Correio Braziliense
Na véspera da sessão da Corte
que apreciará a execução das chamadas “emendas do relator”, o encontro foi
considerado constrangedor e inoportuno nos meios jurídicos
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), esteve ontem com o presidente do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fux, para discutir a PEC dos Precatórios. Na véspera da sessão extraordinária do plenário virtual da Corte, que se inicia hoje, e que vai referendar ou não a liminar da ministra Rosa Weber, que suspendeu a execução das chamadas “emendas do relator”, o encontro foi considerado constrangedor e inoportuno nos meios jurídicos.
Lira também marcou para hoje a segunda votação da PEC, que foi aprovada na primeira
por 312 votos a 144, com uma estreita margem de quatro votos em relação ao
mínimo de 308 exigido por uma emenda constitucional.
Rosa Weber determinou a suspensão do
pagamento das “emendas do relator” porque fazem parte de um orçamento secreto,
sem transparência nem fiscalização dos órgãos de controle. Em liminar, a
ministra determinou que a execução seja paralisada até a conclusão do
julgamento pela Corte de uma ação apresentada pelo PSol, pelo PSB e pelo
Cidadania, que deve terminar amanhã. Se houver um pedido de vista, o
julgamento será suspenso. As chamadas “emendas do relator” são relativas aos
Orçamentos de 2020 e 2021 e servem de instrumento de controle do governo sobre
sua base e também para cooptação de integrantes dos partidos de oposição, sem
que ninguém tenha que assumir publicamente o toma lá dá cá.
Outra ação sobre o mesmo tema no Supremo é de iniciativa do ex-presidente da Câmara Rodrigo Maia (sem partido-RJ), que pede a suspensão da tramitação da PEC dos Precatórios, em razão de suposta irregularidade na aprovação em primeiro turno, ao se permitir que deputados pudessem votar a distância. Antes da segunda votação do mérito, a Câmara ainda precisa votar 11 destaques, o que pode levar ao adiamento da segunda votação para amanhã. Tanto Lira como o líder do governo, Ricardo Barros (PP-PR), se empenham para mobilizar a base governista, principalmente os deputados do chamado Centrão. Também tentam neutralizar as pressões dos dirigentes dos partidos de oposição sobre seus deputados infiéis.
Levantamento feito pelo site Jota mostra
que a média de apoio ao governo entre os 112 deputados que aprovaram a PEC na
primeira votação é de 88,6%; entre os 144 deputados contrários, a taxa de
adesão é de 47,3%. Essa infidelidade nas bancadas de oposição criou constrangimentos
para a cúpula do PSB, PDT, PSDB, principalmente. A primeira reação veio do
pré-candidato à Presidência do PDT, Ciro Gomes, que anunciou a suspensão de sua
candidatura e exigiu um reposicionamento da bancada do PDT: 15 dos 24 deputados
votaram a favor da PEC. No PSDB, foram 22 dos 31 deputados; e no PSB, 10
dos 32 integrantes da bancada.
Orçamento paralelo
Havia uma maioria no Congresso comprometida
com o teto de gastos, mas tudo mudou com Lira no comando da Câmara. Aliado de
Bolsonaro e líder do “baixo clero”, o presidente da Casa não está nem aí para o
equilíbrio fiscal, seu foco é a distribuição das emendas secretas ao Orçamento,
cumprindo os acordos que fez na eleição com os colegas de Câmara e o Palácio do
Planalto. Com o controle do Orçamento, Lira mantém ampla maioria na Câmara, mas
o apoio ao governo na Casa vem decaindo por várias razões, a principal é o
enfraquecimento eleitoral de Bolsonaro, principalmente no Nordeste, Norte e
Centro-Oeste. O ministro da Economia, Paulo Guedes, jogou a toalha, apesar de a
equipe econômica considerar o teto de gastos a âncora fiscal do governo.
Na PEC dos Precatórios, o rombo no teto de
gastos, oficialmente estimado em R$ 86 bilhões, pode chegar a R$ 100 bilhões. O
maior interesse do governo é viabilizar recursos para o Auxílio Brasil, o
programa de Bolsonaro para substituir o Bolsa Família, além de outros
benefícios, como o vale-gás e o subsídio de R$ 400 para os caminhoneiros
abastecerem os tanques de seus veículos.
O mercado reagiu negativamente porque os
analistas de contas públicas sabem que é possível obter esses recursos num
Orçamento de mais de R$ 1 trilhão cortando despesas supérfluas, a começar pelos
gastos secretos com cartões de crédito da Presidência (o mau exemplo vem de
cima). Já o interesse de Lira são as “emendas do relator” ao Orçamento,
que correspondem a R$ 20 bilhões em verbas destinadas a prefeituras e
instituições ligadas aos parlamentares de sua base, sem nenhuma transparência e
controle, o que a ministra Rosa Weber considera inconstitucional.
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