Folha de S. Paulo
Certo mesmo é que, entronizado um juiz do
Supremo, nada mais o obriga ao genuflexório
"Eu não sou bonita, sou pior".
Sugestiva, a glosa atribuída a Mae West pode iluminar um tópico dúbio. É que
repercutiram como conservadores os primeiros votos do ministro indicado por Lula ao STF. Na realidade, todo juiz
do Supremo é conservador, na acepção de alguém pautado pela estabilidade das
instituições. Mas sem dogmatismo: no STF tem ressoado positivamente o reformismo
de costumes e direitos sociais.
Isso se sabe. A reação ao recém-chegado deve-se hipoteticamente à
subvocalização de algo como "não sou conservador, sou pior". Seria um
deslocamento da simples oposição ao reformismo para a zona obscura da nova
psicologia das massas e das adaptações políticas de um narcisismo cego em
ascensão.
Esse é apenas um dos aspectos ético-políticos da vida social, de que são protagonistas a cultura e o consenso popular, abalados pelo momento egoístico-passional da governança neoliberal. Até mesmo o conservadorismo ainda escorado em argumentos racionais é cada vez mais permeável ao tosco reacionarismo. Por isso, uma instituição já estruturalmente conservativa como o STF abriga o paradoxo de uma "ala conservadora". Ou seja, uma ala do pior.
Certo mesmo é que, entronizado um juiz do
Supremo, nada mais o obriga ao genuflexório. Nem lhe garante selo de qualidade
homogênea: há casos sofríveis, de mais vozes do que nozes. Pedro Bó é sempre um
espelho possível. Seja como for, frustração de expectativas faz parte do jogo,
em que tribunais e governos produzem estruturas de desejo e projeções
egocentradas sobre a vida dos outros.
Verdade pessoal de advogado é geralmente "esotérica", para dentro de
casa. Os primeiros votos do ministro podem ser, entretanto, sinalização
"exotérica", para fora, do que pensa um homem branco, alfa, gomalina
no cabelo. Oscilarão. Ao rebater as críticas com voto favorável aos indígenas,
ele mostra saber onde estão os holofotes. O vaivém não o faz menos conservador.
Nem desfaz o temor de que venha a pautar-se pela lógica do pior de alguns de
seus pares, terrivelmente juízes.
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