Folha de S. Paulo
Doria desistir da candidatura teria sido
apenas realismo
Doria mobilizou mundos e fundos para anunciar
que fica onde estava na véspera. Se não houver nova reviravolta, ele é
candidato a presidente, embora só reúna 2% das intenções de voto. Moro parece
ter, por ora, desistido, e Ciro se mantém irredutível.
O que se passa na cabeça de políticos, que
parecem acreditar que têm chances de vitória mesmo quando todos os sinais
objetivos mostram que não? A lista de medalhões que insistiram em candidaturas
fracassadas apenas para sair humilhados por votações nanicas inclui Geraldo
Alckmin (4,76% em 2018), Leonel Brizola (3,19% em 1994) e Ulysses Guimarães
(4,73% em 1989).
O irrealismo também é comum entre empresários. Especialmente num país com juros cronicamente altos, é mais racional investir o capital em renda fixa e ficar em casa assistindo à Netflix do que montar uma empresa, ter de trabalhar duro e correr riscos. Mesmo assim, muitos empreendem. Keynes identificou essa disposição e a atribuiu a "espíritos animais", o triunfo do otimismo sobre as expectativas matemáticas.
Não são só políticos e empresários que se
nutrem de ilusões. Ainda que em menor grau, a maioria dos humanos se apoia em
devaneios que ampliam a autoconfiança. Um achado assustador da psiquiatria é
que deprimidos fazem avaliações surpreendentemente realistas de si mesmos. Não
se sabe se é a depressão que leva à percepção mais acurada ou se é a visão
realista que dá origem à depressão.
Sou um entusiasta da razão e do realismo.
Diria até que há áreas, como a definição de políticas públicas, em que a
abordagem racional deveria ser obrigatória. Mas devemos nos precaver contra
seus excessos. Se fôssemos todos 100% racionais o tempo todo, ninguém hesitaria
em roubar a carteira do melhor amigo se houvesse garantia de não ser apanhado.
Doria desistir da candidatura teria sido
apenas realismo. O clima de "último a sair apague a luz" no PSDB é
que veio de graça.
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