sexta-feira, 30 de agosto de 2013

OPINIÃO DO DIA - Celso de Mello: STF confirma condenação de Dirceu

"Teve uma participação mais do que expressiva, dirigindo intelectualmente a atividade de diversos outros agentes, posição proeminente em uma estrutura criminosa voltada à manipulação fraudulenta das instituições, notadamente do Congresso Nacional.

Ao agir assim, o STF não incriminou a atividade política, mas puniu aqueles que, como o ora embargante, não se mostraram capazes de exercê-la com honestidade e interesse público.

Decano da Corte, o ministro Celso de Mello, em seu voto, ontem. In “STF confirma prisão em regime fechado para Dirceu”. O Globo, 30/8/2013.

Prefeitos demitirão médicos locais para receber os de Dilma

Prefeituras vão demitir médicos para receber equipes do governo

11 cidades já falam em trocar pessoal para ficar com brasileiros ou estrangeiros custeados pela União

Decisão tomada por economia pode afetar plano de Dilma de reduzir falta de profissionais no país

Lucas Reis, Aguirre Talento, Nelson Barros Neto e Daniel Carvalho

MANAUS, FORTALEZA, SALVADOR e RECIFE - Para aliviar as contas dos municípios, médicos contratados por diferentes prefeituras no país serão trocados por profissionais do Mais Médicos, programa do governo Dilma Rousseff (PT) para levar estrangeiros e brasileiros para atendimento de saúde no interior e nas periferias.

Na prática, a medida anunciada à Folha por prefeitos e secretários de saúde pode ameaçar a principal bandeira do plano: a redução da carência de médicos nesses lugares.

A reportagem identificou 11 cidades, de quatro Estados, que pretendem fazer demissões para receber as equipes do governo federal. Segundo as prefeituras, essa substituição significa economia, já que a bolsa de R$ 10 mil do Mais Médicos é totalmente custeada pela União.

O plano de Dilma foi lançado em julho e provocou polêmica na classe médica principalmente devido à vinda de estrangeiros --incluindo 4.000 cubanos, que devem ser deslocados para 701 cidades que não despertaram interesse de ninguém na primeira fase do Mais Médicos.

Outro atrativo alegado por prefeituras para a troca de equipes é a fixação desse novo médico no município por um período mínimo de três anos. Prefeitos reclamam da alta rotatividade dos médicos, que não se adaptam à falta de estrutura nessas localidades.

As cidades que já falam em trocar suas equipes estão no Amazonas (Coari, Lábrea e Anamã), na Bahia (Sapeaçu, Jeremoabo, Nova Soure e Santa Bárbara), no Ceará (Barbalha, Cascavel, Canindé) e em Pernambuco (Camaragibe).

Hoje, as prefeituras recebem da União cerca de R$ 10 mil por equipe no programa Saúde da Família. Complementos de salários e encargos, porém, são pagos com recursos de cada cidade.

Um exemplo é Coari, no Amazonas, a 421 km de barco de Manaus, onde a prefeitura paga R$ 25 mil para médicos recém-formados e R$ 35 mil para os especialistas.

"Somos obrigados a pagar esse valor ou ninguém aceita. Vamos tirar alguns dos nossos médicos e colocar os profissionais que chegarão do Mais Médicos", diz o secretário da Saúde, Ricardo Faria.

A prefeitura diz que vai demitir um médico de seu quadro para trocá-lo por outro que chegará já na primeira fase do programa federal.

Plano igual ao de Lábrea (a 851 km de Manaus), que tem seis médicos. "Pago R$ 30 mil para cada um deles. [Substituí-los] diminuiria os gastos da prefeitura", diz o prefeito Evaldo Gomes (PMDB).

Fonte: Folha de S. Paulo

Após livrar Donadon, Câmara quer voto aberto em cassações

Objetivo é evitar que episódio se repita no julgamento de condenados no mensalão

Ao não cassar o mandato do deputado federal Natan Donadon (sem partido-RO), que está preso por ter sido condenado no STF, a Câmara colocará em votação proposta que acaba como voto secreto para esse tipo de decisão. O objetivo é evitar que o episódio se repita no caso dos condenados no mensalão. O presidente da Casa, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), espera concluir o trâmite da proposta em outubro. No Senado, a articulação é para uma regra que torne automática a perda de mandato em caso de condenação criminal. O fim do segredo em processos de cassação foi aprovado pelo Senado e tramita na Câmara. O PT foi o partido que mais teve deputados que faltaram à votação de Donadon. Entre os ausentes estão os quatro condenados no mensalão: João Paulo Cunha (PT-SP), Valdemar Costa Neto (PR-SP), Pedro Henry (PP-MT) e José Genoino (PT-SP), de licença médica.

Após livrar Donadon, Câmara agora quer abrir votos em caso de cassação

Na tentativa de minimizar os danos de imagem após manter o mandato do deputado preso por peculato e formação de quadrilha Natan Donadon (sem partido-RO) líderes da Câmara prometem colocar em votação a proposta que acaba com o voto secreto nesse tipo de decisão. A ideia é que a nova regra esteja valendo quando os condenados no julgamento do mensalão tiverem seus casos analisados em plenário.

Anteontem, os deputados livraram Donadon da cassação em votação secreta. Ele acabou afastado pelo fato de estar cumprindo pena num presídio em Brasília. Almir Lando (PMDB-RO), seu suplente, assumiu ontem já defendendo o fim da votação secreta em caso de cassações.

O presidente da Casa, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), disse que espera concluir o trâmite da proposta do voto aberto em outubro. No Senado, a articulação é para uma regra que tome automática a perda de mandato em caso de condenação criminal em sentença definitiva.

O fim do segredo em processos de cassação foi aprovado pelo Senado em uma proposta de Alvaro Dias (PSDB-PR) e tramita em comissão especial na Câmara. Alves diz que há acordo entre os líderes para a matéria, apesar de a matéria andar ainda a passos lentos. aSe aprovar a do Alvaro Dias sem alteração, mantendo na íntegra, e a ideia é essa, daria para fazer a promulgação e os próximos processos na Casa já seriam assim (comvotação aberta). Daria para fazer em outubro", disse Alves, segundo quem nenhum novo caso de cassação
será levado de novo a plenário até que o projeto de abertura da votação seja concretizado.

Quatro deputados foram condenados no julgamento do mensalão. O Supremo determinou a perda de mandato imediata, mas a Câmara aguardava o final da ; análise dos recursos afim de colocar os casos em plenário.

Agora, além do fim dos recursos,os condenados terão de esperar a aprovação do projeto. DEM, PPS e PSB anunciaram obstrução em plenário até que a proposta seja votada como forma de pressão para acelerar a tramitação. O prazo na comissão especial é de 10 a 40 sessões e só uma foi realizada até agora.

Precedente» Nos bastidores, petistas admitiam ontem que, ao livrar Donadon, a Câmara poderia criar um precedente para livrar, também, os condenados no mensalão. Após receber aliados em seu gabinete, o vice-presidente da Câmara, André Vargas (PT-PR) disse a colegas antes da votação que seria alto o número de faltantes e de abstenções, o que se confirmou depois. Vargas diz ter votado a favor da cassação.

No Senado, o presidente Renan Calheiros (PMDB-AL), que já teve o mandato salvo duas vezes em votações secretas, preferiu apontar como solução a proposta que determina a perda automática do mandato em casos de condenação criminal definitiva. Marcou para 10 de setembro a votação em plenário da chama-: da aPEC dos Mensaleiros", proposta do senador Jarbas Vasconcellos (PMDB-PE). Calheiros avaliou, porém, que a absolvição em si não desgasta o Congresso. "Acho que não desgasta porque precisamos ter respostas prontas, rápidas, céleres e eficazes. E a resposta neste caso é a PEC porque a sociedade não tolera mais essa situação. Não dá mais" afirmou Calheiros.

Parlamentares buscam brechas para anular sessão

Na tentativa de anular a sessão que absolveu Natan Donadon (sem partido-RO), dois deputados questionaram à Mesa Diretora 0 fato de o colega ter votado na sessão que decidiu seu futuro.

Simplício Araújo (PP8-MA) e Amauri Teixeira (PT-BA) argumentam que a participação do colega em seu próprio julgamento viola o regimento da Câmara.

