O Globo
Comissão é defendida por quem deveria
temê-la e temida por quem deveria defendê-la
Apesar dos apelos do governo, o Congresso
deve instalar uma CPI sobre os atos golpistas de 8 de janeiro. Se sair do
papel, a comissão nascerá sob o signo da estranheza. Sua criação é defendida
por quem deveria temê-la e temida por quem deveria defendê-la.
A CPI foi proposta pelo deputado André
Fernandes, integrante da tropa de Jair Bolsonaro. Ele é alvo de inquérito no
Supremo Tribunal Federal, sob suspeita de incentivar a invasão e a depredação
das sedes dos Três Poderes.
O dublê de político e youtuber ajudou a
convocar os extremistas a Brasília, a pretexto de divulgar o “primeiro ato
contra o governo Lula”. Depois do quebra-quebra, voltou às redes sociais para
fazer piada com a destruição de patrimônio público.
Na noite do dia 8, Fernandes compartilhou a foto da porta de um armário do ministro Alexandre de Moraes. A peça havia sido arrancada pela turma que quebrou cadeiras, urinou em gabinetes e tentou atear fogo no plenário do Supremo. “Quem rir, vai preso”, debochou o deputado do PL.
A extrema direita tem seus motivos para
defender a CPI. A comissão pode desviar o foco da investigação de verdade,
conduzida pela Polícia Federal. De quebra, ameaça dar palanque a uma teoria
conspiratória: a de que o governo teria facilitado os ataques para se fazer de
vítima.
A tese é delirante, mas convém não
subestimar a máquina de desinformação bolsonarista. Para uma fatia expressiva
do eleitorado, os vândalos de verde e amarelo eram petistas infiltrados — ainda
que nenhum deles tenha sido desmascarado até hoje.
As fake news não são o único fantasma que
assombra o governo. O Planalto também teme que a CPI tumultue o ambiente
político, atrapalhando a votação da pauta econômica.
O risco é real, mas a distribuição de
cargos e emendas não parece a tática mais inteligente para combatê-lo. Até
aqui, a operação no varejo não produziu efeitos práticos — só ajudou os
bolsonaristas a insinuarem que Lula teria algo a esconder.
Como a oposição já reuniu as assinaturas
necessárias, o governo deveria se organizar para não ser coadjuvante na CPI.
Para isso, será necessário perder o medo e trocar a defesa pelo ataque.
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