O Globo
Sergio Moro não é exatamente um homem de
palavra. No auge da Lava-Jato, ele repetiu seguidas vezes que jamais entraria
na política. “Não há nenhuma possibilidade”, sentenciou, antes da eleição de
2018. Assim que as urnas se fecharam, o doutor rasgou a promessa. Abandonou a
toga e virou ministro de Jair Bolsonaro.
Após se desentender com o capitão, o
ex-juiz passou a articular sua própria candidatura. Filiou-se a um partido
nanico e saiu em busca de eleitores. A campanha nunca decolou, mas ele insistiu
no discurso de que iria “até o fim”. “Zero chance de desistência”, assegurou,
há apenas três semanas.
Com o anúncio de ontem, Moro saiu
oficialmente da corrida ao Planalto. Deve trocar o sonho presidencial por uma
modesta cadeira de deputado. Aliados atribuem a decisão à necessidade de
garantir foro privilegiado — na terça-feira, ele descreveu a prerrogativa como
uma “blindagem pra bandidos”.
O ex-juiz é o sexto passageiro a saltar do bonde da dita “terceira via”. A lista foi inaugurada pelo apresentador Luciano Huck, pelo banqueiro João Amoêdo e pelo ex-ministro Luiz Henrique Mandetta. No início deste mês, os senadores Rodrigo Pacheco e Alessandro Vieira também abandonaram o páreo.
As deserções escancaram o real dilema da
centro-direita: até aqui, faltam votos para viabilizar uma alternativa a
Bolsonaro no campo conservador. Apesar da boa vontade do establishment, todas
as tentativas de fabricar um candidato em laboratório têm fracassado. Agora as
esperanças se voltam para Eduardo Leite e Simone Tebet, ambos com 1% no
Datafolha.
Moro apareceu com 8% no levantamento da
semana passada, mas não conseguiu empolgar nem a pequena bancada do Podemos.
Ele selou a mudança para o União Brasil, onde terá que conciliar a retórica
moralista com as companhias de Anthony Garotinho e da filha de Eduardo Cunha.
Ontem outro ex-bolsonarista esteve próximo
de sair de cena. João Doria ameaçou retirar a candidatura em protesto contra as
rasteiras no PSDB. Numa manobra à la Jânio Quadros, desistiu da desistência,
mas continuou isolado na sigla. Doria venceu as prévias, mas arrisca ter o
tapete puxado por Leite. A pendenga confirma que o maior inimigo de um
presidenciável tucano é sempre outro presidenciável tucano.
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