A Secretaria-Geral da Mesa su tenta que não houve irregularidades. Pelo regimento, ÍÈé vedado 0 acolhimento do voto do deputado representado". Durante a sessão, 0 presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), anunciou que não computaria o voto. Também na tentativa de reverter a decisão, 0 líder do PSDB, Carlos Sampaio (SP), protocolou mandado de segurança no Supremo pedindo que a sessão seja anulada por erros regimentais. 0 PPS disse que irá ao STF. As chances.de as ações prosperarem, porém, são baixas.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Oposição tentará anular votação no Supremo

Partidos argumentam que cassação deveria ser imediata após condenação

Paulo Celso Pereira, Cristiane Jungblut e Isabel Braga

BRASÍLIA - Apesar de não ter sido possível juntar os votos de 257 deputados pela cassação de Natan Donadon, a reação ontem diante do resultado foi intensa, especialmente na oposição. PSDB e PPS anunciaram ações no Supremo Tribunal Federal questionando o rito que resultou na manutenção do mandato de Donadon. No entendimento dos partidos, caberia à Câmara apenas declarar a perda de mandato quando o parlamentar é condenado em última instância e, por isso, além de solicitar um posicionamento claro do Supremo, as duas legendas pedirão a anulação da votação que manteve o mandato do deputado.

Dois deputados, isoladamente, também ingressaram com um pedido na Mesa da Câmara para que a sessão de quarta-feira seja anulada. Simplício Araújo (PPS-MA) e Amauri Teixeira (PT-BA) questionaram o fato de o próprio deputado Natan Donadon ter votado no processo, o que não é permitido pelo Regimento Interno da Câmara. A solicitação, no entanto, não deve prosperar.

Durante o processo de votação, e antes mesmo do anúncio do resultado, o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), havia notado o problema e, em seguida, anunciou no microfone que ao final retiraria do resultado oficial um dos votos a favor da absolvição do deputado - partindo do princípio de que Donadon votou contra a cassação. Assim foi feito. Para a Mesa da Câmara, o processo de votação está correto e não precisa ser anulado.

- Na minha ótica não existe chance de o pedido ser acolhido. O presidente fez tudo certo e antes de anunciar o resultado afirmou que iria diminuir um voto - explicou o secretário-geral da Mesa Diretora, Mozart Vianna.

No Senado, o líder e presidente do DEM, Agripino Maia (RN), afirmou que vai bloquear todas as votações no plenário até que seja votada a PEC do voto aberto, que acaba com o voto secreto nos processos de cassação de mandatos parlamentares:

O senador e presidente do PSDB, Aécio Neves (MG), também defendeu a votação da proposta:
- Foi uma demonstração cabal de que temos que voto aberto para este tipo de decisão.

Fonte: O Globo

Mensalão: STF rejeita recursos de Dirceu

Por oito votos a três, os ministros do Supremo Tribunal Federal mantiveram ontem a pena de dez anos e dez meses de prisão, por formação de quadrilha e corrupção ativa, do ex-ministro da Casa Civil.

STF confirma prisão em regime fechado para Dirceu

Recurso que pedia à Corte redução de pena foi rejeitado por oito votos a três

Carolina Brígido, André de Souza

BRASÍLIA - Apontado como mentor do esquema de pagamento de propina a parlamentares em troca de apoio político ao governo Lula, o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu sofreu nova derrota no Supremo Tribunal Federal (STF). Ontem, o plenário negou os recursos propostos por Dirceu contra a condenação no processo do mensalão. Foi mantida a pena fixada ano passado de dez anos e dez meses de prisão, por formação de quadrilha e corrupção ativa.

Três ministros concordaram com os argumentos de Dirceu e defenderam uma pena cinco meses e oito dias menor para o réu. A proposta, no entanto, foi derrotada pela maioria do plenário. A defesa ainda deve propor outro tipo de recurso para tentar mudar a condenação.

O ministro Dias Toffoli defendeu a diminuição da pena imposta a Dirceu por formação de quadrilha. No ano passado, o STF determinou dois anos e onze meses de prisão como punição pelo crime. Toffoli argumentou que, ao calcular a pena, o tribunal considerou duas vezes o fato de Dirceu ter posição de prestígio no governo e exercer liderança em relação a outros réus. Na contabilidade de Toffoli, a pena para quadrilha ficaria em dois anos, cinco meses e 22 dias de prisão. Os ministros Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio Mello concordaram com a tese.

- No fundo, os argumentos são os mesmos. A posição de mando, de coordenação, de chefia foi usada duas vezes para o mesmo fim, para agravar a pena do réu - ponderou Lewandowski.

Para ele, houve contradição no cálculo da punição a Dirceu: a pena-base foi aumentada em 75% no crime de formação de quadrilha. Em comparação, houve aumento de 20% para corrupção ativa.

- Há flagrante desproporção entre as circunstâncias judiciais desfavoráveis e a pena-base aplicada. A pena aplicada revela que o desvalor do crime de formação de quadrilha é consideravelmente maior que o do outro crime - disse Lewandowski.

- Há descompasso quanto a pena de quadrilha e a de corrupção ativa. Alguma coisa aí não fecha - concordou Marco Aurélio.

O relator do processo, ministro Joaquim Barbosa, esclareceu que o agravante não foi considerado em dobro. Ele ressaltou que o aumento da pena foi proporcional ao papel de Dirceu na quadrilha formada para corromper parlamentares.

- Uma coisa é dizer que alguém tem posição proeminente, outra coisa é dizer que a pessoa coordena - argumentou o presidente do STF.

Decano da Corte, o ministro Celso de Mello, concordou com Barbosa. Ele aproveitou para lembrar que Dirceu "teve uma participação mais do que expressiva, dirigindo intelectualmente a atividade de diversos outros agentes". Para o ministro, Dirceu tinha "posição proeminente" em uma "estrutura criminosa voltada à manipulação fraudulenta das instituições, notadamente do Congresso Nacional".

Celso ainda ressaltou que o comportamento de Dirceu foi indigno, daí a decisão do STF de aumentar, para além dos parâmetros mínimos, a pena por formação de quadrilha:

- Ao agir assim, o STF não incriminou a atividade política, mas puniu aqueles que, como o ora embargante, não se mostraram capazes de exercê-la com honestidade e interesse público.

Outras teses apresentadas pelos advogados de Dirceu foram também rejeitadas. Também ontem, o STF negou os embargos de declaração ajuizados por Cristiano Paz, ex-sócio de Marcos Valério. Os ministros começaram a julgar o recurso do ex-assessor do PP João Claudio Genú. Lewandowski questionou a pena por lavagem de dinheiro atribuída ao réu, de cinco anos de prisão. Argumentou que os deputados Pedro Henry e Pedro Corrêa tiveram participação mais ativa no crime e, no entanto, receberam pena menor, de quatro anos e oito meses.

Boa parte dos ministros concordou com a tese, abrindo uma porta para que o réu tenha sua pena diminuída. Luís Roberto Barroso pediu vista, e o caso volta ao plenário na próxima quarta-feira.

O Globo

Tribunal Eleitoral nega liminar para validar assinaturas em favor do partido de Marina

Até fundadores da legenda têm tido fichas de apoio rejeitadas por cartórios eleitorais

Sergio Roxo

SÃO PAULO - Em mais um revés na batalha travada pela ex-senadora Marina Silva para viabilizar o seu partido a tempo de disputar a eleição do próximo ano, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) negou o pedido de liminar (decisão provisória) para validar as assinaturas de eleitores em favor da legenda que não foram apreciadas pelos cartórios eleitorais dentro do prazo legal de 15 dias. Como exemplo das dificuldades encontradas pelos aliados da terceira colocada na última disputa presidencial, até pessoas envolvidas nos trâmites burocráticos para obter o registro do partido têm tido assinaturas rejeitadas.

A legislação eleitoral exige que os novos partidos só podem ser registrados se conseguirem coletar e validar nos cartórios as assinaturas de 492 mil eleitores. A Rede alega que os cartórios têm desrespeitado o prazo para a validação. Também há queixas sobre o rigor dos cartórios. No estado de São Paulo, são pelo menos sete casos de fundadores ou mobilizadores da legenda que tiveram a ficha de apoio rejeitadas.

