quarta-feira, 3 de setembro de 2025

E se Bolsonaro fugisse? Por Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Eventual exílio de Bolsonaro serviria para retirá-lo de circulação, mas reduziria efeito dissuasório de pena para tentativa de golpe

Já ouvi de mais de um interlocutor cujas opiniões respeito que o melhor para o Brasil seria que o ex-presidente Jair Bolsonaro lograsse escapar e se tornasse hóspede permanente de Donald Trump ou de Viktor Orbán. Nós nos livraríamos de um problema ao menor custo possível.

Eu até concordaria com essa tese, se o Brasil estivesse num estágio mais precário de desenvolvimento institucional, no qual a provável prisão de Bolsonaro encerrasse risco de comoção social ou mesmo guerra civil.

Aproveito para fazer uma breve digressão. A jurisdição universal para violações graves de direitos humanos é um avanço institucional, mas produziu pelo menos um efeito colateral adverso. O fato de ditadores saberem que não estarão seguros no exterior funciona como um incentivo a lutarem até o fim para permanecer no poder, em vez de optar por um exílio que pouparia sua nação de violência evitável.

Não é o caso do Brasil. Bolsonaro já está em prisão domiciliar e não houve revolta popular. Nada indica que haverá uma no caso de encarceramento definitivo, assim como não houve quando Lula foi para sua cela em Curitiba. Se ainda há bolsonaristas muito valentes, eles devem ter visto o que aconteceu com os valentes do 8 de janeiro.

E isso nos remete ao propósito mesmo dos sistemas de Justiça. De uma perspectiva puramente racional, a prisão tem a finalidade principal de impedir a continuação e a repetição do delito, o que faz por duas vias. Ela retira, ainda que momentaneamente, o criminoso de circulação e, pelo efeito exemplo, dissuade terceiros de imitá-lo.

Uma eventual fuga de Bolsonaro até cumpriria a função de retirá-lo momentaneamente de circulação, mas enfraqueceria o efeito dissuasório, que se materializa de forma mais efetiva quando é o próprio Estado que aplica a sanção, não quando o castigo (sim, o exílio pode ser considerado um castigo) é resultado incidental de escolhas do réu.

É importante, portanto, que Bolsonaro não fuja e cumpra a pena que lhe for imposta, que não precisa nem deve ser cruel.

 

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