O Globo
A demonstração exemplar de que o presidente
Bolsonaro já não é mais o mesmo está contida na discussão virtual de baixo
calão que teve com seu grande líder político Valdemar da Costa Neto, dono de
fato e direito do Partido Liberal (PL). Estou falando do ponto de vista de
poder, e não de ideologia, pois Bolsonaro, como admitiu recentemente, sempre
foi do Centrão, embora figura do baixo clero que nunca teve expressão política
nos nove partidos dos quais já fez parte.
Não é mais o mesmo porque não encontra uma legenda que aceite suas condições, e
nem conseguiu criar a sua própria, num quadro partidário que tem mais de 35
partidos em ação, e outros tantos pedindo registro no Tribunal Superior
Eleitoral (TSE). Com o PSL, seu último partido, por cuja legenda elegeu-se
presidente da República, a briga foi pelo butim partidário. Junto com o PT, o
PSL é o partido mais rico com os fundos partidário e eleitoral, graças ao
tsunami eleitoral liderado por Bolsonaro em 2018.
Mas o partido tinha e tem dono, Luciano Bivar, que não deu a chave do cofre, agora milionário, para o clã guloso. No PL, que também tem um cofre recheado, a briga, aparentemente, foi pelos palanques regionais, mas indiretamente também pela bufunfa. Quem indica o candidato a governador de São Paulo, por exemplo, coloca a mão em mais dinheiro.
A briga foi feia, com direito a troca de xingamentos e palavrões, em negociação nada republicana. Nessa queda de braço, porém, Valdemar da Costa Neto tem mais bala na agulha. Preso no mensalão, continuou a mandar no PL de dentro da cadeia, da mesma maneira que os chefões dos comandos criminosos mandam suas orientações da própria prisão. Livre, leve e solto, com influência fundamental no Centrão, por que abriria mão de seu poder para dar parte dele a Bolsonaro e seus filhos ?
Boi preto conhece boi preto, como dizia outro grande parlamentar do baixo
clero, Clodovil Hernandes, que, aliás, terminou sua carreira política no
Partido da República (PR), que depois integrou-se ao PL. O sentido da frase
eternizada por Clodovil deixou de ter um restrito cunho de gênero para um
significado mais amplo, de que pessoas da mesma laia se reconhecem.
A vida dos Bolsonaro não será fácil também no PP, outro partido que controla o
Centrão, com interesses políticos amplíssimos. Ambos já fizeram parte da base
aliada de Lula, Dilma e Temer, e por isso têm interesses regionais
diversificados, que abrangem também o PT. Inclusive porque, com a
decadência da popularidade de Bolsonaro e o ex-presidente Lula liderando as
pesquisas de opinião, não é possível, nessa concepção inortodóxica de coalizão
do Centrão, fechar portas para uma provável mudança de rumo.
Se não chegar a um acordo com partidos controladores do Centrão, Bolsonaro terá
que aceitar ir para um partido com menos tempo de televisão e menores fundos
partidário e eleitoral, tudo o que ele não quer, mesmo sendo presidente da
República. Perderá, também, poder político dentro do Congresso. Em 2018,
Bolsonaro concorreu pelo então nanico PSL por não ter grandes opções. Hoje,
está de olho grande na fenomenal massa de dinheiro que autorizou para os
partidos, que agora, com o dinheiro sobrando devido à PEC dos Precatórios, vai
ser maior ainda.
Mas Bolsonaro, que já é refém de sua base aliada na concertação política, sem
voz de comando real, submetendo-se às vontades do presidente da Câmara,
deputado Arthur Lira, agora ficará sem legenda partidária de peso, sujeito a
chuvas e trovoadas no decorrer da campanha. Mesmo que se submeta ao comando
real de Valdemar da Costa Neto, à medida que sua popularidade for sofrendo
baixas, a debandada das seções regionais de sua suposta aliança nacional será a
mesma, no sentido inverso, que ele provocou em 2018.
Acabou sendo apoiado por deputados de vários partidos, que oficialmente
apoiavam outros candidatos. O eleitor foi se aproximando de Bolsonaro na
proporção em que ele se tornou a alternativa para derrotar o PT. Em 2022, ele
será alvo também dessa rejeição. Apoiar Lula contra Bolsonaro é uma opção que
pode se apresentar a parte do eleitorado, o mesmo que em 2018 fez o contrário.
Ou não apoiar nenhum dos dois, desde que um candidato alternativo se firme.
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