Folha de S. Paulo
O problema maior da corrupção é que ela
perverte a lógica dos investimentos
A corrupção tem dois problemas práticos (a discussão moral fica para outra ocasião). No que podemos chamar de menor deles, ela desvia para bolsos privados o que deveria ter destinações públicas. Digo que é menor porque, exceto em cleptocracias plenas, o volume de recursos surrupiados não costuma representar uma fatia muito grande do Orçamento. O problema maior da corrupção é que ela perverte a lógica dos investimentos. Você faz a obra A no local B não porque é dela que a população mais precisa no momento, mas porque esse é o interesse da empreiteira C que entrou em conluio com o político D. É difícil calcular o custo dessas oportunidades perdidas, mas ele é enorme.
O modo pelo qual decidimos e executamos o
Orçamento, mesmo quando consegue evitar os reveses da corrupção pequena, não
escapa aos perigos característicos do problema maior. Os gastos não são
definidos pelo ganho social que poderiam gerar, mas por critérios que às vezes
não vão além do interesse individual de um deputado em ser reeleito. Sim,
leitor, estou falando principalmente das emendas parlamentares (em suas
diversas modalidades), mas não só. Basta ver que os militares andaram usando
verbas da Covid para comprar uísque e picanha.
Cuidado, não estou afirmando que todas as
destinações de verba oriundas de emendas
parlamentares sejam problemáticas. Pelo contrário, alguns
desses gastos são necessários. Se não fossem decididos por legisladores,
provavelmente teríamos de criar fundos específicos para manter hospitais
funcionando e impedir pontes de ruir. Meu ponto é que, quando loteamos o
Orçamento e atomizamos os investimentos, eles perdem muito da eficácia social
que poderiam ter.
O mundo vem desenvolvendo ferramentas cada
vez mais poderosas para calcular o impacto de cada dólar doado a ONGs. E as que
gastam mal tendem a sair do radar. No Brasil, seguimos confeccionando o
Orçamento com métodos arcaicos.
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