Um delas é Julia Cicaroli Dávila, coordenadora de organização política da Comissão Estadual Provisória do partido em São Paulo, que vota no 309º cartório, em Santo André, no ABC paulista.

- Estou sem explicação. Queria saber o que aconteceu. Fiz questão de assinar exatamente como está no meu título. Não vejo motivo - disse.

Integrante da comissão nacional provisória da Rede, Bazileu Margarido afirma que a rejeição das assinaturas de integrantes do partido mostra que o processo é "falho" e sem uniformidade.

637 mil assinaturas recolhidas

Na segunda-feira, quando protocolou no TSE o pedido da registro, a Rede apresentou 304 mil assinaturas certificadas de um total de 637 mil recolhidas. Informou ainda no pedido que 220 mil ainda aguardavam a verificação dos cartórios.

O segundo tesoureiro da comissão provisória do partido em São Paulo, Carlos Eduardo Buzolin, também se queixa do rigor do cartório por ter tido a sua assinatura rejeitada.

- Eu assino meu nome por extenso. É fácil de conferir.

O Tribunal Regional Eleitoral (TRE) de São Paulo informou que se as adesões foram rejeitadas porque estavam em desacordo. A ficha de apoio ao partido é cruzada com a assinatura do eleitor em três documentos: folha de votação, requerimento de alistamento eleitoral e canhoto da retirada do título. Se em um deles os nomes baterem, o apoio é validado, segundo o tribunal.

No mesmo despacho em que negou a liminar para validar as assinaturas não apreciadas, a ministra Laurita Vaz, do TSE, determinou que os tribunais regionais eleitorais de 15 estados regularizem em 48 horas os tramites para registro dos diretórios estaduais e municipais da legenda.

Até agora, a Rede conseguiu homologar apenas registro do diretório regional do Rio Grande do Sul e a legislação exige a homologação de, pelo menos, outros oito diretórios estaduais para que seja concedido o registro nacional.

A ministra também decidiu que os tribunais regionais devem ordenar que os cartórios eleitorais publiquem imediatamente editais sobre o resultado da apreciação das assinaturas apresentadas. Os aliados de Marina ainda acreditam que será possível obter o registro até 5 de outubro.

Fonte: O Globo

Rede vê fôlego em decisão da Justiça

BRASÍLIA – Apesar de a corregedora-geral do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministra Laurita Vaz, ter rejeitado na noite de quarta-feira o pedido da Rede Sustentabilidade para que que as assinaturas de apoio à criação da legenda fossem validadas pelos cartórios eleitorais sem a checagem da veracidade dos dados, o advogado da legenda, Torquato Jardim, afirmou na manhã de ontem que a decisão como um todo é boa e que não vai recorrer. "A decisão é ótima. Ela reconheceu que há atraso e dá prazo para os cartórios se moverem e para os TREs fazerem os registros", afirmou Jardim. Ele acredita que com as providências determinadas por Laurita Vaz o partido consiga garantir a certificação das assinaturas a tempo de obter o registro. A Rede é o partido que a ex-senadora Marina Silva tenta montar para disputar o Palácio do Planalto em 2014.

Na decisão de quarta, dada liminarmente, Laurita rejeitou o pedido de flexibilização da lei argumentando que ele era "inconciliável com o ordenamento jurídico". Na mesma decisão, ela atendeu a parte do pedido da Rede e determinou que os tribunais regionais eleitorais do país ordenem aos cartórios eleitorais o cumprimento dos prazos e regras estabelecidos na lei. Além disso, deu prazo de 48 horas para que 15 TREs retomem o trâmite processual para registrar os diretórios estaduais e municipais do partido.

A Rede corre contra o tempo porque Marina só poderá concorrer à sucessão presidencial pela sigla caso ela esteja aprovada pela Justiça até 5 de outubro. O partido em formação reclama que os cartórios eleitorais estão descumprindo o prazo de 15 dias para validar as assinaturas de apoio para criação de partidos políticos. A agremiação conseguiu certificar até agora 304 mil nomes, 188 mil a menos do que o mínimo exigido em lei.

Temendo o estouro do prazo, a agremiação ingressou na segunda-feira com o pedido de registro no TSE, mesmo não cumprindo requisitos prévios para apresentar a solicitação. No pedido, os advogados queriam que o TSE obrigasse os cartórios a publicar as listas de apoiadores que ainda não haviam sido validadas. Caso os nomes não fossem contestados em até cinco dias, as assinaturas estariam automaticamente validadas. "Esse pedido era uma margem de segurança nossa. O mais importante ela reconheceu", afirmou Jardim, referindo-se ao atraso da análise nos cartórios.

Hoje, termina o prazo para que sejam encaminhadas ao TSE eventuais impugnações à criação da Rede. Até a noite desta quinta, nenhum partido havia questionado a formação da sigla que pretende lançar Marina Silva à Presidência da República. Mesmo sem partido, ela é a segunda colocada nas pesquisas de opinião de voto.

Marina Silva tem, de acordo com a última pesquisa do Datafolha, 26% das intenções de voto, sendo hoje o nome mais forte da oposição ao governo Dilma Rousseff. Se não conseguir montar seu partido a tempo, ela tem como opção, caso mantenha a intenção de disputar a Presidência em 2014, se filiar a outra legenda até o dia 5 de outubro.

Fonte: Estado de Minas

Serra tem 'papel vital' para derrotar o PT, afirma Aécio

Em almoço com deputados do Estado, senador evitou tom de campanha para não melindrar ex-governador

Pedro Venceslau

O senador Aécio Neves (PSDB- MG) aproveitou um almoço ontem com 18 dos 22 deputados estaduais paulistas do partido, em São Paulo, para fazer um gesto de reaproximação com o ex- governador José Serra (SP). Em¬bora o mineiro tenha apoio de quase toda a cúpula tucana para ser o candidato da sigla ao Planalto em 2014, Serra disse que poderia disputar a indicação.

Aécio evitou transformar o encontro em demonstração de força, apesar do apoio declara¬do da maioria da bancada. No último fim de semana, em Barretos (SP), o senador fez discurso de candidato e foi recebido com fogos de artifício. "Eu e o Serra temos mais convergências do que divergências. Ele tem um papel vital no encerramento do ciclo do PT (no governo federal). Tenho respeito por ele", afirmou o mineiro.

Em seguida, Aécio exagerou na amizade ao afirmar que visita o ex-governador "quase todas as vezes" quem vem ao Estado. Uma equipe do programa humorístico CQC, da TV Bandeirantes, deixou o convidado constrangido ao afirmar que os dois tucanos "se odeiam". "Existe uma mística como se o Serra fosse meu adversário", respondeu. "O PSDB não pode prescindir de nenhum de seus membros. O nosso adversário não está dentro do PSDB."

Durante o almoço, que ocorreu na ala reservada de uma cantina nos Jardins e reuniu pelo menos 30 pessoas, os deputados tucanos se dividiram. Parla¬mentares próximos ao secretá¬rio de Energia de São Paulo, José Aníbal (que não foi convidado, mas apareceu de surpresa), discursaram de forma inflama¬da em defesa da candidatura presidencial de Aécio e rejeitaram a ideia de realizar prévias.

"Província". Para o ex-deputado estadual Milton Flávio, presidente do PSDB paulistano, a candidatura de Aécio Neves em 2014 "extrapola os limites da província de São Paulo". Segundo o dirigente, a oficialização da candidatura do senador é apenas uma "burocracia".

Outros, como o deputado estadual Orlando Morando, preferiram medir palavras para não melindrar Serra. "Defendi as prévias porque é uma forma justa e equilibrada para definir o candidato do partido", disse.

Aliados do ex-governador reclamam do tratamento dado a Serra e dizem que Aécio Neves está usando o cargo de presiden¬te nacional do PSDB para "passar um trator" na base dos tuca¬nos paulistas.

Colaborou Ricardo Chapola

Fonte: O Estado de S. Paulo

Aécio Neves busca pacto com Eduardo

2014 Tucano quer iniciar novo ciclo no Brasil com socialista

Carolina Albuquerque

Em tempos de busca por palanques nos Estados para a eleição presidencial de 2014, o senador e presidenciável Aécio Neves (PSDB-MG) procurou demonstrar a afinidade do seu partido com o governador Eduardo Campos (PSB), possível adversário na disputa pelo Planalto no próximo ano. Na entrada para a residência do líder socialista, ontem, onde um jantar o aguardava, o tucano afirmou que gostaria de construir um "novo ciclo no Brasil" ao lado do governador Eduardo. "Se isso for possível, eu acho que quem ganha é o Brasil", completou.

