Folha de S. Paulo
Sem mobilização, ideia da redução da jornada
tende a morrer, mas mexe na pauta política
O projeto de diminuir a jornada de trabalho é
iniciativa de um partido pequeno, o PSOL,
o mais à esquerda da reduzida esquerda, ainda mais
diminuída na eleição municipal. Faz sensação nas ruas das redes
sociais, tal como um meme ou uma treta de influenciadores; é assunto como um
"coach" ou como um crime.
Mas o "6x1" não é nada disso ou muito mais do que isso. Difícil saber até onde vão a onda de interesse pelo assunto e seus desdobramentos políticos —isto é, além do mundo da política politiqueira, de parlamentos, partidos e governos. Sem mobilização, organização coletiva, tais assuntos tendem a morrer. No entanto, a ideia de redução da jornada entrou na contramão da conversa do "establishment", atrapalhando o tráfego.
Mudanças em leis do trabalho ou da
Previdência mexem na medula das relações socioeconômicas: nos termos em que se
dão a distribuição e a redistribuição (via impostos e transferências estatais)
da renda e, também, no balanço de poderes que afetam a divisão do produto da
economia.
Se uma tal discussão se impusesse por causa
de apelo
reverberado pelas temidas redes sociais, poderia balançar também os
termos em que se dá a discussão política.
O projeto de limitar a jornada de trabalho é
uma das mais antigas reivindicações esquerdistas. A ideia, porém, tem estado
fora da pauta de uma esquerda na retranca. Por outro lado, confronta
conservadores de quase qualquer espécie, direitas, liberalismos e
suas variadas alianças. Em um mundo em que as direitas comemoram votações e a
adesão popular a suas teses, o coro do "6x1" dá um tiro no concerto.
Tal barulho aparece em um momento em que
muito se discutia o apelo popular do "empreendedorismo". Até a
esquerda, em uma compreensão simplista de queixas populares, passou a tratar de
modo demagógico ou improvisado da questão —apesar de todos os pesares, a maioria dos
trabalhadores do país tem contratos, sob CLT ou de serviço público.
Não quer dizer que o Estado não seja tido, por muita gente, como um empecilho
caro e de fato revoltante para quem queira ter um negócio, por menor e simples
que seja. Quer dizer apenas que o assunto é multifacetado. Uma prova é o grande
interesse pela rejeição do "6x1".
Reformas das
leis trabalhistas e da Previdência (de 2017 a 2019) foram aprovadas quase sem
protesto popular relevante. Ou bem mudou o interesse das pessoas por
assuntos similares ou trabalhadores pensam o assunto de modo diferente daquele
da política convencional, de esquerda inclusive. As pessoas quereriam proteções
para o trabalho ou direitos conexos, mas em outros termos.
Agora mesmo, o governo está para divulgar um
plano de contenção de despesas. A depender do que sair, Lula 3
pode se encrencar seriamente, ainda mais em tempos de possível convulsão
trumpiana: ter de enfrentar mais inflação ou mais juros. Decerto o reajuste do
salário mínimo e dos benefícios do INSS interessa
diretamente a talvez mais de metade do país. No entanto, não se vê reação
organizada, ruidosa, "de base", a mudanças no mínimo, assunto do qual
se encarregam o PT e
associados.
O resumo desta ópera é que há muito mais
debate e questão social dando sopa na praça das redes, uma discussão
fora do foco da vista cansada da esquerda e longe da ilusão de supremacia das
direitas.
2 comentários:
O brasileiro pobre é de direita,mas vota em Lula,estranho!
Quem ganha até dois salários mínimo,diga-se.
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