terça-feira, 16 de novembro de 2021

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

EDITORIAIS

Fernández em xeque

Folha de S. Paulo

Presidente argentino vê oposição fortalecida e fratura em coalizão após eleições

O desempenho dos peronistas aliados ao presidente argentino Alberto Fernández nas eleições legislativas foi melhor do que prenunciavam as primárias, em setembro. Ainda assim, o pleito configurou derrota dos governistas e mostrou a insatisfação dos votantes com a condução do país vizinho.

Pela primeira vez desde 1983, o peronismo perdeu o controle do Senado, o que certamente tornará ainda mais complexa a tarefa de administrar pelos próximos dois anos uma crise já profunda.

Os eleitores foram às urnas no domingo (14) com a finalidade de renovar um terço do Senado e metade da Câmara. A coalizão de centro-direita Juntos por el Cambio, do ex-presidente Mauricio Macri, avançou e se fortaleceu para as eleições presidenciais de 2023.

Deve garantir 31 cadeiras no Senado, ante 35 da aliança governista Frente de Todos —que perdeu 6 postos— e 6 de outros partidos.

Na Câmara, a vantagem da agremiação de Macri foi menor, mas a oposição venceu uma corrida apertada na província de Buenos Aires, tradicionalmente peronista.

O presidente deve se ver obrigado a fazer concessões à oposição na difícil renegociação da dívida de US$ 44 bilhões com o Fundo Monetário Internacional (FMI), que precisa ser aprovada pelo Legislativo.

Ao mesmo tempo, precisa lidar internamente com o grupo da vice-presidente Cristina Kirchner, mais à esquerda, que quer a manutenção de gastos sociais diante do ajuste fiscal defendido pelo ministro da Economia, Martín Guzmán.

Eleito em 2019 em aliança com os kirchneristas depois do decepcionante governo do liberal Macri, Fernández tampouco logrou melhorar a vida dos argentinos.

A gestão da pandemia, com frequentes lockdowns e ajuda emergencial considerada insuficiente por parte da sociedade, arranhou a popularidade do presidente.

A insatisfação popular também se explica pelo estado da economia. A cotação do peso despenca, e a inflação anual passa de 50%, corroendo o poder de compra de salários e de auxílios oficiais, enquanto o governo apela para um congelamento de preços fadado ao fracasso. Mais de 20% dos argentinos não têm trabalho.

Após as primárias em setembro, Fernández se viu obrigado a fazer uma reforma ministerial, e as fraturas internas da coalizão ameaçam agora se agravar.

Nesta segunda-feira (15), os mercados internacionais reagiram com otimismo ao resultado do pleito, diante da perspectiva de que uma oposição fortalecida pressione por uma política monetária e fiscal mais ortodoxa.

Não se descarta, porém, que o cenário leve Fernández a adotar ainda mais medidas populistas, receita que deve agravar a combinação tóxica de recessão e inflação.

Pix, ano 1

Folha de S. Paulo

Sistema de pagamentos de baixo custo avança no país e favorece a competição

Sobram números para demonstrar a boa aceitação do Pix, o ambiente de pagamentos instituído há um ano pelo Banco Central com o objetivo de ampliar a oferta de serviços financeiros à população.

De acordo com os dados do BC, o sistema acumula hoje 112,6 milhões de usuários, dos quais 93,4% pessoas físicas. Entre as empresas a adesão se mostrou mais lenta, dados os trâmites de adaptação ao mecanismo —adotado, ainda assim, por 8 de cada 10 negócios de pequeno porte, segundo o Sebrae.

Suas vantagens são evidentes e de fácil compreensão. O Pix permite transferências e pagamentos instantâneos e de baixo custo (gratuitos para as pessoas físicas), à diferença de instrumentos bancários tradicionais como DOC e TED.

O país tem tradição em avanços nessa seara desde os tempos em que a inflação descontrolada exigia maior rapidez nas transações financeiras. Até outubro contavam-se 348 milhões de chaves cadastradas e 227 milhões de contas no novo ambiente —cada pessoa pode fazer até cinco chaves por conta, e cada empresa, até 20.

O êxito do sistema levou a uma bem-vinda redução do uso de dinheiro em espécie, o que parece ser uma tendência inexorável das economias modernas e tem o potencial de dificultar atividades criminosas e sonegação tributária.

