O Globo
É assentada no extermínio dos jovens negros
moradores de favela — ligados ou não ao varejo de drogas ilícitas — a política
de segurança do governo fluminense. Não bastassem as estatísticas sobre a
predominância de pessoas pretas e pardas entre os moradores das comunidades
populares, sequências de fotos das vítimas de homicídios sepultam dúvidas.
Cláudio Castro foi içado ao Palácio Guanabara em substituição a Wilson Witzel,
o governador que mandava “atirar na cabecinha”, sinal verde à execução sumária.
No poder, dobrou a aposta. Manteve a decisão do companheiro de chapa de
suprimir a Secretaria de Segurança, substituída por duas pastas, de Polícia
Civil e Polícia Militar. Acumula recordes nefastos por matanças sucessivas
protagonizadas pelas Forças que comanda.
Desde outubro de 2020, quando assumiu interinamente o governo, após a Alerj aprovar a abertura do processo de impeachment de Witzel, o Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos (Geni-UFF) contou 74 operações policiais com três ou mais homicídios; ao todo, foram 327 mortes. A partir de maio de 2021, com Castro efetivado no cargo, houve 83 mortes em 16 chacinas, incluídas aí as duas mais letais da História do estado: Jacarezinho 2021, com 28 mortos, dentre os quais um policial; Vila Cruzeiro, na última terça, 23 óbitos (a polícia reduziu em três o total de vítimas informado anteriormente). Uma mesma gestão acumular o primeiro e segundo lugares em letalidade de intervenção policial numa série histórica iniciada em 1989 não é acaso, coincidência, fatalidade, efeito colateral. É projeto.
A gestão Castro, até aqui, não conseguiu
apresentar um plano consistente de redução da letalidade policial, como determinou
o Supremo Tribunal Federal (STF) em fevereiro passado. Implantou no Jacarezinho
e na Muzema um arremedo de UPP batizado de Cidade Integrada, com pouco diálogo
com as comunidades. Não cumpriu a promessa de instalar microcâmeras nas fardas
dos agentes de segurança. Em São Paulo, o uso dos dispositivos, a partir de
maio de 2020, reduziu quase à metade as mortes decorrentes de operações
policiais. Em Santa Catarina, que usa câmeras corporais desde julho de 2019, os
óbitos em confrontos com as polícias Civil e Militar caíram 19% no ano passado.
O governador costuma festejar a redução de
crimes contra a vida e o patrimônio, que antes dele já vinham em queda. De
junho a setembro de 2020, primeiros quatro meses de vigência da decisão do STF
de suspender operações policiais em favelas do Rio durante a pandemia, as
mortes por agentes da lei despencaram 71%, segundo dados do Instituto de
Segurança Pública (ISP-RJ). Tudo isso sem interromper o decréscimo dos
indicadores de letalidade violenta e roubos.
Tal como o presidente Jair Bolsonaro,
aliado político e companheiro de legenda, ataca as urnas eletrônicas, o sistema
eleitoral e ministros do STF para esconder a coleção de fracassos do governo
federal, o governador fluminense parece fazer do extermínio nas favelas o
troféu para sufocar a falta de resultado noutras áreas. A despeito da
neutralização às dezenas de supostos criminosos, os grupos civis do tráfico de
drogas e da milícia seguem operantes. Voltam a cruzar divisas do estado,
dominar territórios, oprimir moradores, tão logo as marcas de mortes sejam
removidas do solo, e os corpos tombados sepultados. Sem aulas ficam as crianças
e os adolescentes; sem atividade, os estabelecimentos de comércio e serviços;
sem postos de saúde, comunidades inteiras.
Nos primeiros meses deste ano, a inflação
no Rio foi maior que a nacional. No mês passado, o IPCA Brasil ficou em 1,06%,
maior resultado para abril em 26 anos; no Rio, subiu 1,39%, maior variação
entre as 16 áreas pesquisadas pelo IBGE. Em quatro meses, os preços subiram em
média 4,29% no país; no Rio, 5,08%. Pelo IPCA-15, espécie de prévia do índice
oficial, o custo de vida subiu até maio 4,93% no país, 5,55% no Rio. Estão mais
caros metrô e remédios, energia elétrica e gás encanado, alimentos e
combustíveis.
O governador ainda não foi capaz de renovar
o Regime de Recuperação Fiscal firmado em 2017. Tem esbarrado em pendências
jurídicas no Ministério da Economia. O Rio de Castro tem a terceira maior taxa
de desemprego do país. Segundo o IBGE, só perde para Bahia (17,6%) e Pernambuco
(17%), empata com Sergipe. No primeiro trimestre, a desocupação foi de 14,9%,
acima dos 14,2% nos últimos meses de 2021; na média nacional, estabilizou em
11,1%. A Casa Fluminense estimou em 3,8 milhões o número de moradores em
situação de pobreza e miséria, 22% dos habitantes. Do total, 500 mil não têm
acesso a benefícios sociais, como o Auxílio Brasil.
Na pandemia, os números do Rio também
conseguem ser piores que os nacionais. No país, segundo o Ministério da Saúde,
são 666.037 óbitos, letalidade de 2,16%, mortalidade de 317 pessoas por 100 mil
habitantes. No território fluminense, morreram da doença 73.791 pessoas,
equivalentes a 3,39% dos casos confirmados. O indicador por 100 mil habitantes
é de 427, segundo o Painel Covid-19 da Secretaria estadual de Saúde. Há muito a
esconder sob o banho de sangue.
Um comentário:
Parece que tudo é pior no Rio,a dobradinha federal e estadual só podia dar no que deu.
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