O Estado de S. Paulo
Na eleição, o ‘craque’ faz a diferença; mas ‘time’ que não joga coeso perde no Legislativo
A coesão partidária no Brasil tem sido muito
alta. O índice de coesão (que varia de zero, quanto o partido racha ao meio, a
1, quando todos os legisladores votam da mesma forma) médio dos partidos é
igual a 0,89 nesses últimos 20 anos.
O que explicaria uma coesão partidária tão
alta? A princípio, partidos coesos em ambiente altamente fragmentado não faria
o mínimo sentido. Afinal, a conexão eleitoral não obedece a uma lógica
partidária, mas é fundamentalmente baseada nos vínculos individuais do
parlamentar com o eleitor.
Identifico pelo menos três determinantes que podem explicar esse paradoxo.
Primeiro, a baixa accountability eleitoral no
Brasil. O eleitor não acompanha como seus representantes se comportam no
Legislativo. Daí, não existirem incentivos, vindos da esfera eleitoral, para
que parlamentares maximizem interesses individuais dentro do Congresso em
detrimento de ganhos coletivos do partido.
Segundo, a estrutura decisória dentro do
Legislativo é muito hierárquica. Com exceção da Mesa Diretora e dos líderes
partidários, poucos parlamentares exercem poder real. Esses líderes têm poder
de alocar recursos de campanha e orçamentários, postos-chave nas comissões etc.
Os parlamentares individuais têm baixos incentivos para não agirem
partidariamente num ambiente tão centralizado.
Terceiro, o rito legislativo obedece a uma
lógica partidária. O partido que se apresenta menos coeso tem menor chance de
ser efetivo. Em outras palavras, “jogar contra o time” é correr risco de ficar
abaixo na tabela de classificação. Tornase mais difícil galvanizar recursos,
firmar barganhas críveis e atrair candidatos competitivos. Por isso,
parlamentares jogam como time no Legislativo, enquanto jogam individualmente
para sobreviver na hora das eleições.
Não tem como o jogo eleitoral não ser feroz;
a lista aberta, com muitas vagas nos distritos eleitorais, indica que o
parlamentar individual precisa disputar com todo mundo. É cada um por si. Mas,
na arena legislativa, tudo é em função do coletivo.
Paradoxalmente, é a elevada fragmentação que
incentiva a alta coesão partidária. Em locais de baixa fragmentação e muita
penetração social dos partidos, dissentir do partido pode ser visto como crível
e eleitoralmente recompensável, como indica a pesquisa de Campbell et al.
(2016) para o Reino Unido. Mas em locais de alta fragmentação, e baixa inserção
social do partido, dissentir não indica nada aos eleitores, pois eles não
observam como seus representantes votam no Legislativo. Ao invés de um sinal,
torna-se mero ruído.
*PROFESSOR TITULAR DA ESCOLA BRASILEIRA DE
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E DE EMPRESAS (FGV EBAPE) E SÊNIOR FELLOW DO CEBRI
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