"Eu nunca escondi que gostaria muito de um dia estar construindo uma nova agenda para o Brasil, um novo ciclo no Brasil de eficiência na gestão pública, de ética, de transparência e de resultados ao lado do governador Eduardo Campos", disse Aécio. Ele chegou por volta das 20h, ao lado do correligionário, senador Cássio Cunha Lima, com quem partiria duas horas e meia depois para compromisso em Campina Grande, na Paraíba. Na despedida da noite, o governador foi cauteloso ao comentar o desejo explicitado pelo líder tucano, com quem nutre forte amizade. "Cada um ao seu jeito, no seu papel, no seu campo político, vai ajudando a construir. Não necessariamente tem que concordar sobre tudo ou estar no mesmo espaço político."

Mesmo descartando um "pacto formal" de boa convivência entre ambos, Aécio não quis se indispor nem com a crítica do governador, feita à tarde, de que na gestão do então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) a situação do sistema de energia brasileiro era muito pior, se comparado ao atual, do PT. "Tivemos problemas sérios lá trás e, enfim, não escondemos isso. Agora eu quero pensar é no futuro", reconheceu o tucano.

Ficou evidente pela fala do senador a possibilidade real de os dois partidos, que hoje estão em campos adversários no plano federal, construírem palanques estaduais conjuntos. "Não entramos neste detalhamento, mas temos uma convivência, nós do PSDB com o PSB, em muitos Estados, a começar pelo meu próprio, em Minas Gerais. Em Estados, por exemplo, como São Paulo esta parceria é muito sólida e ela espalha por todo o Brasil. Eu não vejo dificuldade nenhuma em determinados estados nós estarmos juntos no mesmo palanque", afirmou. Além dos dois Estados, há também o Paraná, onde o PSDB governa com Beto Richa e especula-se que o PSB entre como candidato à vice.

Aécio - que já chegou a alfinetar o socialista dando a ele boas vindas ao bloco da oposição e dizendo que tinha que "sair do divã" - rasgou-se em elogios ontem. "Qualquer que seja a sua decisão terá o nosso respeito. Posso dizer aqui de forma clara é que o governador contribui para o debate nacional. Ele tem informações, tem experiência e tem espírito público", exaltou.

Fonte: Jornal do Commercio (PE)

Aécio e Campos acenam com pacto em jantar no Recife

Tucano fala em ação conjunta com governador para "novo ciclo" do País; antes, almoçou com 18 tucanos em São Paulo

RECIFE - Pouco antes de encontrar, ontem à noite, o governador pernambucano Eduardo Campos, presidente do PSB, o senador e presidente do PSDB Aécio Neves (MG) acenou com uma ação conjunta "por um Brasil mais solidário, mais justo e que cresça em uma velocidade maior". Via essa aproximação como "um novo ciclo" para o País. Os dois são tidos como prováveis candidatos de seus partidos à Presidência, em 2014.

"Eu nunca escondi que gostaria muito de, um dia, estar construindo uma nova agenda, um novo ciclo para o Brasil – de eficiência na gestão pública, de ética, de transparência e de resultados – ao lado do governador Eduardo Campos. Ele hoje está em um campo político diferente do meu, isso tem que ser respeitado, mas não escondo que, se isso for possível, eu acho que quem ganha é o Brasil", disse Aécio a jornalistas, pouco antes de se reunir com Campos, na casa do governador. Aécio negou, porém, que tenha selado um pacto de "boa convivência" entre os dois – apenas admitiu que há "um respeito recíproco".

O senador tucano evitou se indispor com o anfitrião ao responder a uma pergunta sobre a frase de Campos sobre o apagão que ontem afetou o Nordeste. O governador havia dito horas antes, em entrevista, que o setor energético era pior no governo Fernando Henrique Cardoso do que nas gestões PT. Almoço. Horas antes, em São Paulo, Aécio almoçou com 18 dos 22 deputados estaduais paulistas do partido, em São Paulo, para fazer um gesto de reaproximação com o ex-governador José Serra (SP). Embora tenha apoio de quase toda a cúpula tucana para ser o candidato da sigla ao Planalto, Aécio evitou transformar o encontro em demonstração de força, apesar do apoio declarado da maioria da bancada. "Eu e o Serra temos mais convergências do que divergências. Ele tem um papel vital no encerramento do ciclo do PT (no governo federal).

Em seguida, Aécio exagerou ao afirmar que visita o ex-governador "quase todas as vezes" quem vem ao Estado. "Existe uma mística como se o Serra fosse meu adversário", respondeu. "O PSDB não pode prescindir de nenhum de seus membros. O nosso adversário não está dentro do PSDB." O almoço reuniu ao menos 30 pessoas, na ala reservada de uma cantina nos Jardins.

Colaboraram Pedro Venceslau e Ricardo Chapola

Fonte: O Estado de S. Paulo

Aécio admite palanque duplo com Campos em SP e Minas

Em Pernambuco, tucano defende 'nova agenda' com governador do PSB

Após almoçar com deputados paulistas, senador propõe acordo de 'respeito mútuo' com potencial rival em 2014

Daniel Carvalho e Paulo Gama

RECIFE e SÃO PAULO - O senador e provável candidato à Presidência da República Aécio Neves (PSDB-MG) afirmou ontem, no Recife, que gostaria de construir uma "nova agenda" para o país ao lado de outro presidenciável, o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB).

O tucano, que participou de jantar na casa de Campos, disse ainda "não ver dificuldades" em formar palanques duplos com o pernambucano em "alguns Estados".

Aécio disse que sua visita a Campos era uma cortesia. Mais cedo, o governador pernambucano disse que o mineiro viajava a Pernambuco em "missão partidária".

"Temos uma convivência com o PSB em muitos Estados, a começar pelo meu próprio. Em Estados como São Paulo essa parceria é muito sólida. Não vejo dificuldade nenhuma em alguns Estados estarmos juntos no mesmo palanque", afirmou Neves.

Aécio disse haver "respeito mútuo" entre os dois.

"Nunca escondi que gostaria muito de um dia estar construindo uma nova agenda para o Brasil, iniciando um novo ciclo de eficiência na gestão pública, de ética, de transparência e resultados concretos ao lado do governador Eduardo Campos", disse.

Aécio procurou ressaltar semelhanças com Campos e criticou o governo Dilma Rousseff. "Há pouca generosidade do governo federal no respeito à Federação. E esse é um discurso que tem unido a mim e o governador Eduardo", afirmou.

Ao final do encontro, Campos procurou sublinhar que ele e o tucano estão em "campos políticos diferentes". "Não necessariamente a gente tem que concordar sobre tudo ou estar no mesmo espaço político. Acho que a gente pode construir e ajudar a construir no Brasil uma nova prática política."

Apetite

Mais cedo, Aécio reuniu 18 dos 22 deputados do PSDB paulista em almoço na região dos Jardins, em São Paulo. Na ocasião, minimizou divergências com o ex-governador José Serra. Disse que ele tem "papel vital no encerramento desse ciclo de governo do PT" e que espera que essa função seja desempenhada "dentro do PSDB".

Serra também pleiteia a candidatura presidencial.

Fonte: Folha de S. Paulo

Um capítulo sombrio na história do Parlamento - Roberto Freire

Na noite de 28 de agosto de 2013, o Parlamento brasileiro escreveu um dos capítulos mais vexatórios de seus quase 190 anos de história. Encarcerado em um presídio do Distrito Federal desde o fim de junho e condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), instância máxima da Justiça do país, o deputado Natan Donadon não teve o mandato cassado após contar com 131 votos favoráveis à sua absolvição, 41 abstenções e 233 pela cassação (24 a menos que o mínimo necessário de 257 votos).

Trata-se de mais um episódio que escancara a marcha da insensatez dominante neste Brasil dos tempos de Lula e Dilma, no qual o menosprezo à democracia e o desrespeito às instituições republicanas parece ter virado regra.

