Folha de S. Paulo
A maldição dos recursos naturais ou o que
explica a instabilidade política na Venezuela?
As vicissitudes da democracia na Venezuela explicam-se
por vários fatores. Trato aqui de um dos mais importante deles —de natureza
estrutural—: o país é um petroestado.
O país liderou a formação da OPEP (1960), embora a PDVSA só tenha sido concebida em 1976, duas décadas depois da criação da Petrobras. Durante o chamado 1º choque do petróleo, o barril do produto foi de US$ 3 para US$ 12, e chegou a US$ 34, em 1980. O país passou, então, a ostentar a maior renda per capita da América Latina.
A euforia desmesurada produzida levou os
venezuelanos a serem conhecidos em Miami como "dame dos" (dê-me
dois). A percepção de que o país virara uma potência global e a sua inédita
popularidade mundial levaram o glamoroso presidente Carlos Andrés Perez (CAP) a buscar ser protagonista da
high politics, tornando-se líder da Internacional Socialista, e mediando
conflitos internacionais.
A grandiloquência de suas iniciativas,
interna e externamente, deu com os burros na água quando a receita pública
despencou e o país teve que se endividar fortemente para manter o vasto
conjunto de projetos em curso; as isenções fiscais fabulosas para todos os
setores e as subvenções sociais anabolizadas. E, sim, também iniciativas como
as orquestras populares.
A colossal reversão de expectativas geradas
levou à sua debacle eleitoral para a oposição (Copei). Mas CAP 2 (1989-1993) retornou quatro anos depois
prometendo voltar à bonança anterior. Só que agora o projeto era implementar
uma ampla reforma fiscal e do Estado com um grupo de economistas treinados no
MIT e em Harvard. A reforma incluía a eleição direta de governadores, antes
nomeados, a introdução de taxação efetiva sobre consumo e renda etc.
Não sobreviveu ao que foi visto como um
estelionato eleitoral. Já no início do mandato a elevação do preço da gasolina
deflagrou o Caracazo, no qual estima-se que 300 pessoas morreram e 5.000
ficaram feridas. Seu partido, Acción Democratica, AD, rachou; e CAP rompeu com seu mentor Rómulo Betancourt o
ex-presidente por dois mandatos e fundador da AD.
Beneficiando-se da intensa frustração
coletiva, o tenente-coronel Chávez e seus soldados assaltaram com blindados a
"Casona" para prender o presidente, sem sucesso. Nove meses depois
bombardearam o palácio presidencial. O coronel tentou dar um golpe à moda
antiga e foi preso. Com a popularidade no chão, CAP sofreu impeachment, para o
que a própria AD votou a favor.
Perdoado, o coronel golpista elegeu-se e se
beneficiou do boom de commodities, como ocorrera com CAP 1 (1974-1979), um
político populista de centro-esquerda. Foi Chávez, contudo, um populista
autoritário, igualmente irresponsável fiscalmente, que deu o golpe final na democracia venezuelana.
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