O Globo
Ex-presidente sabe que, para reverter
eventual condenação no STF, terá de contar com apoio dos partidos do Centrão
Há alguns meses, um aliado de Jair
Bolsonaro decidiu sondar discretamente o ex-presidente sobre a
probabilidade de Tarcísio de Freitas ser o candidato da direita em 2026. Papo
vai, papo vem, o interlocutor fez uma prospecção indireta: disse que queria
saber se deveria aceitar um convite para trabalhar no governo de São Paulo, com a
perspectiva de ascender com Tarcísio em 2026, ou se deveria partir para a
iniciativa privada.
Sem responder diretamente, Bolsonaro relembrou que começou a carreira política distribuindo panfletos no Rio de Janeiro e que conseguiu construir sozinho o movimento que leva seu sobrenome, elegendo a maior leva de políticos da oposição no Congresso. Disse ainda que, pelo andar da carruagem, estima ter mais uma década de vida, porque seu estado de saúde não é dos melhores, e que Tarcísio “ainda é muito novo”.
O interlocutor que foi auscultar os desejos
políticos de Bolsonaro saiu com a decisão tomada e uma convicção: deveria ir
para a iniciativa privada, porque Tarcísio não será indicado pelo
ex-presidente. A relutância em apontar um novo líder da direita não é um
capricho único do ex-capitão do Exército, que governou o país entre 2019 e 2022
e ainda sonha voltar ao poder, mesmo inelegível. Outros integrantes do clã
bolsonarista também torcem o nariz para a ideia.
Dispostos a preservar o espólio político do
pai, Eduardo e Flávio
Bolsonaro não só evitam ceder espaço na direita para Tarcísio, como
também esgrimem nos bastidores. Numa conversa nos Estados Unidos, o senador
disse que não pegava bem o irmão ficar anunciando por aí que seria candidato à
Presidência, porque seria alvo de ataques. O deputado licenciado retrucou
dizendo que o primogênito fazia uma aliança com o Centrão para disputar o
Planalto.
Esse receio da dilapidação do bolsonarismo
ficou evidente nas mensagens trocadas entre Eduardo e o pai. Num diálogo que
veio à tona numa investigação da Polícia
Federal, Eduardo se mostrou indignado com a postura de Tarcísio de botar as
asas de fora:
— A narrativa de Tarcísio te sucedendo, que
já há acordo para isto, está muito forte. Precisamos segurar isso para nos
mantermos vivos.
Sem ficar alheio à confusão, o vereador Carlos
Bolsonaro criticou os governadores de direita, dizendo que “fingem
normalidade” às vésperas do julgamento do ex-presidente no Supremo Tribunal
Federal (STF),
e sugeriu apoio a Eduardo numa candidatura ao Planalto.
Mesmo diante desse salseiro, Tarcísio tem se
articulado cada vez mais para se viabilizar como único candidato da direita. Às
vésperas do julgamento de Bolsonaro pelo STF, prometeu indulto ao
ex-presidente, abraçou a pauta da anistia aos envolvidos nos atos golpistas,
participou de eventos ao lado de lideranças do Centrão e acentuou as críticas a
Lula — que, em reunião ministerial, projetou Tarcísio como seu adversário em
2026, atiçando a fogueira bolsonarista.
Para o senador Ciro Nogueira, expoente do
Centrão e aliado de Bolsonaro, Tarcísio é “100% candidato à Presidência”. A
dúvida que resta, segundo ele, é quem será o vice da chapa. Ciro tem se
colocado como moeda de troca para negociar apoio da superfederação PP-União
Brasil, que terá a maior bancada do Legislativo. Mas também reconhece que
Flávio, apesar de carregar a alta rejeição política do pai, seria uma
alternativa para criar uma aliança de centro-direita em 2026.
Embora tenha tempo para sacramentar o futuro
da direita, Bolsonaro sabe que, para reverter uma eventual condenação no STF,
terá de contar com o apoio dos partidos do Centrão, seja por meio de anistia,
seja de mudança na legislação que o beneficie. Quando era presidente, ele
entregou o seu governo nas mãos de Ciro para sobreviver no Congresso. Agora,
para salvar a própria pele, poderá não só dobrar seus filhos, como também
voltar atrás na opinião sobre o governador de São Paulo.
*Thiago Bronzatto é diretor da sucursal do GLOBO em Brasília
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