Valor Econômico
Números do primeiro trimestre devem levar a
onda de revisões das estimativas para o crescimento de 2023
O resultado do PIB do primeiro trimestre mostrou um crescimento forte, bem acima das projeções dos analistas, com um alta muito expressiva e muito concentrada na agropecuária. Nos três primeiros meses do ano, a economia brasileira cresceu 1,9% em relação ao trimestre anterior, feito o ajuste sazonal, o que significa um ritmo anualizado de quase 8%. A agropecuária avançou 21,6%, depois de quatro trimestres de queda seguida nessa base de comparação. O consenso dos analistas ouvidos pelo Valor Data apontava para uma expansão de 1,3% para o PIB e de 10,3% para a agropecuária. Pelo lado da oferta, os serviços aumentaram 0,6%, enquanto a indústria ficou quase estável, em queda de 0,1%.
Pelo lado da demanda, o resultado mostrou
um tombo forte do investimento, com recuo de 3,4% em relação ao trimestre
anterior. O consumo das famílias cresceu apenas 0,2%, abaixo do 0,4% dos três
meses anteriores. A demanda doméstica, como se vê, teve um desempenho fraco,
como nota o economista-chefe da Neo Investimentos, Luciano Sobral. O que puxou
o PIB pelo lado da demanda foi o setor externo, uma vez que as exportações
tiveram melhor desempenho que as importações, e a variação de estoques, num
movimento relacionado à agropecuária.
Os números do primeiro trimestre devem
levar a onda de revisões das estimativas para o crescimento de 2023. Sobral,
por exemplo, que trabalhava com uma expansão do PIB de 1,4% neste ano, deve
elevar a sua projeção para 1,7% ou mais, embora diga que a agropecuária tenda a
devolver no segundo trimestre parte do desempenho extraordinário registrado no
primeiro. A Capital Economics aumentou a sua previsão de 1% para 2,3%, enquanto
o Goldman Sachs revisou de 1,75% para 2,6%.
A herança estatística que o primeiro
trimestre deixa para o ano é de 2,4%, nota Sobral. Isso significa que, se o PIB
terminar o ano no mesmo nível de janeiro a março, sem crescer mais nada, a
economia brasileira avançará 2,4% em 2023. Para que o número do consenso de
mercado do Boletim Focus do Banco Central (BC) de 1,26% seja atingido, será
preciso uma recessão forte no resto do ano, diz Sobral – o PIB teria que cair
0,75% em cada um dos três trimestres restantes na comparação com os três meses
anteriores, calcula ele.
No lado da oferta, a indústria teve queda
de 0,1%, A indústria de transformação recuou 0,6%, o terceiro recuo seguido em
relação ao trimestre anterior, enquanto a construção caiu 0,8%. O que impediu
uma queda mais forte do setor foi a alta de 2,3% da indústria extrativa e de
1,7% do segmento de eletricidade e gás, água, esgoto e gestão de resíduos.
Já os serviços, que subiram 0,6%, tiveram o
desempenho puxado pelo setores de transporte, armazenagem e correio e o de
atividades financeiras – os dois com alta de 1,2% na comparação com os três
meses anteriores. O comércio cresceu 0,3%.
Pelo lado da demanda, o resultado do PIB
trouxe notícias menos favoráveis. A mais negativa foi a queda de 3,4% do
investimento, a segunda queda trimestral seguida. O consumo das famílias também
teve um desempenho pouco exuberante – avançou 0,2%, em desaceleração pelo
terceiro trimestre seguido, apesar da força do mercado de trabalho e do volume
expressivo de transferências de renda do governo via Bolsa Família. O consumo
do governo, por sua vez, cresceu 0,3%. Nas contas do diretor de pesquisa para a
América Latina do Goldman Sachs, Alberto Ramos, a chamada demanda doméstica
final recuou 0,5% no primeiro trimestre – o indicador reúne o investimento, o
consumo das famílias e o consumo do governo, excluindo a variação de estoques.
A variação de estoques, aliás, teve
contribuição expressiva para o PIB pelo lado da demanda. Nos cálculos de Ramos,
o indicador colaborou com 1,2 ponto percentual do crescimento de 1,9%. O
movimento está relacionado à formação de estoques na agropecuária, segundo o
IBGE. O setor externo teve contribuição positiva também significativa,
igualmente de 1,2 ponto, de acordo com Ramos. No primeiro trimestre, as
exportações recuaram 0,4%, mas as importações tiveram desempenho bem pior,
encolhendo 7,1%. A demanda doméstica final tirou 0,5 ponto do crescimento, nas
estimativas do economista do Goldman Sachs.
Nesse cenário, a perspectiva é de uma série
de aumentos nas projeções para o crescimento deste ano, para 2% ou mais. Mesmo
com a desaceleração esperada para os trimestres seguintes, a herança
estatística do primeiro trimestre sozinha já deve garantir um resultado mais
forte para o PIB em 2023. A atividade econômica tem surpreendido neste ano,
impulsionada pelo desempenho excepcional da agropecuária. Também ajudam a força
do mercado de trabalho e as transferências de renda do governo, ainda que o
consumo das famílias tenha avançado pouco. Na ponta contrária, os juros
elevados seguram a atividade, na tentativa do Banco Central (BC) de derrubar a
inflação. A nota de preocupação é o investimento, que precisa aumentar para o
país poder avançar a taxas mais elevadas de modo sustentado. A taxa de
investimento ficou em 17,7% do PIB no primeiro trimestre, abaixo dos 18,4% do
PIB do primeiro trimestre de 2022.
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