Donadon foi considerado culpado pelo desvio de R$ 8,4 milhões da Assembleia de Rondônia e recebeu uma condenação de 13 anos, quatro meses e dez dias de prisão pelos crimes de formação de quadrilha e peculato. Vale lembrar que o próprio STF, durante o julgamento do mensalão, já havia determinado, por cinco votos a quatro, que as condenações implicavam a cassação automática dos mandatos dos deputados mensaleiros. Entretanto, o assunto voltou a ser debatido por ocasião da recente condenação do senador Ivo Cassol, e os dois novos juizes da Corte, Teori Zavascki e Luís Roberto Barroso, foram determinantes para que se consolidasse no tribunal uma interpretação distinta da original, fazendo com que a decisão sobre os mandatos coubesse exclusivamente ao Parlamento.

O caso Donadon foi, então, colocado em votação e, para estarrecimento de uma sociedade que recentemente tomou as ruas para demonstrar sua insatisfação, faltaram votos para a cassação do mandato do parlamentar. Houve, assim, uma contradição entre a decisão da Câmara e a declaração de perda de mandato pela Mesa, causada justamente pela mudança de entendimento do STF. Assim como se diz que a jabuticaba é uma exclusividade brasileira, agora o país ostenta outra particularidade: o deputado-presidiário. Ou seja, um parlamentar sentenciado como criminoso pela mais alta Corte do país, sem gozar de seus direitos políticos, e que cumpre o mandato na cadeia.

A decisão envolvendo Donadon não é um caso fortuito. O encadeamento da já citada marcha da insensatez lulopetista abre um precedente gravíssimo que pode beneficiar os mensaleiros — esses, sim, muito mais significativos, em todos os aspectos, do que o inexpressivo deputado de Rondônia, inclusive no que diz respeito à corrupção.

Seria interessante que as mobilizações de rua voltassem à carga, se não para reverter uma decisão já sacramentada, mas ao menos para demonstrar a indignidade representada pela não cassação de Donadon. Neste momento, talvez mais do que em nenhum outro em tempos recentes, a sociedade brasileira precisa estar atenta, já que tramita na Câmara a PEC 33, que limita os poderes do STF e permite ao Congresso que prevaleça sobre certas decisões da Corte. Também não por mera coincidência, a iniciativa é de autoria de um deputado petista e conta com apoio da ampla maioria da bancada do partido.

O triste espetáculo protagonizado por parte da Câmara nesta semana é um duro golpe contra todos aqueles que lutam por uma sociedade mais democrática e republicana. A figura do parlamentar-presidiário simboliza, à perfeição, uma era sombria nos usos e costumes políticos.

Roberto Freire, deputado federal por São Paulo e presidente nacional do PPS

Fonte: Brasil Econômico

Sem questão - Marina Silva

Quase sempre focados na política institucional e no debate de interesses setoriais, esquecemos de ver as causas profundas dos fenômenos sociais, da luta entre mudança e estagnação que às vezes toma a cena e nos surpreende.

Um estudo da pesquisadora Joana Monteiro, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas, nos faz contemplar o abismo. "Os Nem-Nem-Nem: Exploração Inicial Sobre um Fenômeno Pouco Estudado" mostra que um milhão e meio de brasileiros entre 19 e 24 anos, nas faixas mais pobres da população, nem trabalham nem estudam nem procuram emprego. Um contingente numeroso e crescente, capaz de impactar a economia e o ambiente cultural nas próximas décadas.

Embora de modo quase invisível, esses jovens já impactam o Brasil. Seu desalento alimenta tendências sociais desagregadoras. Certamente, têm expressiva participação nas altas taxas de evasão escolar, mortalidade juvenil por acidentes, suicídio e violência.

O que faz com que esses jovens tenham perdido o desejo de investir em si mesmos? Sua pobreza de esperanças não nos deve restringir à falta de oportunidade material como causa única, ainda que esta seja muito relevante. Talvez nossa sociedade esteja sendo acometida de um adoecimento ainda mais grave, que se caracteriza pela ausência da capacidade de acreditar "em", da capacidade de desejar.

Claude Le Guen, em seu "Édipo Originário", diz que é impossível amar a si mesmo sem antes ter amado ao outro. Talvez seja também impossível investir em si mesmo sem antes ter investido no outro. Isso pode ocorrer quando somos privados do investimento do outro, sejam eles cuidadores próximos, pais, avós, professores e amigos, mas também cuidadores distantes, associados às instituições civis ou religiosas. Sem a inscrição de seus ideais identificatórios em nós não há como elaborarmos uma promessa de existência significativa, digna de auto-investimento relevante.

Os antigos gregos falavam de uma paidéia, um grande ideal identificatório que balizava sua educação e cidadania. Nossa sociedade parece subtrair-se a esse investimento em ideal, utopia e valores. É como se a economia fosse só consumo; a política, apenas disputa de poder; a cultura, só espetáculo. Como se a democracia pudesse ser mera forma, vazia de conteúdo.

Se os ideais não ocorrem nem na família nem na escola nem na sociedade não há como ter projeto de vida e resta o deserto. Nele brotam os nem-nem-nem, que, pela privação sócio-afetiva são esvaziados do desejo, imprescindível para se viver. Ser ou não ser, tanto faz, não há questão.

Sem teto, sem terra, sem emprego, sem educação, abram alas para a tragédia maior dos sem-desejo.

Marina Silva, ex-senadora, foi ministra do meio ambiente

Fonte: Folha de S. Paulo

Colhendo os frutos da violência- Fernando Gabeira

A presença no interior do País, que alguns jornalistas chamam de Brasil profundo, às vezes me deixa em dúvida se estou levando em conta todos os dados possíveis da realidade. Será que tudo o que estou vendo é só um refluxo do movimento de massas e a ocupação do terreno por grupos radicais que usam a violência como um instrumento pedagógico?

Usei um verso de Drummond para definir os acontecimentos de junho: nasce uma flor no asfalto. E disse que seu maior inimigo era a violência, que terminaria por esvaziar as mas e fortalecer o lado que se pretende combater. Não pensava em nada do tipo conselho aos jovens. Apenas dizia que é ilusão supor que a História recomeça do zero. Vive na minha memória, e de todos os sobreviventes dos anos 6o, a lembrança dos acontecimentos que resultaram na luta armada e no fortalecimento da ditadura militar.

Os grampos que se radicalizam na maré baixa dos movimentos acreditam estar mantendo o espírito e preparando nova investida. No 7 de Setembro, quem sabe? Tenho algumas razões para discordar dessa tática, para além da pura e simples objeção à violência. Claro que não me importo com os mal-entendidos nem espero indulgência dos críticos. Valho-me do sentido da realidade que às vezes abandona os grupos radicais quando as mas se esvaziam e só ouvimos o barulho do trânsito.

Nas ruas multidões portavam cartazes dizendo: "Desculpem o transtorno, estamos mudando o Brasil*. As pessoas viam isso com tolerância, pois era verossímil que tamanha energia concentrada pudesse mudar o País. O mesmo não vale para um grupo de vanguarda, pois é difícil atribuir capacidade de modificar o País a círculos isolados que se escondem sob máscaras e destroem símbolos do capitalismo.

Essas ações pedagógicas são realizadas na esperança de que I se universalizem, de que outros as sigam e todos juntos destruam o sistema. Por essa esperança as pessoas se arriscam a ser presas. Acham que mais cedo ou mais tarde vingarão os frutos de sua ação pedagógica. O difícil é ver o tempo passando no cárcere e perceber que tudo aquilo era uma ilusão, constatar que a maioria esmagadora segue rejeitando a violência como forma de luta política.

É preciso passar um tempo no cárcere, comprometer a própria vida, para aprender essa lição elementar? Pode ser que entre os que queimam e destroem haja alguns que o façam por uma simples explosão nervosa. Mas os que organizam sistematicamente e consideram a tática correta estão jogando conscientemente com o próprio futuro.

Cansei de ver quebra-quebras em Berlim no 1.° de Maio. Sempre os mesmos, sempre na mesma loja de departamentos.

E a Alemanha segue seu rumo.

Os políticos agora refluíram e a polícia brasileira parece indecisa sobre o que fazer com a violência que sobrevive no rescaldo das grandes manifestações. Os políticos temem a eleição, sabem que, mesmo calados, terão dificuldades em 2014. Por que se pronunciar e afastar mais a chance de voltar ao cargo?

