sexta-feira, 1 de setembro de 2023

Bruno Boghossian - O barulho e a Polícia Federal

Folha de S. Paulo

Ministro e diretor-geral poderiam pensar duas vezes antes de comentar ações contra principal adversário político de Lula

No dia em que a Polícia Federal desbaratou o esquema das joias, o ministro da Justiça emitiu uma sentença. Flávio Dino disse haver "direta relação" entre o golpismo e a venda dos presentes. "Era uma tentativa de golpe monetizado", anotou. Se a ideia era fazer um juízo político e tirar proveito do noticiário fervente, era melhor ter pensado duas vezes.

Com a PF sob seu guarda-chuva, um ministro da Justiça deve fazer tudo para preservar a imagem de uma corporação independente. Dino já cedeu mais de uma vez à tentação de comentar investigações contra o principal rival de seu grupo político.

Nesta quinta (31), o ministro ironizou a decisão de Jair Bolsonaro de não responder às perguntas da PF sobre as joias. Dino relembrou sua experiência como juiz e afirmou ver o silêncio de acusados como sinal de que "falar era pior do que calar".

O ministro tem o direito de pensar o que pensa, mas conhece as implicações do que fala. Horas depois, na GloboNews, ele mudou o tom, disse que "o silêncio é um direito" e afirmou que a interpretação dessa escolha será feita pelo Judiciário.

O diretor-geral da PF também fez barulho quando disse ao UOL, na semana passada, que uma prisão preventiva de Bolsonaro era uma possibilidade. Andrei Rodrigues foi cuidadoso ao apontar que aquela era só uma hipótese legal, mas uma cautela mais radical cairia bem naquele caso.

Os abusos cometidos por órgãos de investigação em anos passados renderam uma correção de rota enérgica. A PF baixou o volume depois de integrar espetáculos com manifestações enviesadas e deduções libertinas, quase sempre alimentadas por uma agenda política mal disfarçada.

Dino e Rodrigues deram um firme respaldo a esse ajuste. Os dois poderiam aproveitar para fugir de certos erros. É inevitável que se forme uma disputa política em torno de cada inquérito que carrega o nome de Bolsonaro. O mínimo que o Ministério da Justiça e a Polícia Federal podem fazer é fechar hermeticamente até as menores brechas para questionamentos.