Valor Econômico
Presidente falou com líderes e dirigentes
partidários e telefonou para o presidente da Câmara, com quem teve uma conversa
'dura'
Apesar do tom de otimismo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva com
o placar de aprovação da medida
provisória de reestruturação do governo na Câmara dos
Deputados, a realidade é que ele teve de finalmente entrar em campo na
articulação política para evitar a derrota. Chamado
pelos aliados de “Pelé da articulação”, ele vinha postergando a participação no
jogo político.
Lula passou a quarta-feira em reuniões e
ligações para líderes e dirigentes partidários. Telefonou para o presidente da
Câmara, Arthur
Lira (PP-AL), com quem teve uma conversa “dura”, segundo relato
de um deputado da base governista a par do assunto. Depois de falar com Lira,
Lula reuniu-se pessoalmente com o líder do União Brasil, deputado Elmar Nascimento (BA), homem de
confiança do alagoano.
Num contexto em que muitos líderes de bancadas estavam refratários a conversar com o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, Lula falou por telefone com o líder do bloco MDB-PSD-Republicanos-Podemos-PSC e relator da medida provisória, Isnaldo Bulhões (AL), com o líder do Republicanos, Hugo Motta (PB), com o presidente do PSD, Gilberto Kassab, entre outros.
No conjunto das conversas, Lula ouviu
relatos de descontentamento com o relacionamento com o Palácio do Planalto e
reivindicações de mais espaço na Esplanada. Emissários de Arthur Lira deixaram
claro que o grupo político do alagoano pleiteia indicar nomes para os três
ministérios ocupados pelo União Brasil (Turismo, Desenvolvimento e Integração
Regional e Comunicações), além de Embratur e Correios. A principal cobiça recai
sobre o Ministério da Saúde, porque alegam que a ministra Nísia Trindade é uma
“técnica”, que não teria votos no plenário.
Há várias semanas, Arthur Lira fazia gestos
e dava recados nas declarações públicas alardeando a insatisfação dos deputados
com a articulação política do governo. Já havia imposto derrotas relevantes ao
Planalto, como a suspensão de trechos dos decretos presidenciais que alteraram
dispositivos do novo marco regulatório do saneamento.
Além das reclamações pela lentidão na
liberação das emendas e na nomeação de apadrinhados para cargos federais, os
parlamentares também estão incomodados com o tratamento pessoal. Uma boa parte
quer ser recebida ou falar por telefone com Lula, e muitos lamentam que não
conseguem reunir-se com Padilha.
Segundo um ministro influente, Lula não
deverá ceder todos os espaços pleiteados pelo grupo de Lira, mas será obrigado
a entregar nacos de poder para reduzir o nível de turbulência na Câmara.
Uma das pastas já oferecida ao grupo é a
do Turismo, da
ministra Daniela
Carneiro, que se desfiliou do União Brasil e deve ingressar no
Republicanos.
Ainda segundo este ministro, Lula retardou
sua entrada em campo como articulador pelo menos por dois motivos. Em primeiro
lugar, porque seu foco está nas relações internacionais. Em uma única semana,
depois da conturbada visita oficial do presidente da Venezuela, Nicolás Maduro,
e da cúpula com presidentes dos países da América do Sul, Lula ainda falou por
telefone com o Papa Francisco, e recebeu o presidente da Finlândia.
O Palácio do
Itamaraty já articula uma visita de Lula à França para participar de um
congresso de economia e sustentabilidade a convite do presidente Emmanuel
Macron. Na
oportunidade, Lula emendaria compromissos oficiais na Itália e no Vaticano, com
o Papa. A se
confirmar, a viagem ocorreria entre 18 e 24 de junho, contrariando as apostas
de que, em junho, o mandatário passaria um mês completo no Brasil pela primeira
vez desde a posse.
Ao mesmo tempo, segundo este ministro, Lula
deu tempo para que os articuladores políticos do governo solucionassem a crise,
o que não ocorreu. Em ação, Lula foi bem sucedido na aposta de contornar a
crise no campo da política, sem precisar recorrer ao Supremo Tribunal Federal
(STF), como alguns auxiliares sugeriram.
Mas o presidente está resistente a operar com mais frequência. Completados cinco meses de governo, ele não se reuniu sequer com as bancadas do PT, quanto mais com as dos demais partidos da coalizão governista. Na visão de um petista influente, se Lula continuar distante do Congresso, o desfecho da próxima crise com o Legislativo poderá ser amargo.
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