É intrigante: a gente não sabe se chora ou se acha graça. Recebe ela, segundo a própria, orientações espirituais de uma pequena estátua (de madeira) de Maria, mãe de Jesus, existente na igreja local, da qual verte ou vertia sangue e lágrimas. Nas suas advertências, Sasagawa relata genericamente, como no Apocalipse e até em Nostradamus, as possibilidades dos desastres naturais, das crises sociais , e dos conflitos inesperados entre países tornarem-se ainda mais frequentes com o colapso espiritual da humanidade.
Reconhece Sasakawa que os humanos estão
"correndo atrás", mas, ambiguamente: enquanto alguns se esforçam
solidariamente para conservar e proteger os recursos da natureza,
outros destroem levianamente as pequenas oportunidades de
amenizar os desafios e ameaças das mudanças climáticas
à sobrevivência da humanidade , adotando modelos,
iniciativas predatórias dos recursos e comportamentos
erráticos. Para os oportunistas, nas reuniões preparatórias da COP-30, que
acontecerá em 2025, em Belém, o tema de destaque não será a emissão de
gases-estufa , mas o tal fundo do clima que, pretende-se , seja
iniciado com doações internacionais da ordem de US$ 20
trilhões, e chegue a R$ 60 trilhões.
E, assim, com a atenção
concentrada no fundo trilionário, como uma panaceia, os governos e a
sociedade vão perdendo o contato com o sagrado, e naturalizando
episódios desastrosos para a vida no planeta como as inundações no Rio
Grande do Sul e na Espanha, a seca no rio Amazonas , os vulcões e
maremotos, a insana invasão da Ucrânia, em que já morreram mais de 50 mil
civis e foram destruídos milhares de hectares de terras
produtoras de alimentos. Ninguém consegue também apaziguar as desavenças entre
populações irmãs no Sudão, cujo conflito tem gerado milhares de
desabrigados, mortos , crianças famintas como resultado da destruição
de áreas agrícolas produtivas.
As gestões laicas, instáveis e
inconsequente no uso dos recursos naturais pela sociedade , conforme a
freira Sasakawa, acarreta prejuízos humanos e planetários . O IBGE
detectou 120 favelas em cidades brasileiras abrigando juntas 16, 3
milhões de pessoas . Nos centros de São Paulo , do Rio de
Janeiro existem 150 mil pessoas vivendo em favelas e nas
ruas. Uma única favela em Brasília ( Sol Nascente), a 20 km da
praça dos Três Poderes, reúne 70 mil pessoas. São 16 milhões
de invisíveis, que, sem um solo para se instalar, destroem e
ocupam biomas do cerrado, matas nativas , terras produtivas. Vivem
em estado de pobreza quase absoluta. Total abandono .
Manaus e Belém (cerca de 200 mil favelados), justamente as que mais devem
atrair participantes para a COP-30 , e o Amapá, , são lembradas
como capturadas não apenas pela penúria, mas ainda pela
transgressão .
Essas populações abandonadas pelas políticas
públicas e que se alimentam uma vez por dia convivem no cotidiano com
grupos criminosos, traficantes de drogas e milícias profissionais à
serviço a indivíduos explicitamente predadores dos recursos florestais e
minerais descompromissados com a sau proteção . Esse estado de coisas ,
acompanhado de uma violência aberta, banalizou-se na vida
cotidiana dessas comunidades, gerando a indiferença pública e privada.
Nos centros urbanos, que congregam mais
de 60 por cento da população do mundo, o modelo industrial vulgarizou a
emissão de gases poluentes destruidores da camada de ozônio que envolve a terra
, e a classe média tornou o desperdício de recursos um fato corriqueiro. Isso
tudo leva a destruição de áreas naturais e agricultáveis sinalizando para fomes
futuras . Efeitos desestabilizadores das condições climáticas no planeta não se
inibem diante de tratados e acordos, seja nos Estados Unidos, China
, Brasil, Rússia, Alemanha, Gran Bretanha. O modelo predatório de que fala a
freira Sasagawa tem muitas faces.
À espera da COP-30, são realizados encontros
e feitas discussões prévias sobre a transição energética - dos combustíveis
fósseis aos bio combustíveis - caminhando-se desafiadoramente na
contramão dos usos, costumes e produtos da sociedade atual, e dos interesses
petrolíferos no mundo (um Oriente Médio inteiro, Rússia e outros). Até parece
que esses encontros do clima não estão sendo conduzidos por quem entende
do assunto. A discussão ambiental é residual ou usada para se sonhar com
dezenas de fundos ambientais, que geram muitos empregos e poucos
resultados claros.
Daqui até novembro do próximo ano o tema COP-30 será a panaceia para a ingovernabilidade e a justificativa para omissões ambientais e sociais. Para os não religiosos e oportunistas, sagrado mesmo é o sonhado fundo trilionário do clima. Pesquisa do Datafolha revelou que 46 por cento dos municípios brasileiros ignoram a crise climática, não sabem sequer do que se trata. Segundo Max Weber, para os protestantes, "Time is money". Como o Brasil é um país católico, vamos seguir a freira Sasakawa, mas ouvir o Papa Francisco, que é adepto de Santo Agostinho, um religioso ambientalista.
* Jornalista e professor
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