Os resultados da baixa maré são claros. As bandeiras principais dos movimentos foram enfraquecidas. O governo recupera gradualmente o prestígio perdido. Não importa se o gigante acordou ou voltou a dormir. Vamos supor como correta a inversão daquela frase comum: quanto mais as coisas ficam as mesmas, mais elas mudam. Ainda não sabemos o impacto que o movimento de junho deixou na consciência de muitos. A pura observação nos autoriza a dizer que se buscava mais a condenação da política do que propriamente uma alternativa. Não só continuaram insolúveis alguns problemas na área política, como se acentuaram os indícios de que a ilusão de prosperidade sustentada foi para os ares.

A queda do real é só mais um capítulo da queda na realidade. Espera-se um aumento da gasolina e com ele mais aperto no bolso, apesar de sua correção. A sensação de crise econômica ; aos poucos vai se impondo à euforia da prosperidade, mas não há nenhuma esperança, no momento, de que possa ser superada por uma visão correta do atual governo.

A política externa brasileira continua sendo a política de um partido. Foi preciso que um jovem diplomata arrancasse um asilado de um quarto da embaixada em La Paz e fugisse com ele para o Brasil. No episódio da prisão dos torcedores corintianos, o mesmo diplomata, Eduardo Saboia, se esforçou para atendê-los enquanto as negociações com Evo Morales patinavam.

Estive na Bolívia para cobrir a revolta dos índios contra a construção de uma estrada na região Amazônica com financiamento do BNDES. Dois governos que se dizem populares se meteram numa aventura altamente impopular. Alguns adeptos do PT acham que é preciso falar fino com a Bolívia e grosso com os EUA. Será que a maioria da Nação realmente se sente paternal diante da Bolívia e ofendida diante dos EUA?

Com todos os descaminhos do governo é preciso contar apenas com novas manifestações? Elas têm um grande poder, mas já não somos inocentes sobre seu alcance real. Os políticos encenam um esforço concentrado, esperam o refluxo do movimento e caem, de novo, nas mesmas práticas repulsivas.

As grandes manifestações de junho tiveram o poder de revelar a incapacidade do sistema político no conjunto, a incompetência do governo e a repulsa à corrupção. Está na hora de valorizar não só o protesto, mas a busca de alternativas reais para o País. O crescimento dos últimos anos, apoiado numa bolha de consumo, parece ter chegado ao fim. A mediocridade do governo fica mais clara ainda.

Manifestações são vitais, mas a História é mais parecida com maratona do que tiro de cem metros. E a política,uma navegação que requer conhecimento dos mares, rochedos, portos a serem alcançados e as dificuldades do caminho. Estamos à deriva. Tal como na Espanha, sabemos o que as pessoas não querem. Prevemos altos índices de voto nulo. Cairá a legitimidade do poder político. Saída mesmo ainda não se vê no horizonte.

Jornalista

Fonte: O Estado de S. Paulo

Um governo em apuros- Rogério Furquim Werneck

Em seis meses, o governo passou do triunfalismo de fevereiro à indisfarçável apreensão, que agora se vê em Brasília, com a longa e problemática travessia dos 13 meses que ainda faltam para as eleições de 2014.

No início do ano, embalado pela comemoração de uma década de conquista da Presidência, o PT pretendia estender os festejos por todo o ano de 2013, com a realização de dez grandes eventos nas maiores cidades do País. Há cerca de um mês, contudo, foi discretamente anunciado pelo partido que o último evento seria o de Salvador, no fim de julho. Os demais seriam cancelados. Interrupção tão abrupta das comemorações bem ilustra a rapidez da mudança de clima por que vem passando o governo.

Em fevereiro, o Planalto ainda alimentava a fantasia de que, após dois anos de crescimento econômico pífio, 2013 poderia ser o ano da virada. A ideia era assegurar a retomada da economia, a qualquer custo, e, na medida do possível, manter a inflação sob controle, com a adoção de medidas casuísticas de desoneração. Mas essas esperanças esvaíram-se ao longo dos últimos meses.

Em abril, com a inflação já no teto da meta, o governo se viu obrigado a conter a gritante perda de credibilidade do Banco Central e dar sinal verde para novo ciclo de alta da taxa de juros. No fim do primeiro semestre, as perspectivas de recuperação da economia tornaram-se ainda menos promissoras, na esteira do aumento de incerteza que adveio da onda de protestos de junho e da crescente perda de confiança na condução da política econômica.

Nos últimos dois meses, o que parecia ser apenas um quadro macroeconômico pouco promissor vem evoluindo para uma situação bem mais difícil, marcada por preocupante redução de espaço de manobra na condução da política econômica. Em grande medida, o estreitamento de possibilidades decorre do vigor da depreciação cambial que tem sido induzida pela perspectiva de mudança da política monetária americana e agravada pela perda de credibilidade da política econômica no Brasil.

Se não puder ser revertida, a depreciação do câmbio deverá impor ao governo escolhas muito mais duras na condução da política de metas para inflação. E é bem provável que, ao fim e ao cabo, o governo, com uma eleição pela frente, se veja obrigado a conviver com uma combinação de taxa de juros, crescimento e inflação bem mais desfavorável do que imaginava possível há alguns meses.

As escolhas poderiam ser menos adversas se o governo estivesse de fato disposto a restaurar a credibilidade da política fiscal. Mas tudo indica que lhe falta um requisito básico para fazer um movimento crível nesse sentido: convicção de que isso é efetivamente necessário.

O máximo que o governo se dispõe a fazer nessa linha é prometer, de pés juntos, que não voltará a recorrer à lamentável alquimia contábil que tem conspurcado o registro das contas públicas nos últimos anos. Mas nem mesmo isso é crível. Basta constatar, por exemplo, que, poucas semanas depois de ter ensaiado esse tipo de promessa, o governo já aventou a possibilidade de excluir gastos com projetos de mobilidade urbana da contabilidade da dívida dos governos subnacionais.

A esta altura, qualquer esforço sério de restauração da credibilidade da política fiscal exigiria mudança da equipe econômica. Algo que o governo obviamente não está disposto a fazer. Não obstante o lamentável desempenho da economia e a extensão do descrédito da política fiscal, a presidente não parece ter intenção de fazer qualquer alteração maior na equipe econômica, seja na Fazenda, seja no Tesouro, seja no BNDES.

Isso sugere que o problema de falta de credibilidade da política econômica é de solução bem mais difícil do que em geral se pensa. É preciso levar mais a sério o que diz a presidente Dilma, quando se dá ao trabalho de esclarecer, com todas as letras, que, na verdade, a central de formulação e condução da política econômica está instalada no terceiro andar do Palácio do Planalto. Só não entende quem não quer.

Economista e professor da PUC-Rio

Fonte: O Globo

A janela de 2014 - José Eli da Veiga

Ao comemorar os vinte anos de renascimento macroeconômico propiciado pelo Plano Real de 30 de julho de 1994, a sociedade brasileira será premiada com uma extraordinária janela de oportunidade para que repense e redefina sua orientação estratégica. Nos oitenta dias que irão do final da Copa do Mundo (13 de julho) ao primeiro turno das eleições (4 de outubro), nenhum candidato a cargo majoritário ou proporcional poderá ignorar os ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) que a 69ª Assembleia Geral das Nações Unidas estará prestes a promulgar em substituição aos ODM (Objetivos de Desenvolvimento do Milênio).

Tão promissora ocasião precisa ser desde já preparada para que realmente possa ser frutífera. Por isso, o propósito deste artigo é chamar a atenção do leitor para duas iniciativas que, embora importantíssimas, terão menos cobertura do que mereceriam, pois é inevitável que a mídia esteja alheia aos processos que constroem os fatos que mais tarde não poderá deixar de noticiar.

A nata dos empreendedores responsáveis se reunirá na terça-feira, 24 de setembro, no espaço Tom Jobim do Jardim Botânico do Rio para debater quais devem ser as ações imediatas capazes de levar o Brasil a alcançar um padrão sustentável de desenvolvimento por volta de 2050.

