Valor Econômico
Corte do gasto com funcionalismo foi até
agora o coração da política fiscal do atual governo
Começaram as pressões por reajuste de
salários no setor público. “Isso vai ser como tirar o pino da granada”, tem
alertado o ministro da Economia, Paulo Guedes. “Vai explodir tudo!”, resumiu
ele a um de seus assessores mais próximos.
Guedes sabe bem o que está em jogo. A
contenção do gasto com o funcionalismo foi o coração da política fiscal do
governo Jair Bolsonaro. Não houve reajuste geral de salários nesta gestão.
“O ponto alto da nossa política fiscal foi o controle do gasto com o funcionalismo”, concordou uma alta fonte da Economia. Agora a área de recursos humanos da União corre contra o tempo para aprontar uma proposta que caiba dentro do Orçamento, que destinou, neste ano, apenas R$ 1,7 bilhão para correção de salários. Pela legislação eleitoral, o governo tem até o dia 2 de abril, amanhã, para conceder reajustes reais, ou seja, maiores que a inflação.
Uma proposta, porém, é dar um reajuste de
5% para todos, cerca de metade da inflação acumulada em 12 meses. O problema é
que cada 1% de reajuste custa R$ 3,1 bilhões por ano aos cofres públicos. Um
aumento de 5%, que as categorias consideram muito pouco, equivaleria a uma
despesa adicional de R$ 15,5 bilhões. Essa cifra é aparentemente inviável se
confrontada com a política do teto do gasto público, que destinou apenas R$ 1,7
bilhão para uma eventual correção de salários. Alguém vai ter que pagar e
quando se pergunta sobre quem recairia a conta, por exclusão, sobram as emendas
parlamentares.
Uma outra hipótese é dar um aumento para
algumas categorias tais como policiais, funcionários do Banco Central e da
Receita Federal. Guedes deve saber que haverá uma insana corrida pela isonomia
no setor público, razão pela qual ele conclui que “vai explodir tudo”. As três
categorias de funcionários já estão em franca mobilização para entrar em greve.
A Receita Federal esta em operação-padrão em alguns portos, o que atrasa as
exportações. Os auditores fiscais não reivindicam aumento direto de salários,
mas sim a regulamentação do bônus por performance. Já o BC quer receber o mesmo
reajuste que for dado aos policiais.
Há uma explicação plausível para se fazer
um ajuste nas despesas com os servidores públicos. No auge da pandemia, os
trabalhadores do setor privado perderam emprego e viram seus vencimentos serem
reduzidos. Houve, portanto, ajuste nas quantidades e nos preços. Enquanto que
no setor público, dada a estabilidade do funcionalismo, não há como se fazer
cortes nas quantidades. Para darem uma contribuição, o governo lhes impôs uma
redução dos preços com praticamente três anos sem correção salarial.
Outro foco de preocupação da área econômica
vem das eleições deste ano. “Vamos ter que defender o erário”, comentou a
fonte. Afinal, as pressões por aumento do gasto público começam no próprio
governo, onde “não há uma ação solidária”, constatou.
“A carestia vai ser a base da eleição”, diz
uma fonte da área econômica. O povo está sentindo na pele o aumento
generalizado dos preços. A inflação já corroeu parte relevante do Auxílio
Brasil e não há dinheiro para melhorar os R$ 400 que os mais pobres recebem
mensalmente.
A reforma da Previdência representa uma
economia de R$ 800 bilhões em dez anos. A pandemia da covid-19 correspondeu a
um aumento de R$ 800 bilhões em um ano de gasto no orçamento, comparou a fonte.
“Estamos fazendo um brutal controle da despesa”, avaliou, antevendo que “as
pressões políticas por aumento do gasto público neste ano serão terríveis”.
A área econômica do governo terá que
“manter a coerência da política fiscal, pois é ela que vai nos manter no rumo.
Veja você, o câmbio está reagindo”, disse uma das fontes consultadas
referindo-se à queda da cotação do dólar frente ao real que acredita-se, no
Ministério da Economia, deverá ficar girando em torno de R$ 4,50 a R$ 4,70.
O ingresso de recursos externos tem a ver
com a taxa de juros, que tornou atraente o investimento em reais para usufruir
do diferencial entre os juros externos e internos.
Segundo fontes oficiais, parte importante
do ingresso de capitais vem dos exportadores que estavam mantendo os seus
resultados fora do país e, agora, decidiram internalizá-los.
Fusível queimado
Comentário de um conhecedor dos meandros da
administração federal: “O presidente da Petrobras é como um fusível. Quando dá
uma sobrecarga, ele queima e tem que ser trocado”. Mas, ao contrário do que se
imagina, isso não significa que haverá mudança na política de preços dos
combustíveis, que hoje é inspirada na cotação do preço internacional do
petróleo.
Aliás, é exatamente para preservar a
política de preços que tanto barulho político faz quando há uma crise externa -
ou, pior ainda, uma guerra - que gera uma escalada nos preços dos combustíveis
no mercado doméstico, que o presidente da República troca o comando da empresa
estatal.
É muito difícil encontrar, na história
contemporânea, governos que tenham suportado pressões políticas contra o
aumento substancial dos preços dos combustíveis, sem apelar para algum tipo de
congelamento de preços.
O resultado de uma intervenção do governo
na empresa para conter os preços, no entanto, tem sido desastroso. Em geral,
custa aumento do gasto com subsídios e mais inflação.
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