Folha de S. Paulo
Ex-presidente apelou à 'rataria' e esqueceu
lições de Maduro e Ortega
Daniel Ortega é um ex-guerrilheiro que se tornou ditador,
um Fidel Castro de segunda divisão. Líder da revolução
sandinista que derrubou a dinastia Somoza, governou a Nicarágua na
década de 1980 e voltou ao poder em 2007. Desde então, em sucessivas eleições
mandrake, não largou mais o osso. Em novembro, o Congresso de lá aprovou por unanimidade uma reforma constitucional dando poder sem limites a Ortega e
à sua mulher, Rosario Murillo, que assumiu a função de
"copresidente".
Ortega não precisou voltar aos tempos de guerrilha e emboscadas nem dar um
golpe de Estado clássico para alcançar seu objetivo. Mais ou menos como Nicolás Maduro na Venezuela,
produziu uma autocracia populista por meio de um processo aparentemente
legítimo —a eleição. Passo a passo, foi capturando as instituições, sobretudo
o Judiciário.
Quando necessário, usou as Forças Armadas e grupos de milicianos para eliminar
adversários. Para pôr em prática essa equação antidemocrática não faz a menor
diferença ter uma ideologia de esquerda ou de direita.
Nos velhos botequins havia um mandamento:
quem não tem competência não se estabelece. Ao perder a reeleição —primeiro
presidente a conseguir a façanha—, Bolsonaro não fez o dever de casa. Não foi um aluno tão
aplicado quanto o colega Ortega.
Hidrófobo, o capitão apelou à "rataria", termo usado para se referir aos militares
palacianos que planejaram o golpe que previa, entre outras atrocidades,
aniquilar Lula e instalar campos de concentração para opositores — como os
de Hitler.
Sem deixar de ser tosca e sanguinária, a trama revelada nas 884 páginas do documento da Polícia Federal ora lembra uma comédia macabra, com
generais caducos fazendo anotações em caderninhos, ora um roteiro de Elmore
Leonard, com padres esmerilhando nos diálogos: "Se ele [Bolsonaro] não
fizer isso, ele vai se foder e o povo também vai se foder".
A única coisa que funcionou foi o plano de escape. Bolsonaro se vende
como imbrochável, imorrível e incomível. Mas será lembrado como
fujão. Nos filmes de Hollywood os bandidos vão para o Rio. Ele se mandou para
Orlando, levando a cafonice até o fim.
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