Folha de S. Paulo
Ajuste 'estrutural' fica para um dia, contas
ainda estarão doentes, mas dá para conter crise
Fazenda e Planejamento terão de fazer mágicas
e milagres a fim de apresentar um plano
de redução do ritmo de aumento de gastos que não seja sabotado
por governo e PT,
que seja aprovado por Lula da
Silva, que não seja avacalhado no Congresso e que convença os credores da
dívida pública.
É difícil, mas Fernando
Haddad e Simone Tebet podem
até conseguir aprovar medidas que, como dizem os médicos, coloquem o paciente
em situação "estável" (pode estar ruim, mas parou de piorar, com
sinais vitais em níveis aceitáveis).
Nos últimos 12 meses, a despesa do governo federal, em termos reais (descontada a inflação), somou R$ 2,32 trilhões. Sem precatórios de pessoal, custeio e capital, foi de R$ 2,22 trilhões. Vamos considerar aqui a despesa sem precatórios. É apenas um exercício para facilitar a discussão (precatório é outro rolo grande). Não há juros nessa conta (que são "pagos" com mais dívida). A receita foi de R$ 2,1 trilhões.
A despesa aumentou R$ 211 bilhões, mais 10,5%
em um ano, um espanto. O aumento do
gasto com Previdência (aposentadorias, pensões e auxílios do INSS) equivaleu
a 19,2% do total desse aumento. O aumento do gasto com BPC (Benefício de
Prestação Continuada) foi equivalente a 6,3% do aumento total (são benefícios
para idosos e deficientes pobres).
É impossível conter esses gastos, de
imediato, a não ser reduzindo o reajuste do piso do INSS (um salário mínimo) ou
apertando a concessão (evitando fraudes, por exemplo). Difícil sair grande
coisa por aqui além de um limite para o BPC.
Despesas com
saúde e educação (obrigatórias e discricionárias) aumentaram R$
69,6 bilhões, alta de 37,6% em um ano, equivalente a 33% do aumento da despesa
total. Parte do aumento do gasto com saúde e educação voltou a ser vinculada,
com Lula 3: a receita sobe, despesas vão no mesmo ritmo, facilmente
ultrapassando o limite imposto do arcabouço fiscal (70% do ritmo do aumento da
receita total, limitado a 2,5% real).
Aqui, o aumento maior e enorme já foi
(esperamos ver logo o resultado dessa magnífica despesa extra). Mas, como as
contas do governo estão no bico do corvo, será preciso limitar o crescimento
dessas despesas ao fixado pelo arcabouço e passar a contar o Fundeb nesse
pacote.
A despesa com
Bolsa Família cresceu 16%, 11,3% do aumento total, mas se
estabilizou (até caiu um tico). O gasto com seguro-desemprego foi 2,3% do
aumento total de despesa, mas cresceu 10%, em tempo de emprego recorde. Não faz
sentido. A alta da despesa com pessoal foi de 4% do total, mas, por ora, está
em nível historicamente baixo.
E daí? Haddad e Tebet terão de comer pelas
beiradas. O dito "ajuste estrutural" ou estruturalzinho ficará para
outro governo.
Supondo que o plano sobreviva à maratona
política, ainda restará o problema de que as despesas aumentaram para níveis
altos e, em geral, permanentes, em termos legais ou políticos, embora várias
tenham se estabilizado desde junho.
Isto é, a fim de que se atinjam as metas
fiscais, ainda será preciso aumentar receita (mais imposto, menos isenção de
imposto ou mais receita advinda de crescimento maior). Dá para conter a bola de
neve crescente, mas a bola é grande.
Em suma, um grande remendo é possível. A
situação continuará periclitante, e as taxas de juros não baixarão muito, tudo
mais constante. Mas é possível estabilizar o paciente.
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