O Globo / O Estado de S. Paulo
Lula continua fascinado por políticas
neoperonistas e se permite festejar ações desastrosas dos governos petistas
A fala de Lula, na inserção que vem sendo
veiculada no rádio e na televisão como propaganda partidária do PT, é uma
preciosidade. São 30 segundos de discurso populista em estado puro.
“Meus amigos e minhas amigas. Alguém aí na
sua casa ganha em dólar? Seu salário sobe quando o dólar sobe? Então por que a
Petrobras está reajustando o preço do combustível em dólar? O Brasil é
autossuficiente em petróleo. E o custo do nosso petróleo é em real. Nos
governos do PT, a gasolina, o gás e o diesel eram em real. Lutar para
abrasileirar os preços dos combustíveis é um compromisso do PT. Se a gente
quiser, a gente pode”.
A fala denota desconhecimento da lógica de formação de preços em uma economia aberta. O preço interno de um barril de petróleo deve sinalizar seu custo de oportunidade: o que custa para a economia tornar um barril a mais disponível. Como petróleo e seus derivados são bens transacionados internacionalmente, o custo de tornar um barril a mais disponível é dado por seu preço externo. Se o barril tiver que ser importado, por razões óbvias. Se for produzido internamente, porque poderia ou ser exportado ou permitir importar um barril a menos, caso não fosse consumido.
A ideia de que preços internos devem estar
vinculados aos externos é aceita já há algum tempo no país, sem maiores problemas,
para ampla gama de commodities transacionadas
internacionalmente, como trigo, soja, milho, celulose e alumínio. Mas, no caso
do petróleo, essa mesma lógica ainda enfrenta resistência. Já houve quem
argumentasse que o petróleo era importante demais para ser tratado como
“simples commodity”. Ao
contrário. Exatamente por se tratar de produto tão importante é que é
fundamental assegurar que seu preço não seja distorcido.
Com a exploração do pré-sal, o Brasil vem
se tornando um exportador proeminente de petróleo. Ao propor “abrasileirar”
preços de petróleo e seus derivados, Lula teria muito a aprender com os
descaminhos do nosso grande vizinho platino. Ao longo de mais de 75 anos, a
“argentinização” de preços das principais commodities exportadas pela Argentina foi uma
obsessão de sucessivos governos peronistas: desatrelar preços internos de carne
e trigo de seus preços externos, para “proteger” o eleitorado do encarecimento
desses produtos nos mercados internacionais.
Sendo tão bem sabido como tais medidas
entravaram o desenvolvimento da Argentina por décadas, é inacreditável que Lula
continue aferrado a bandeiras populistas tão arcaicas e comprovadamente
desastrosas.
De fato, “nos governos do PT, a gasolina, o
gás e o diesel eram em real”. Por cerca de três anos, entre 2005 e 2008, Lula
manteve preços internos de gasolina e diesel inalterados, não obstante ter a
cotação internacional do barril de petróleo passado da faixa de US$ 65 à de US$
120. E, quando, afinal, os preços foram alterados, o reajuste foi anunciado com
um típico arreglo neoperonista.
Foram reajustados os preços recebidos pela
Petrobras e, para “poupar os consumidores”, o governo abriu mão de parcela
substancial da receita que vinha obtendo com a cobrança da Cide (Contribuição
de Intervenção no Domínio Econômico) sobre combustíveis. E os consumidores,
alegremente subsidiados, continuaram a tomar decisões sobre consumo de
derivados exatamente como tomavam quando o barril custava US$ 65.
No governo Dilma, o represamento populista
de preços de derivados de petróleo, com colossal “queima de caixa” da ordem de
US$ 40 bilhões na Petrobras, viria a assumir proporções alarmantes. É espantoso
que políticas tão ruinosas estejam, agora, sendo festejadas e exaltadas pelos
bumbos lulistas.
O pior é a convergência populista. Nessa
questão, como em outras, Bolsonaro e Lula parecem estar em perfeito acordo.
Afora diferenças de palavreado, a retórica revoltada de ambos contra o
alinhamento de preços de combustíveis a cotações internacionais tem sido
rigorosamente a mesma. E tudo indica que, para tentar sustar tal alinhamento,
Bolsonaro continuará brandindo ameaças de cortar cabeças na Petrobras.
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