É catastrófico o passo de tartaruga com que vem ocorrendo a expansão das redes coletoras de esgoto

O cenário para esse objetivo de longo prazo - elaborado por 77 grupos empresariais que geram 40% do PIB e mais de um milhão de empregos diretos - está condensado nas cem páginas do documento "Visão Brasil 2050", disponibilizado pelo CEBDS (Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável) desde meados do ano passado: www.cebds.org.br/media/uploads/pdf/visao_brasil_2050_-_vfinal.pdf

Agora esse amplo cenário 2050 balizará a seleção de ações prioritárias até 2020, período que praticamente coincide com o do próximo mandato governamental/parlamentar. E é fácil notar que praticamente todas as ações selecionáveis necessariamente implicarão algum rompimento com tendências dominantes nos vinte anos de coalizões conduzidas por petistas, tucanos e Itamar, para nem lembrar as da Casa da Dinda e da Nova República.

Uma triste ilustração é o direito humano ao saneamento. Nada pode ser mais escandaloso e revoltante do que constatar que em 30 de agosto de 2013 tal direito continua a ser negado à metade da população brasileira. As principais vítimas são os que morrem devido à falta de redes coletoras de esgoto, em sua grande maioria meninos de 1 a 6 anos. Mas também os natimortos e suas mães, pois contato com esgoto aberto aumenta drasticamente o risco de que gravidez não culmine em bebê vivo. E ainda existe imensurável número de outras vítimas invisíveis, pois muitos dos que conseguem sobreviver a infecções parasitárias na infância ficam com a inteligência seriamente prejudicada.

Será que teria sido necessário conhecer outros de seus impactos para que o saneamento tivesse obtido total prioridade em qualquer dos últimos governos? Infelizmente parece que não, pois é catastrófico o passo de tartaruga com que vem ocorrendo a expansão das redes coletoras de esgoto. Inclusive nos tão festejados dez anos petistas, durante os quais supostamente tudo estaria sendo feito para melhorar as condições de vida do subproletariado. Em vez disso, se não romper com a tendência o país entrará no século XXII sem universalizar o acesso a tão básico direito humano.

A segunda iniciativa que muito contribuirá para bom aproveitamento da janela de 2014 é o projeto "Caminhos para "o futuro que queremos"", fruto de parceria do Cebri com a KAS (Centro Brasileiro de Relações Internacionais e Fundação Konrad Adenauer). Um seminário sobre a elaboração dos ODS, também no Rio, em 7 de novembro, destacará dois de seus eixos básicos: "Indicadores socioambientais" e "Financiamento para mitigação das emissões de carbono e adaptação à mudança climática": www.cebri.org
Para que o Brasil tenha protagonismo nessa elaboração, seus representantes que participarão mais diretamente do processo de negociação - notadamente das discussões no âmbito do "Open Working Group" - já deveriam estar debruçados sobre as questões em pauta nesse seminário Cebri/KAS, com realce para as que se referem à mensuração do desempenho econômico. Todavia, para que isso possa ocorrer, eles já deveriam estar recebendo subsídios das instituições que abrigam especialistas capacitados. A começar por IBGE e Ipea, mas também por universidades, onde se encontra a maioria dos pesquisadores ligados à Sociedade Brasileira de Economia Ecológica, por exemplo.

Daí a torcida para que o projeto Cebri/KAS estimule o bem vindo novo chanceler Luiz Alberto Figueiredo a orientar o Itamaraty para que organize uma rede nacional de consultas e intercâmbio sobre os ODS. Medida crucial para que o Brasil ofereça tudo o que esteja ao seu alcance em negociações multilaterais que poderão fazer germinar, com quarenta anos de atraso, uma governança mundial do desenvolvimento sustentável.

José Eli da Veiga, professor dos programas de pós-graduação do Instituto de Relações Internacionais da USP (IRI/USP) e do Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPÊ).

Fonte: Valor Econômico

Avanços em conceitos e recuos nas práticas - Washington Novaes *

Embora não surpreendam - havia indícios -, são inquietantes as informações sobre aumento do desmatamento na Amazônia. Foram 2.007 quilômetros quadrados na Amazônia Legal em um ano, segundo o Imazon (20/8), ou quase 92% mais que em igual período anterior. Aos quais se devem acrescentar 1.155 quilômetros quadrados de florestas degradadas no período. E tudo se traduzindo em 100 milhões de toneladas de dióxido de carbono (CO2) equivalentes emitidas em 12 meses.

Mais complicado ainda porque um balanço oficial de cinco anos (2005-2010) dizia que o desmatamento era o único setor no País em que se haviam reduzido (em 65%) as emissões de poluentes que contribuem para o aumento da temperatura planetária, quando as emissões no setor energia haviam subido 21,4%, no tratamento de resíduos, 16,4%, na indústria, 5,3% e na agropecuária, 5,2%. Nesse quadro, as emissões totais do Brasil ficavam em 1,25 bilhões de toneladas de CO2 equivalentes (2,03 bilhões em 2005), que se traduziam em cerca de 7 toneladas por brasileiro (outras fontes apontam até 10 toneladas por pessoa).

Pode ser ainda mais inquietante saber que terminou em Bonn, na Alemanha, uma reunião preparatória para a Convenção do Clima, que será realizada em novembro em Varsóvia (Polônia). E a maioria dos analistas saiu convencida de que é muito improvável, este ano ou no próximo, chegar a um acordo que defina metas obrigatórias de redução de emissões em todos os países, a serem incluídas em 2015 num convênio global para vigorarem em 2020 e possibilitarem que se contenha o aumento de temperatura na Terra em 2 graus Celsius até 2050. Também empacaram as discussões sobre contribuições financeiras dos países industrializados para "mitigação de emissões" e "adaptação às mudanças", com os "países em desenvolvimento" exigindo recursos para compensar danos que poderiam ser de US$ 1 trilhão por ano.

Pode parecer repetitivo tratar com tanta frequência neste espaço desse tema das mudanças climáticas, mas as notícias são a cada dia mais graves. Uma boa informação, entretanto - ainda não anunciada oficialmente -, é a de que o Brasil voltará, na reunião da convenção, à proposta que fez em 1997, quando se discutia o Protocolo de Kyoto: passariam a ser obrigatórios compromissos de todos os países para reduzir as emissões de poluentes, proporcionalmente à contribuição que tenham dado para a concentração de gases na atmosfera e às suas emissões atuais (em Kyoto decidiu-se apenas que os 37 industrializados baixariam suas emissões em 5,2%, calculados sobre as de 1990; mas o protocolo não teve as adesões necessárias). Até aqui, o Brasil só tem aceitado "compromissos voluntários" de baixar entre 36,1% e 38,9% suas emissões, calculadas sobre o total a que chegaríamos em 2020.

É um assunto vital, quando cenários traçados para este século por 345 cientistas para o Painel do Clima da convenção dizem que a temperatura no Brasil pode subir até 3 graus Celsius. E a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) prevê (20/8) que as culturas de milho, arroz e mandioca serão as mais afetadas, com perdas, hoje em mais de R$ 7 bilhões, que serão o dobro em mais algumas décadas.

Há visões mais otimistas, como as de cientistas que apontam a intenção da China e dos Estados Unidos de reduzirem em 40% as suas emissões na fabricação de cada produto. Mas a China também está deixando cientistas de cabelos em pé com a criação de uma rota de navegação para a Europa atravessando o Ártico (reduz de 48 para 33 dias o tempo gasto) - e contribuindo para mais degelo. Os Estados Unidos conseguiram baixar suas emissões intensificando a exploração de gás de xisto, com um método baseado em fratura de rochas e injeção de água e produtos químicos - que implica, no retorno deles à superfície, a mistura da água superficial com poluentes altamente danosos e em grande quantidade (o Brasil também vai entrar por esse caminho).

Acrescem-se as informações da Global Footprint Network de que no dia 20 último se completou o prazo (menos de oito meses) em que o mundo consumiu os recursos naturais que deveriam bastar para um ano todo - ou seja, a "pegada ambiental" global indica que precisamos de 50% mais de recursos que os disponíveis. E com isso se vai agravando o quadro planetário (Folha de S.Paulo, 20/8). O Japão já consome 7,1 vezes mais que os recursos disponíveis em seu território, a Grã-Bretanha, 3,5 vezes e os Estados Unidos, 1,9. O Brasil, embora use menos recursos que sua disponibilidade interna, consome mais que a média global disponível. Em 2050, afirma o estudo da Global Footprint Network, o mundo precisará de recursos equivalentes ao dobro dos disponíveis na Terra.