Conforme noticiou O Estado de S. Paulo, R$ 40 bilhões em papel-moeda deixaram de circular no Brasil entre janeiro e outubro, numa queda de 10,5% em relação ao volume do final do ano passado.

Houve problemas, decerto, a começar por um certo açodamento do Banco Central no lançamento do Pix, que levou a instabilidades iniciais. O sistema também criou novas oportunidades para golpes e até roubos e sequestros, obrigando a autoridade monetária a impor limites às transações.

Nem todos, ademais, dispõem de aparelhos e conexões adequadas com a internet, ou da familiaridade necessária com os meios eletrônicos. Os estratos mais pobres e menos educados enfrentam, sem dúvida, as maiores dificuldades.

Está claro, de todo modo, que a inovação tecnológica contribui para o ingresso de mais participantes em um mercado ainda muito concentrado nas mãos de poucos grandes bancos. O avanço do Pix ainda está em curso e deverá associar-se a diversos outros serviços e opções para os usuários.

O Banco Central e a mulher de César

O Estado de S. Paulo

Com o retorno da inflação, autoridade monetária não pode ignorar que independência deriva não apenas de suas ações, mas também das aparências

A escalada da inflação nos últimos meses e a expectativa de que os preços continuem a subir de maneira disseminada ao longo de 2022 reforçam a relevância da aprovação da autonomia do Banco Central (BC) pelo Congresso e convalidada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) neste ano. Com o índice oficial, o IPCA, acima de 10% nos 12 meses encerrados em novembro, o governo Jair Bolsonaro alcançou a marca da gestão Dilma Rousseff em 2015. Isso mostra que a estimativa do BC, de que o pico inflacionário era temporário e já teria sido atingido, era deveras otimista e apoia as previsões do mercado de continuidade no ritmo de alta dos juros, hoje em 7,75% ao ano.

Ao contrário do que afirma o presidente Jair Bolsonaro, a inflação não é resultado da política do “fique em casa” em razão da pandemia nem está associada somente a efeitos internacionais. Diante de um cenário catastrófico, com alta de preços em todos os grupos que compõem o IPCA e uma carestia há tempos não vista no País, o remédio do BC é evidentemente amargo, mas necessário para evitar consequências danosas à economia e à população carente – a mais prejudicada por uma inflação descontrolada. Atingir a meta de 3,5% no próximo ano não pode ser um objetivo abandonado, a exemplo do que o governo fez com o teto de gastos – transformado, nas palavras do ministro da Economia, Paulo Guedes, em um mero “símbolo” que não deveria ser defendido de maneira “dogmática”.

A tomada de decisão pela autoridade monetária, portanto, deve se dar de forma sóbria e técnica, longe de influências políticas, ainda que bem intencionadas ou simplesmente eleitoreiras. É nesse sentido que se faz necessário um alerta: o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, não pode agir como se fosse um membro do governo e precisa preservar o cargo que ocupa pelo bem das instituições e da economia.

Na noite em que a Câmara aprovou a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos Precatórios – que abre um espaço de R$ 91,6 bilhões no Orçamento de 2022 para o pagamento do Auxílio Brasil e legaliza o calote de dívidas reconhecidas pela Justiça –, Campos Neto jantou com parlamentares da base aliada.

Segundo relato da reportagem do Estadão/broadcast, ele teria dito aos deputados que a PEC demarcava uma espécie de “limite” para o risco fiscal e que seria temerário propor iniciativas que resultassem em mais gastos diante do delicado quadro atual. Campos Neto teria ainda reconhecido que o texto não era o ideal e que até havia outros caminhos possíveis, mas ponderou que uma resolução para o tema era fundamental para reduzir incertezas – como se elas não tivessem sido criadas justamente pelas ações do governo.

Não é a primeira vez que o presidente do Banco Central se expõe dessa forma. Ele já participou de churrascos na casa de ministros em Brasília e de jantares em São Paulo com empresários apoiadores do governo, inclusive com a presença de Bolsonaro e de seu filho “zero três”, o deputado Eduardo Bolsonaro. Não há notícia de que seus antecessores – Ilan Goldfajn, Alexandre Tombini, Henrique Meirelles e Armínio Fraga, indicados por administrações de diferentes colorações partidárias nos últimos 20 anos e sem autonomia formal – tenham feito algo parecido.

