sábado, 30 de novembro de 2024

A COP 30, a Paz e a (in)sustentabilidade do Planeta - George Gurgel de Oliveira*

O Brasil, há um ano da COP30 que se realizará em Belém do Pará, de 10 a 21 de novembro de 2025, prepara-se para receber mais de 60 mil pessoas, incluindo chefes de Estado, diplomatas, organizações empresariais e da sociedade civil de 193 países do mundo.

A COP30 coloca o Brasil na centralidade das discussões ambientais globais e regionais: advogando a consequente redução dos gases de efeito estufa, a preservação dos nossos ecossistemas, particularmente amazônico, da biodiversidade, dos oceanos, da água, ampliação do uso de energias renováveis, assim como a mitigação dos impactos econômicos e sociais causados pelas mudanças climáticas, ora em curso, atingindo toda a humanidade.

A Paz como fundamento da sustentabilidade humana no planeta

A Paz, nunca foi devidamente considerada nos Fóruns Ambientais Globais como fundamento da sustentabilidade humana no Planeta. Portanto, propomos considerar a Paz como princípio nas relações dos seres humanos entre sí e com a própria natureza.

Os horrores das guerras, acompanhadas em tempo real e espetacularizadas nos meios de comunicação, evidenciam a barbárie do mundo em que vivemos, que nada aprendeu diante das tragédias desencadeadas durante as guerras mundiais do século xx, provocadas pelo nazi-fascismo e o holocausto nuclear liderado pelos EUA contra o Japão.

As atuais guerras em andamento, envolvendo a Ucrânia e a Rússia, assim como Israel, a Palestina, o Irã e o Líbano, são pontas do iceberg: persiste a cultura da guerra fria, subordinando a Europa à política militar da OTAN, diante de um beligerante cenário político internacional, colocando em risco a existência da própria humanidade no planeta.

Os gastos militares dos países da OCDE aumentam significativamente, sobretudo os dos EUA, China, Rússia, Ucrânia, Israel e da União Européia. Segundo os dados do conceituado Instituto de Pesquisa para a Paz, de Estocolmo, apenas os EUA e a Rússia totalizam 90% do arsenal nuclear mundial, perseguidos pela China que vem se modernizando militarmente, inclusive na área nuclear.

Destaque-se, segundo o referido Instituto, os fabulosos gastos militares dos Estados Unidos no ano de 2023, da ordem 916 bilhões de dólares, vindo em seguida a China com 296 bilhões de dólares e a Rússia, em terceiro lugar, com 109 bilhões de dólares. Na sequência, temos Índia, Arábia Saudita, Reino Unido, Alemanha, Ucrânia, França, Japão. Dos países em guerra, a tragédia maior é da Ucrânia, que investe 37% do seu pib em gastos militares. A Rússia utiliza 5,9 % e Israel, na décima quinta posição, aplica 27,5 bilhões de dólares, correspondente a 5,3 % do PIB nacional.

São valores astronômicos, relacionados claramente com as tragédias políticas, econômicas, sociais e ambientais de cada país e as regiões onde as guerras acontecem. Há ainda as tenebrosas transações envolvendo os complexos industriais militares das potências hegemônicas com os países asiáticos, africanos e latino-americanos.

Como a Comunidade Internacional está se posicionando frente a esta trágica realidade?

As guerras e os conflitos regionais colocam em cheque o anacronismo das atuais organizações multilaterais, principalmente da ONU, que ainda funcionam com a lógica dos vencedores da segunda guerra mundial, com o poder de veto da Rússia (substituindo a URSS), os EUA, a Inglaterra, a França e a China.

Segundo a ONU, existem atualmente no mundo 30 regiões em conflito, a maioria armados. Os conflitos envolvem disputas territoriais, diferenças étnicas, religiosas e apropriação das fontes naturais: água, petróleo, gás, biomassa, energia solar, eólica. Portanto, existem no mundo, há décadas, zonas de tensão geopolítica não resolvidas, a exemplo das Coreias, do Irã, da Palestina e Israel. Considerem-se ainda os movimentos separatistas que criam instabilidades políticas e econômicas, como na Irlanda do Norte, no País Basco e na Catalunha, no Quebec e na Colômbia, entre outros.

