetos nacionais de domínio, paz
ou guerra (mesmo por outros meios) determinam o grosso de relações
internacionais, tendo como pano de fundo a inércia de história, geografia,
cultura ou religião.
Aquelas situações constrangedoras, porém, são sintomáticas. Para começar, lideranças que não sejam amigas de selvagerias não querem aparecer em bons termos com Bolsonaro. É um risco político, ainda que pequeno, além de desagradável. Isso que está na cadeira de presidente do Brasil é um projeto de tirano, um líder da destruição ambiental e um inimigo da diversidade humana.
Apesar de não serem propriamente
intelectuais, Angela Merkel, Emmanuel Macron ou até Boris Johnson fazem
parte das elites educacionais de seus países; outros foram bem formados e têm
longas carreiras na lida com assuntos de Estado ou na liderança de movimentos
importantes da sociedade. Bolsonaro não tem outras inteligências, sabedorias ou
formação; não sabe e não quer saber (não querer saber é a definição de
ignorância).
Criou problemas com os principais parceiros
do Brasil: China, França e União
Europeia, os EUA de Joe Biden, o Mercosul. Não tem aliados afora
autocratas, neofascistas ou chefetes
da internacional da extrema direita. O caráter humana e democraticamente
repulsivo do "networking" bolsonarista diminui o Brasil.
Mais do que promover a destruição ambiental
e ser um propagandista da intolerância, da ignorância e da violência física,
Bolsonaro é um inimigo da diplomacia. Não há pragmatismo no que faz, a não ser
do ponto de vista da destruição.
Dado ainda por cima que a ruína econômica
não tem prazo para acabar, o Brasil se torna entre irrelevante e infeccioso, a
não ser que sirva de elemento menor das estratégias dos Estados Unidos, por
exemplo. O Brasil de Bolsonaro pode ser marionete da política americana contra
a China. Caso Biden colocasse um cabresto no terror ambiental do bolsonarismo,
faria um ponto mundial.
Bolsonaro ficou isolado não apenas porque é
repugnante ou incapaz de cumprir um roteiro escrito por diplomatas (tentar umas
conversas redigidas por assessores, por exemplo). Fica em um canto
principalmente porque o Brasil desce a ladeira, agora de modo acelerado pelo
bolsonarismo. Quanto mais durar, mais essa estupidez terá consequências.
Se inconfiável, o Brasil pode deixar de ser
fornecedor preferencial de matérias-primas de países como a China. Caso a
"transição verde" avance, o que resta de indústria brasileira pode se
tornar obsoleta (carros
elétricos já estão no comércio; os biocombustíveis perderam a vez). A
produção de commodities ambientalmente incorretas é um problema evidente para o
futuro próximo (petróleo, para começar, mas também boi etc.: "carnes"
e outras comidas "de laboratório"). Transformar floresta e cerrado em
gases de estufa já é um problema crítico.
Um país longínquo, ignorante, meio pobre e
incivilizado em quase tudo (violento, desigual e de pouca escola e ciência)
será mais marginal. O isolamento vexaminoso de Bolsonaro na festa dos poderosos
é a metáfora da nossa irrelevância selvagem crescente.
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