A reação do Comitê de Política Monetária (Copom) à inflação pode ter vindo tarde, mas chegou. Embora tenha segurado a Selic em um patamar histórica e artificialmente baixo (2%) por tempo demasiado, o BC tem elevado a taxa básica de juros desde março e acelerou esse movimento nos últimos meses. No mercado, já há quem preveja uma taxa de 9,25% em dezembro.

Munido de uma autonomia que já deveria ter sido concedida há muito tempo e com mandato fixo garantido, o BC tem a obrigação de tomar decisões que assegurem a solidez da economia, mesmo que elas possam desagradar a políticos, de forma geral, e a um presidente da República em campanha para a reeleição. Não há razão para duvidar da seriedade do presidente do Banco Central, mas não se pode menosprezar o poder das aparências em se tratando de BC. Assim como no caso da mulher de César, não basta ser honesto; é preciso parecer honesto. 

Não é hora de engordar os TRFS

O Estado de S. Paulo

Em iniciativa insensata, o Congresso inflou, sem razões técnicas, o número de desembargadores dos TRFS, em plena crise fiscal

Depois de aprovar a criação de mais um Tribunal Regional Federal (TRF6), sob a justificativa de que, quando for instalado, ele ajudará a descongestionar a segunda instância da Justiça Federal, o Congresso aprovou no dia 9 de novembro, com o mesmo argumento, o projeto que transforma cargos vagos da primeira instância em cargos de desembargadores nos cinco TRFS já existentes.

De iniciativa do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o projeto havia sido votado pela Câmara, mas retornou à Casa, porque o Senado o alterou, aumentando ainda mais o número de cargos de desembargador originalmente previsto. Deputados e senadores não apresentaram nenhum fundamento técnico para a decisão. Limitaram-se a dizer que o número de recursos enviados aos TRFS vem crescendo. E que juízes de primeira instância têm o “grande sonho” de ascender na carreira.

Para se converter em lei, o projeto agora só depende de sanção presidencial. Com isso, o TRF-1, com sede em Brasília, passará de 27 para 43 desembargadores. Já o TRF-2, sediado no Rio de Janeiro, passará de 27 para 35. O TRF-3, com sede em São Paulo, pulará de 43 para 55. Com 27 magistrados, o TRF-4, sediado em Porto Alegre, passará a contar com 39. E o TRF-5, com sede no Recife, passará de 15 para 24.

A decisão do Congresso é equivocada, a começar pelo fato de que não tem sentido converter cargos vagos de juízes federais em novas cadeiras para desembargadores. Como é na primeira instância da Justiça Federal onde há maior carga de trabalho, o mais lógico teria sido preencher os cargos que estão vagos. Por isso, mais dia menos dia, o STJ enviará ao Congresso outro projeto, desta vez pedindo a criação de mais cargos de primeira instância, tudo isso em período de escassez generalizada de recursos, por causa da pandemia.

Além disso, o inchaço dos TRFS colide com os princípios da Emenda Constitucional (EC) 45/04, que introduziu a reforma do Judiciário com o objetivo de reduzir despesas correntes e inibir o excesso de litigação nas instâncias judiciais intermediárias em matérias com entendimento já pacificado pelos tribunais superiores. Entre outras inovações, a EC 45/04 procurou reduzir o número de recursos judiciais, criando três mecanismos processuais que valorizam a jurisprudência.

O primeiro é o princípio da repercussão geral. Quando determinado caso for considerado importante para toda a sociedade, a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) valerá para os casos idênticos que tramitam nas instâncias inferiores da Justiça. O segundo mecanismo é a súmula impeditiva de recursos, determinando que decisões dos juízes de primeira instância baseadas na jurisprudência do STJ ou do STF não podem ser objeto de recurso de apelação. O terceiro mecanismo é a súmula vinculante, que confere força normativa à jurisprudência do STF, obrigando as demais instâncias do Judiciário a acatá-la.

