Valor Econômico
Alckmin defende campanha com foco em
economia e saúde
Geraldo Alckmin se prepara para iniciar a
terceira fase de um plano que, na visão de quem acompanha de perto seus
movimentos recentes, foi meticulosamente preparado.
Nesta etapa preliminar da campanha,
primeiro o ex-governador de São Paulo olhou para dentro do seu novo grupo
político. Egresso do PSDB, dedicou-se a romper resistências no PT. E a
fortalecer vínculos com o PSB, sigla que o acolheu para ser candidato a vice do
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Agora, começará a falar para fora. A
expectativa é que amplie o diálogo com segmentos que ainda resistem a uma chapa
de centro-esquerda, como o eleitorado cristão, o agronegócio, o empresariado e
o mercado financeiro. O interior de São Paulo é outra preocupação.
Alckmin deve participar de eventos ao lado
de Lula e ter uma agenda própria. Acredita-se que quem está no poder e disputa
a reeleição sempre sai na frente. Portanto, é preciso logo transformar a campanha
num plebiscito sobre o governo Jair Bolsonaro (PL).
Para integrantes do PSB, Alckmin saiu do PSDB num movimento que simboliza a maturidade política necessária para vencer Bolsonaro e restabelecer a normalidade institucional do país. Algo que ainda é incompreendido por muitos, mas fundamental diante do fato de que a estratégia da extrema direita para ganhar eleições em outros lugares do mundo foi eliminar quem ocupava o centro do tabuleiro.
Um momento importante deste ressurgimento
foi quando, ao filiar-se ao PSB, Alckmin citou Mario Covas para mostrar sua
visão de como devem ser as relações políticas. “Apoiar não significa deixar de
emitir discordância. Igualmente, é preciso não confundir discordância com
ultimato nem lealdade com subserviência. Lealdade é o valor praticado entre
companheiros. Mas, há uma forma de lealdade que se sobrepõe a todas, a lealdade
aos destinos do país”, discursou na ocasião. Palavras que podem ter sido
importantes para quem está traumatizado com um processo de impeachment.
Mais recentemente, buscou fazer uma imersão
no PSB. Foi este o seu principal objetivo na semana passada, quando não arredou
o pé do congresso realizado pela sigla na capital federal.
Na quinta-feira, antes de passarem a
palavra para Lula, deram-lhe o microfone. De cara, lembrou que a história do
PSB somava quase 80 anos e, ainda assim, o partido estava determinado a
promover uma autorreforma. “Precisamos ser reformistas permanentemente”,
afirmou, em um trecho do discurso que muito bem poderia ser visto como um
antídoto às críticas de que a chapa, caso vença as eleições, tentará alterar
reformas estruturais realizadas recentemente.
Certo de que a defesa do meio ambiente será
um tema relevante na campanha, aproveitou para mostrar que fizera o dever de
casa: lembrou que Gilberto Freyre foi filiado ao PSB e, em seu livro
“Nordeste”, já fazia em 1937 a conexão entre ecologia, sociedade e economia.
Homenageou ícones do partido que morreram,
como Eduardo Campos e Miguel Arraes - “Há homens que a gente não enterra, a
gente semeia. Semeia suas ideias”, disse a respeito de Campos, cujo grupo
político mantém bastante influência na sigla. E fez acenos a atuais lideranças
do PSB, citando exemplos bem-sucedidos na área da educação das administrações
de Maranhão, Pernambuco, Espírito Santo, Paraíba e Recife.
No dia seguinte, uma série de encontros o
aguardavam. Ele participou de reuniões em que ouvia representantes dos mais
diversos segmentos do partido e tomava notas. Muitas notas. A atenção dedicada
a conhecer preocupações e bandeiras de cada um impressionava os novos
correligionários.
Em um outro discurso, ofereceu-se para
fazer um estudo para mostrar como caiu a qualidade de vida do brasileiro nos
últimos anos. “Um comparativo Lula-Bozo”, pontuou. A reação da plateia foi imediata.
Saiu do recinto aplaudido, e logo foi cercado por militantes do PSB.
Uns queriam um retrato para recordação.
Outros tantos queriam que o ex-governador de São Paulo os ajudasse pedindo
votos, pois também disputarão as eleições de outubro. Mas todos estavam
surpresos com o desempenho daquele que, por muito tempo, haviam menosprezado.
Ou até hostilizado, chamando-no pelo apelido “picolé de chuchu”.
Mas agora, pré-candidato a vice, Alckmin
quer jogar.
Para ele, campanha é oferecer esperança à
sociedade. E isso depende de um esforço de convencimento focado em virar votos.
Cabe aos políticos oferecer as informações necessárias para o eleitor tomar uma
decisão, assim como assegurar que as “fake news” tenham vida curta nas redes
sociais.
Quando tem tempo para explicar, Alckmin
elabora. Esse diálogo deve ser lastreado em dois “preditores”: economia e
saúde. E quanto à expressão “preditor”, faz-se necessário traduzir. É um jargão
utilizado por especialistas em pesquisas de opinião quando se fala no fator
determinante a influenciar o eleitor na hora do voto.
Em relação à economia, a meta é mostrar
como pioraram o emprego, a renda e a inflação, por exemplo. Para a área da
saúde, além de relembrar o negacionismo de Bolsonaro durante a pandemia, é
possível apontar à população que até agora diversos serviços do Sistema Único
de Saúde (SUS) estão represados e ainda não voltaram ao normal. O mote do
discurso deve ser a felicidade das pessoas.
Na sexta-feira, quando falava a militantes,
Alckmin lembrou de uma conversa que teve com o pai. “Papai dizia que na vida
não basta viver. Na vida, é preciso conviver e participar”, sublinhou
pausadamente.
Ele pode até ter avançado demais nas etapas
anteriores, parecido pouco natural ao acenar excessivamente para a esquerda.
Mas foi este o Alckmin que se apresentou para cúpulas e militâncias de PSB e
PT, talvez para poder se sentir mais à vontade a partir de agora.
Caso eleito, não se deve esperar que fique
alheio aos assuntos de governo. Afinal, na vida é preciso conviver e
participar. Ou como brinca um novo colega de partido, o chuchu do PSB veio com
tempero.
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