quarta-feira, 13 de novembro de 2024

6x1 dá de 7x1 na política convencional – Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

Sem mobilização, ideia da redução da jornada tende a morrer, mas mexe na pauta política

O projeto de diminuir a jornada de trabalho é iniciativa de um partido pequeno, o PSOL, o mais à esquerda da reduzida esquerda, ainda mais diminuída na eleição municipal. Faz sensação nas ruas das redes sociais, tal como um meme ou uma treta de influenciadores; é assunto como um "coach" ou como um crime.

Mas o "6x1" não é nada disso ou muito mais do que isso. Difícil saber até onde vão a onda de interesse pelo assunto e seus desdobramentos políticos —isto é, além do mundo da política politiqueira, de parlamentos, partidos e governos. Sem mobilização, organização coletiva, tais assuntos tendem a morrer. No entanto, a ideia de redução da jornada entrou na contramão da conversa do "establishment", atrapalhando o tráfego.

Mudanças em leis do trabalho ou da Previdência mexem na medula das relações socioeconômicas: nos termos em que se dão a distribuição e a redistribuição (via impostos e transferências estatais) da renda e, também, no balanço de poderes que afetam a divisão do produto da economia.

Se uma tal discussão se impusesse por causa de apelo reverberado pelas temidas redes sociais, poderia balançar também os termos em que se dá a discussão política.

O projeto de limitar a jornada de trabalho é uma das mais antigas reivindicações esquerdistas. A ideia, porém, tem estado fora da pauta de uma esquerda na retranca. Por outro lado, confronta conservadores de quase qualquer espécie, direitas, liberalismos e suas variadas alianças. Em um mundo em que as direitas comemoram votações e a adesão popular a suas teses, o coro do "6x1" dá um tiro no concerto.

Tal barulho aparece em um momento em que muito se discutia o apelo popular do "empreendedorismo". Até a esquerda, em uma compreensão simplista de queixas populares, passou a tratar de modo demagógico ou improvisado da questão —apesar de todos os pesares, a maioria dos trabalhadores do país tem contratos, sob CLT ou de serviço público. Não quer dizer que o Estado não seja tido, por muita gente, como um empecilho caro e de fato revoltante para quem queira ter um negócio, por menor e simples que seja. Quer dizer apenas que o assunto é multifacetado. Uma prova é o grande interesse pela rejeição do "6x1".

Reformas das leis trabalhistas e da Previdência (de 2017 a 2019) foram aprovadas quase sem protesto popular relevante. Ou bem mudou o interesse das pessoas por assuntos similares ou trabalhadores pensam o assunto de modo diferente daquele da política convencional, de esquerda inclusive. As pessoas quereriam proteções para o trabalho ou direitos conexos, mas em outros termos.

Agora mesmo, o governo está para divulgar um plano de contenção de despesas. A depender do que sair, Lula 3 pode se encrencar seriamente, ainda mais em tempos de possível convulsão trumpiana: ter de enfrentar mais inflação ou mais juros. Decerto o reajuste do salário mínimo e dos benefícios do INSS interessa diretamente a talvez mais de metade do país. No entanto, não se vê reação organizada, ruidosa, "de base", a mudanças no mínimo, assunto do qual se encarregam o PT e associados.

O resumo desta ópera é que há muito mais debate e questão social dando sopa na praça das redes, uma discussão fora do foco da vista cansada da esquerda e longe da ilusão de supremacia das direitas.

2 comentários:

ADEMAR AMANCIO disse...

O brasileiro pobre é de direita,mas vota em Lula,estranho!

ADEMAR AMANCIO disse...

Quem ganha até dois salários mínimo,diga-se.