Além do aumento de gastos decorrente da expansão desses tribunais, em plena crise fiscal, há ainda outro problema a ser considerado. A escolha dos 57 novos desembargadores dos cinco TRFS e dos 18 desembargadores do TRF-6, criado no mês passado, será feita por meio de lista tríplice submetida ao presidente da República. A ampliação a um só tempo de 41% do número de desembargadores federais (de 139 para 196, além dos 18 do TRF6) confere, portanto, peso desproporcional à vontade do chefe do Executivo federal. Ainda que não haja autonomia irrestrita para nomear (a escolha é feita a partir de lista tríplice), não faz sentido que a composição da segunda instância da Justiça Federal recaia de forma tão intensa numa única pessoa.

Além disso, Jair Bolsonaro não tem especial apreço por critérios técnicos ou institucionais. Por exemplo, para justificar uma nomeação para o STF, disse: “Kassio Nunes já tomou muita tubaína comigo. (...) A questão da amizade é importante”. No plano institucional, eventual aparelhamento político da Justiça Federal é outro grave perigo, decorrente da insensata decisão do Congresso de engordar os TRFS.

Avanços insuficientes e tardios na COP de Glasgow

Valor Econômico

Chances de os pactos firmados na COP26 serem executados pelo governo Bolsonaro são nulas

A COP26 terminou como várias das anteriores: com avanços insuficientes, tarde demais. Apesar dos contundentes alertas de que o prazo para manter o aquecimento global em uma faixa ainda segura para a vida humana, de 1,5o C, está quase esgotado, as metas nacionais apresentadas em Glasgow estão bem distantes disso e sancionam um aumento de temperatura desastroso, entre 2,5 e 2,7o C. A declaração final da reunião urge os 196 países signatários do Acordo de Paris para que na próxima COP sejam mais ousados nos cortes de emissões até 2030 e que os compatibilizem com o alvo.

A maratona anual que exige consenso entre os 196 países está fadada a produzir resultados insatisfatórios. Acostumados com as estafantes e longas reuniões, os participantes consideram alguns resultados, diante dos frequentes impasses, como grande progresso. Quando vistos por outro prisma, são quase negligíveis. Após um quarto de século de conferências do clima, a resolução que, pela primeira vez, menciona a necessidade de reduzir o uso de carvão e de combustíveis fósseis - em uma declaração aguada, sob pressão da China e da Índia, primeiro e terceiro maiores poluidores mundiais - foi saudada como um marco. O texto final menciona apenas a redução do uso “desenfreado” do carvão e o fim de subsídios “ineficientes” a combustíveis fósseis.

As projeções alarmantes do IPCC, porém, exigem corte imediato e queda das emissões de pelo menos 45% até 2030. Dependentes do carvão, China e Índia, responsáveis por 30% das emissões globais de CO2, pretendem seguir com políticas domésticas sobre o assunto, com ritmo próprio. Os EUA, segundo maior emissor, nada fizeram para evitar a decisão, já que o presidente Joe Biden enfrenta oposição cerrada de republicanos, e alguns democratas, ambos financiados pelos lobbies dos combustíveis fósseis.

Foi positivo que 100 países concordassem em cortar em 30% o lançamento na atmosfera de metano, gás mais lesivo à camada de ozônio, assim como três dezenas deles se comprometerem a reduzir até 2030 o desmatamento. Mas isto não passa de uma declaração de princípios à espera de ações concretas. O Brasil aderiu a ambos e, enquanto os representantes do país davam sua anuência, foi divulgado que o desflorestamento da Amazônia em outubro bateu recorde de 6 anos, com 877 km2 devastados. O governo brasileiro não tem interesse nem planos para deter a destruição e é possível que vários países signatários também não.

O Brasil deixou de ser obstáculo para a criação de um mercado global de carbono, com a esdrúxula exigência anterior de dupla contagem de créditos. A regularização, ainda por vir, desse mercado é um avanço ante a situação global, embora possivelmente menos eficaz, para os objetivos, que a taxação do carbono, que sequer foi discutida.

O financiamento do combate ao aquecimento global, por outro lado, não prosperou. Os países desenvolvidos reconheceram que os US$ 100 bilhões anuais prometidos em 2009 para serem entregues até 2020 ainda não chegaram e que estariam disponíveis em 2025 apenas, no caso dos recursos destinados à adaptação às mudanças climáticas. Os países ricos continuam se opondo a um fundo para compensar perdas e danos em países que são poluidores irrelevantes, mas já sofrem os efeitos das mudanças do clima.

