O Globo
Em julho, depois de peregrinar por
depósitos, uma imagem de 1,50 m do Crucificado chegou ao Planalto nos braços de
um funcionário, que a colocou sobre uma mesa. Lula aproximou-se
e, dirigindo-se à peça, disse:
— Eu já voltei, agora você vai voltar. E,
juntos, nós vamos mudar este país.
Teria sido uma prece em voz alta.
Dias antes, numa frase mal formulada, ele
disse, numa passagem por Cabo Verde, que
“temos profunda gratidão ao continente africano por tudo que foi produzido
durante 350 anos de escravidão no nosso país”.
A assessoria pessoal do presidente
aconselhou-o a cuidar melhor de seus improvisos. De alguma forma, a
recomendação funcionou, e ele passou a ler seus discursos. Bastaram dois meses,
e ele a atropelou.
A última foi sua investida contra o
Tribunal Internacional de Haia:
— Quero estudar muito a questão desse Tribunal Penal Internacional. Até porque os Estados Unidos não é signatário (sic), a Rússia não é signatária. Quero saber por que o Brasil é signatário de uma coisa que os Estados Unidos não aceitam.
O Brasil aderiu ao Tribunal de Haia durante
o governo de Fernando
Henrique Cardoso. Os Estados Unidos não aderiram porque não passa pela
cabeça de um americano que um tribunal internacional condene um de seus
cidadãos. (Os Estados Unidos ajudaram a criar o Tribunal de Nuremberg, depois
da Segunda Guerra, para enforcar uma parte da elite política e militar da
Alemanha nazista.)
De lá para cá, os governos petistas
prestigiaram a Corte de Haia. Jair
Bolsonaro foi denunciado duas vezes, pela sua conduta durante a
pandemia e pelo tratamento que deu aos ianomâmis.
Explicando-se, Lula disse que “nem sabia da
existência desse tribunal”. Vá lá, ninguém é obrigado a saber de tudo.
Mais robusta, contudo, foi sua defesa dos
votos secretos nos julgamentos do Supremo Tribunal Federal. Não só pela
proposta em si, mas também pela forma como a apresentou, em duas frases:
— Este país precisa aprender a respeitar as
instituições.
— A sociedade não tem que saber como é que
vota um ministro da Suprema Corte.
Este país respeita as instituições, e é por
isso que Lula está no Planalto. Ademais, este país lhe deu o mandato de
presidente da República, não de bedel.
O voto secreto em tribunais colegiados é coisa
de governos totalitários. Ao defender essa ideia esquisita, Lula deu-se ao luxo
de dar um exemplo:
— Votou a maioria 5 a 4, 6 a 4, 3 a 2. Não
precisa ninguém saber.
Como ele gosta de futebol, poderia tentar
esse mecanismo com seu Corinthians. Como os jogadores, os juízes são avaliados
por seus desempenhos.
Uma das pedras de toque da jurisprudência
americana para a liberdade de expressão veio do juiz Oliver Wendell Holmes Jr.,
em 1919. O placar? 7a 2. Os dois votos que ficaram na minoria foram de Holmes,
cujo texto é citado até hoje, e de seu colega Louis Brandeis.
Pelo critério do jurisconsulto Lula, a
sociedade americana não teria que saber como votaram os juízes da Suprema
Corte, e o texto de Holmes teria ido para o lixo, com prejuízo para o Direito e
para a língua inglesa.
Brandeis já havia ensinado:
— A luz do Sol é o melhor desinfetante.
Para Lula, vale um conselho do presidente
americano Calvin Coolidge (1923-1929) famoso por não abrir a boca:
— Eu nunca fui prejudicado pelo que não
disse.
Um comentário:
Verdade,a última foi a pior.
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