Folha de S. Paulo
Livro de neurologista britânico descreve a
imaginação como superpoder humano, que nos diferencia de outros hominídeos
Não é preciso mais do que fotos de satélite
para perceber que humanos, como espécie, chegamos mais longe do que
nossos primos chimpanzés. Para ficar nuns poucos exemplos, nós
construímos cidades, criamos grandes plantações, cavamos canais marítimos entre
continentes e eles não.
Qual é o superpoder humano que nos deu vantagem? Já apareceram vários
candidatos ao posto, como a linguagem, o polegar opositor, a capacidade de correr longas
distâncias. Em "The Shape of Things Unseen" (a forma das coisas
invisíveis), o neurologista britânico Adam Zeman sugere que nosso
superpoder é a imaginação.
Zeman vai às artes, aos sonhos, aos delírios,
a doenças e a vários ramos da ciência para mostrar que a imaginação é muito
mais do que uma característica encontrada em pessoas criativas. Ela é constitutiva de nossa espécie,
estando presente em praticamente todos os processos mentais, da percepção à
consciência, passando pelo aprendizado.
Muitos neurocientistas descrevem aquilo que percebemos
pelos sentidos como uma alucinação controlada. O cérebro recebe a cada instante
um número proibitivamente grande de informações sensoriais, muitas vezes e
inconsistentes e até contraditórias. O único modo de extrair sentido disso tudo
é recorrendo à imaginação. São os sinais que fogem àquilo que imaginamos ser o
normal que chamam a atenção e nos levam a agir.
A imaginação também nos dá a capacidade de viajar no tempo, revisitando o
passado e ensaiando situações futuras, o que está na base do aprendizado, do treinamento e da estabilidade (ou
instabilidade) emocional.
Nossa imaginação difere da de nossos parentes hominídeos por ser mais facilmente
compartilhável com nossos semelhantes, criando assim realidades imaginadas que
caracterizam todas as nossas instituições sociais, do dinheiro à ciência.
O livro é didático e gostoso de ler. Zeman, como um britânico cultivado
(Oxford), o recheia de referências literárias, pictóricas e musicais, que são
apenas a faceta mais óbvia da imaginação.
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