EUA, China e Índia não apresentaram novas metas de redução de emissões. A volta dos EUA ao âmbito do Acordo de Paris não foi marcada por nenhum protagonismo decisivo. China e EUA divulgaram uma declaração conjunta em que reiteram seu engajamento na luta contra o aquecimento global. Vaga em seus termos genéricos, o documento foi pelo menos saudado pelo fato de os dois países estarem em confronto em quase tudo, mas abrindo exceção para o esforço contra o aquecimento global.

Destoando da ausência de compromissos, os dois países anunciaram, porém, que “pretendem se engajar de forma colaborativa no apoio à eliminação do desmatamento ilegal global por meio da aplicação efetiva de suas respectivas leis de proibição de importações ilegais”. Se Pequim cumprir a promessa, o Brasil terá problemas com seu principal parceiro comercial.

A diplomacia brasileira agiu para a redução de danos da imagem do país, ao deixar de atrapalhar as negociações e ao insinuar uma abordagem construtiva, que os fatos desmentem. As chances de os pactos firmados na COP26 serem executados pelo governo Bolsonaro são nulas.

Proibir entrevista de Daniel Silveira foi um exagero

O Globo

No entender de Alexandre de Moraes, como essa entrevista foi “amplamente divulgada por meio das redes sociais”, ela configura violação das medidas impostas

Foi um exagero a decisão tomada pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), que proíbe o deputado federal Daniel Silveira de dar entrevistas sem autorização judicial. Solto por ordem do próprio Alexandre na semana passada, depois de passar meses preso em razão das ameaças que proferiu contra ministros da Corte, Silveira já fora proibido de usar redes sociais e de manter contato com os investigados nos inquéritos das fake news e dos atos antidemocráticos. Na sexta-feira, concedeu uma entrevista à Jovem Pan que precipitou a nova proibição.

No entender de Alexandre, como essa entrevista foi “amplamente divulgada por meio das redes sociais”, ela configura violação das medidas impostas. O ministro concedeu 24 horas para que a defesa do deputado prestasse esclarecimento a respeito. Num recurso que já havia sido apresentado, a defesa solicitara a Alexandre que explicasse a extensão da proibição de uso das redes, pois ela se estende a terceiros falando em nome de Silveira, sobre os quais ele alega não ter controle.

É perfeitamente compreensível a intenção de Alexandre, já que as redes sociais foram e continuam a ser usadas por expoentes do bolsonarismo — entre os quais o próprio Silveira — como ferramentas de propaganda para conspirar contra as instituições, ameaçar figuras públicas e semear o golpismo. Mas é preciso cuidado para que as restrições não se transformem apenas numa medida de controle sobre um tipo de discurso que, por mais abjeto que seja, também é legítimo numa democracia.

Na entrevista que concedeu, Silveira não foi agressivo como no vídeo absurdo que suscitou sua prisão em flagrante. Questionado por uma bancada que mais parecia de amigos que de jornalistas, defendeu seus pontos de vista sobre os processos contra ele, criticou os deputados que votaram em favor de sua detenção, fez acusações contra a Polícia Federal, o STF, o próprio Alexandre — e tentou posar como “mártir” da liberdade de expressão. Não voltou atrás nas ameaças e declarações, limitando-se a dizer que o vídeo fora feito “em momento passional”.

Tudo isso pode muito bem ser considerado propaganda destinada à parcela do público que continua a acreditar nos delírios do bolsonarismo. Mas não é crime, nem configura ataque à democracia. A entrevista trouxe até informações novas relevantes. Entre os elogios que rasgou a Jair Bolsonaro, Silveira deixou escapar que sua equipe mantém contato com o presidente e disse que Bolsonaro “fez tudo aquilo que estava ao alcance dele” para defendê-lo. Ora, não cabe a um presidente da República agir em favor de nenhum investigado por crime contra a democracia.

Não há dúvida de que Silveira tentou tirar proveito político da entrevista — exatamente como fazia o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva quando falava à imprensa da cadeia em Curitiba. Mas isso não significa que não seja de interesse público o que ele tem a dizer. Ao restringir-lhe o direito de falar, Alexandre apenas contribui para alimentar as teorias da conspiração que tentam transformar o deputado em vítima de arbítrio. Não custa lembrar que é em torno dessas teorias — estapafúrdias e sem cabimento — que se organizam os ataques ao STF dentro e fora das redes sociais.

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