Ao mesmo tempo, a humanidade convive com as questões relacionadas às mudanças climáticas. Os investimentos do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente  (PNUMA-2023) em relação a Adaptação Climática para o ano de 2023, seriam da ordem de 200 bilhões/ano, sob a responsabilidade, principalmente do G20, mas não se realizaram. Os investimentos e as ações mitigadoras em relação às mudanças climáticas estão sempre sendo adiados, atingindo sobremaneira as populações mais vulneráveis da África, Ásia e América Latina. Os investimentos anuais seriam da ordem de 200 bilhões para a minimização dos efeitos climáticos, segundo o referido relatório. No mesmo ano de 2023, os gastos militares dos EUA, China e Rússia foram acima de 1 trilhão de dólares!

Portanto, constata-se que as guerras e os conflitos regionais drenam recursos fabulosos que poderiam estar sendo empregados para o enfrentamento dos reais problemas da humanidade, inclusive os relacionados com as mudanças climáticas e as respectivas agendas econômicas, sociais e ambientais a serem discutidas na COP30, em 2025, no Brasil.

Sob qual perspectiva nos colocamos? O que temos a dizer como sociedade brasileira e mundial no processo de construção de novas relações internacionais centradas na vida, no caminho de uma sociedade mais solidária, tendo a Paz como fundamento da sustentabilidade humana no planeta?

A lógica da guerra, de resolver os conflitos entre os países manu militari, não interessa à maioria da humanidade. A quem interessa? Interessa aos complexos industrial-  militar das potências hegemônicas, historicamente construídos, consolidados nos tempos da guerra fria e que sobrevivem até a atualidade. Imaginem se os gastos militares, desde a primeira guerra mundial, tivessem sido investidos para a afirmação de uma Cultura para a Paz? Para o enfrentamento dos reais problemas políticos, econômicos, sociais e ambientais da sociedade humana?

As guerras na Ucrânia, na Palestina, em Israel, no Irã e no Líbano, como outros conflitos regionais em curso, desnudam as fragilidades da própria ONU e dos sistemas políticos, econômicos e sociais do mundo em que vivemos, desafiando a humanidade na perspectiva de construção de novas relações entre sí e com a própria natureza.

As realidades das ruas e das redes sociais, em qualquer lugar do planeta,  trazem em tempo real para toda a Humanidade os genocídios e as tragédias sociais, econômicas e ambientais de milhões de pessoas, atingindo principalmente as crianças e as pessoas mais velhas. A maioria destas populações continuam à margem das conquistas sociais mais elementares: educação, trabalho, alimentação, moradia, saúde, saneamento básico, mobilidade, inclusão digital e uma renda básica, apontados como direitos universais.

Assim, a luta pela Paz é a luta pela Sustentabilidade do Planeta, é a luta pela vida de cada um de nós. A ONU transformada, refletindo a complexidade do mundo em que vivemos, deve ser o espaço privilegiado no caminho da resolução dos conflitos militares entre a Rússia e a Ucrânia, entre Israel, a Palestina, o Irã e o Líbano e de todos os outros conflitos militares em curso no planeta. Devemos afirmar e reafirmar os valores que nos fazem humanidade: a cooperação, a solidariedade, a luta pela igualdade, a liberdade e a fraternidade . Há espaços, inclusive na COP30 a ser realizada no Brasil em 2025, para a construção de novas relações políticas, econômicas e sociais, direcionando o conhecimento humano a favor do enfrentamento dos reais problemas da Humanidade, onde a cultura da Paz coloca-se como fundamento da democracia e da sustentabilidade humana no Planeta. São valores universais para a sociedade contemporânea, no caminho de sermos uma melhor humanidade.

*Membro da UFBA e Diretor do Instituto Politécnico da Bahia.

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