Valor Econômico
Copom não está disposto a fazer sinalizações num ambiente de grande incerteza, mas quer mostrar que não está leniente
O diretor de política monetária do Banco
Central, Gabriel Galípolo, foi porta-voz da mensagem mais conservadora do
Comitê de Política Monetária (Copom) que coloca sobre a mesa a possibilidade de
subir os juros na reunião de setembro. Qual é a chance de essa ameaça ser
levada a cabo?
Como o Copom não assumiu antecipadamente nenhum compromisso firme - vai depender de como os dados evoluem até lá - não é possível afirmar com certeza. O que dá para dizer é que, se o comitê se confrontar com a mesma situação do último encontro, o cenário provável é a Selic subir acima dos atuais 10,5% ao ano.
Há dez dias, quando saiu o comunicado da
última reunião, a leitura predominante foi de que o comitê foi “dovish”, ou
pouco inclinado a aperto nos juros. Participantes do mercado sentiram falta de
uma sinalização firme e direta de alta da Selic, ou um “forward guidance”.
O Copom não está disposto a fazer
sinalizações num ambiente de grande incerteza, mas quer mostrar que não está
leniente. Ao longo do tempo, vem transmitindo um grau crescente de desconforto,
que vai apertando o torniquete monetário. Antes de maio, havia a possibilidade
de cortes de juros. Em junho, o cenário passou a ser a estabilidade da Selic
num patamar mais restritivo por mais tempo. Na última reunião, subscreveu a
precificação de chances maiores de uma alta de juro. Apesar de não ser nenhuma
promessa, as condições financeiras já estão refletindo de fato essa
possibilidade.
Galípolo, em um discurso na última quinta,
notou que o mercado financeiro passou a entender o balanço de riscos para a
inflação como uma indicação futura para a taxa de juros. “A mudança do balanço
de riscos para assimétrico assumiu a função quase de um ‘guidance’ sobre o que
seria feito na próxima reunião”, disse o diretor do BC. “Não me parece o mais
adequado.”
E, realmente, não é. O que o balanço de
riscos da reunião de julho informa é o grau de ceticismo com que os membros do
Copom enxergavam o cenário econômico central - e as projeções de inflação dele
derivadas - na própria reunião de julho. O que influencia a decisão de setembro
é o balanço de riscos vigente em setembro.
As projeções de inflação e balanço de riscos
de julho são importantes não porque indicam a decisão sobre os juros na próxima
reunião, mas porque são o ponto de partida para a análise do cenário econômico
que será feita até lá. Para Galípolo, essa largada é “desconfortável”.
Pelo que tudo indica, se o Copom encontrar em
setembro as mesmas condições que encontrou em julho, deve ter alta da Selic.
Galípolo disse que o cenário precisa melhorar, e não serve qualquer melhora,
como uma queda do dólar que não represente mudança na dinâmica da inflação.
O Copom reconheceu, disse, que a inflação
projetada para março de 2026, de 3,2%, estava acima da meta, de 3%. Para ele,
isso responde a uma controvérsia que havia no mercado: será que Banco Central
entendia que, com uma projeção de 3,2%, “o cenário atual estava OK e aguardava
não ter uma deterioração”?; ou será que considerava o cenário atual
“desconfortável” e precisava de uma melhora?
“As coisas como estão hoje colocam um cenário
desconfortável”, disse o diretor do BC. Ele também colocou sua opinião de que o
balanço de riscos para a inflação pende mais para o lado negativo, enquanto o
comitê como um todo considerou que havia pesos iguais entre fatores positivos e
negativos.
O que falta esclarecer é por que, em julho, o
Copom já não caminhou para o aperto, fazendo algo sobre esse desconforto. Em
tese, poderia ser porque a incerteza é grande e há chance de o quadro melhorar.
Ou então havia o desejo de esperar mais tempo para formar um consenso dentro do
comitê.
Qual seria a melhora necessária para
dispensar uma alta de juros? Alguns participantes de mercado têm depositado
alguma esperança de que, se o banco central americano der algum refresco,
baixando os juros de forma mais acelerada, o ambiente inflacionário para o
Banco Central brasileiro vai se desanuviar - dispensando não apenas apertos por
aqui, mas abrindo a possibilidade de retomar o afrouxamento.
Galípolo colocou requisitos relativamente
altos para desarmar o seu estado de desconforto, ao dizer que movimentos na
cotação do dólar não se refletem, de forma mecânica, na inflação e, portanto,
na condução da política monetária.
A princípio, parece uma daquelas frases
vazias que o Banco Central repete. Mas a mensagem parece ser que o Copom não
vai usar o dólar como desculpa para deixar de fazer o que é preciso para
controlar a inflação.
Galípolo lembrou que o efeito do dólar na
inflação não é linear, ou seja, sempre igual a despeito das circunstâncias. E
não é: o ganho com a queda do dólar pode ser menor se a expectativa de inflação
está desancorada, se os riscos fiscais alimentam dúvidas sobre se a valorização
do real será permanente e se a economia está aquecida demais.
Ele colocou o foco na inflação causada pela
demanda, minimizando ganhos que possam ocorrer por choques positivos de oferta,
por mais que tenham alguns efeitos secundários duradouros. Para lidar com esse
tipo de inflação, não tem truque: é preciso a política monetária apertada.
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