Não é diferente do que pensa a Convenção da Biodiversidade, que, preocupada, já em 2010 pediu que se adotassem metas de pelo menos 17% das áreas terrestres no mundo protegidas, assim como 10% de áreas oceânicas.

São visões como essa que levaram o escritor (austríaco radicado nos Estados Unidos) Fritjof Capra - autor de O Tao da Física e A Teia da Vida - a dizer no X Congresso Brasileiro de Direito Socioambiental (Instituto Carbono Brasil, 9/8), que nosso país é um dos "possíveis líderes para o desenvolvimento qualitativo sustentável" - desde que "os negócios, a economia, as tecnologias, as estruturas físicas não interfiram na capacidade da natureza de sustentar a vida".

Porque "o crescimento infinito é ilusão". Bem na linha que se propaga entre economistas de que já vivemos uma "crise de finitude de recursos", com o consumo global maior que a reposição. E crescerá ainda mais, com a população mundial - hoje pouco acima de 7 bilhões de pessoas e um acréscimo de 80 milhões por ano - chegando a mais de 9 bilhões em 2050.

*Washington Novaes é jornalista.

Fonte: O Estado de S. Paulo

STF e Congresso nos seus labirintos - Merval Pereira

A situação criada pela decisão da Câmara de não cassar o mandato de Natan Donadon, condenado pelo STF a 13 anos de prisão pelos crimes de formação de quadrilha e peculato, por desvios na Assembleia de Rondônia, poderá repercutir no julgamento do mensalão, mas dificilmente alterará o entendimento sobre o tema já na próxima semana, quando será julgado embargo de declaração do deputado João Paulo Cunha.

Caso o plenário admita os embargos infringentes, aí sim, é quase certo que tanto as decisões sobre cassação de mandatos quanto formação de quadrilha serão alteradas, favorecendo os condenados, em especial os membros do núcleo político.

Essa será uma mistura politicamente explosiva, provocada pela posição dos dois novos ministros, Roberto Barroso e Teori Zavascki, que mudaram a jurisprudência do STF nos dois casos.

Embora a maioria dos ministros não veja espaço para uma alteração desse tipo nesta fase, pois os embargos de declaração têm abrangência muito restrita, há pelo menos dois precedentes no STF em que a jurisprudência do tribunal foi atualizada através de embargos de declaração. O entendimento sobre formação de quadrilha, por exemplo, não foi atualizado nessa etapa, mesmo que tenha sido modificado.

Os votos de Barroso e Zavascki mudaram o entendimento do STF quanto à cassação de mandatos no julgamento do caso do senador Ivo Cassol, fazendo com que a decisão final passasse a ser do Congresso. No julgamento do mensalão, a Corte havia decidido pela perda dos direitos políticos dos condenados, o que levaria automaticamente à cassação do mandato de acordo com o parágrafo IV do artigo 55 da Constituição.

Nos dois casos fora do mensalão, há essa diferença crucial: as penas não se referiam à perda dos direitos políticos, e, portanto, abriu-se uma brecha para que fosse usado o artigo VI do mesmo artigo 55 da Constituição, que determina que perderá o mandato o deputado ou senador "que sofrer condenação criminal em sentença transitada"

Nesse caso, a cassação do mandato, em vez de ser automática, dependeria de votação secreta do plenário. Acontece que, de acordo com artigo 15 da Constituição, a perda ou suspensão dos direitos políticos acontece devido a (...) III - condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos. Como não é possível haver um deputado ou senador sem os direitos políticos, a cassação do mandato é automática.

Tanto é verdade que o presidente da Câmara, deputado Henrique Eduardo Alves, ao constatar que o plenário se inclinaria para salvar o mandato do deputado condenado e já preso na Papuda, decidiu que ele não poderia exercer o mandato da cadeia e convocou imediatamente seu suplente.

Na verdade, a Mesa Diretora da Câmara não quis assumir a cassação do mandato de um par e acreditou no bom senso do plenário, e deu no que deu. Há diversas versões para o que aconteceu no plenário da Câmara na noite de quarta-feira, desde a conjunção de interesses variados - os evangélicos salvaram "um irmão", os deputados que já tiveram ou têm problemas com o Ministério Público votaram em seu próprio benefício, muitos tiveram uma mera atitude corporativa, votando contra, não comparecendo ou abstendo-se de votar.
Mas há também a teoria conspiratória de que tudo não passou de um ensaio para os petistas sentirem a tendência do plenário quando chegar a hora de decidir sobre os mandatos dos mensaleiros condenados pelo Supremo. Se foi isso, o tiro pode ter saído pela culatra, pois a reação dos que se indignaram com a decisão final foi apressar a votação da emenda constitucional que acaba com o voto secreto para cassação de mandatos e outros votos no Congresso.

Além disso, o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves, garante que não colocará mais em votação casos de cassação até que acabe o voto secreto, o que faria, no limite, que os políticos condenados no julgamento do mensalão passassem a cumprir suas penas ao fim do julgamento, ainda investidos do mandato parlamentar.

Os pontos-chave
1
A situação criada pela decisão de não cassar o mandato de Donadon poderá repercutir no julgamento do mensalão, mas dificilmente alterará o entendimento sobre o tema
2
Caso o plenário admita os embargos infringentes, aí, sim, é quase certo que as decisões sobre cassação de mandatos e formação de quadrilha serão alteradas
3
Essa será uma mistura politicamente explosiva, provocada pela posição dos dois novos ministros, Barroso e Zavascki, que mudaram a jurisprudência do STF nos dois casos

Fonte: O Globo

O tempero de Donadon - Denise Rothenburg

O caso do deputado Natan Donadon, de Rondônia, mereceria uma dissertação de mestrado no sentido de entender o que se passa na cabeça dos políticos. No início da quarta-feira, ninguém apostava que ele seria "absolvido" por seus colegas. Mas, passadas as primeiras 24 horas, era possível vislumbrar o que levou um presidiário a manter o seu mandato. Donadon ganhou na política. E nas próximas linhas você descobrirá o porquê.

A lição número um para sensibilizar os colegas parlamentares foi agir com humildade e ter a coragem de enfrentar o camburão. Só ali, ele conquistou uns votinhos, mas o que provocou as 41 abstenções, a maioria decidida de última hora, foram os 40 minutos em que o congressista ocupou a tribuna da Câmara.

Dramalhões à parte, com citação da família e etc., Donadon foi crescendo a cada minuto que falava. O discurso cirúrgico bateu exatamente naquilo que cala fundo aos parlamentares: o Ministério Público, instituição da qual os parlamentares, salvo raras exceções, reclamam quase que diariamente. Este ano, por exemplo, os deputados e senadores só não restringiram os poderes de investigação do Ministério Público por causa das manifestações de junho.

Para quem não se lembra, vale um parêntese: em junho, estava em discussão a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 37, de autoria do deputado Lourival Mendes (PTdoB-MA). A PEC definia que as investigações seriam de responsabilidade da polícia e não do MP, a quem cabe fazer as denúncias de cada caso. A proposta seria aprovada, não fosse a presença maciça de jovens na porta do Congresso Nacional naqueles dias de outono.

Em seu discurso, Donadon usou e abusou de expressões para atacar o MP e se colocar como vítima dos procuradores de Rondônia que apuraram o desvio de recursos na Assembleia Legislativa do Estado. "Entraram, arrombaram, invadiram", disse ele ao se referir à apreensão de documentos na Assembleia estadual. Mencionou ainda que, se os procuradores quisessem, poderiam ter investigado as empresas envolvidas, mas não o fizeram com o intuito de condená-lo. "O MP diz que fui cooptado. Quem cooptou foi o MP", afirmou.

Dada a quantidade expressiva de deputados que se considera vítima do ímpeto dos procuradores, não foi tanta surpresa a absolvição. Quem ouviu atentamente seu discurso concluiu na hora que muitos ali se identificaram. Isso, somado à vontade dos deputados de mandar um recado ao Supremo Tribunal Federal (STF) sobre quem manda no parlamento, foi como juntar a fome à ânsia de comer. Tanto é que, quem tiver curiosidade de verificar as ausências em plenário por partido, verá que não houve uma única legenda responsável pela absolvição. A média foi de 20% de ausências por partido, o que, grosso modo, tem relação direta com o percentual de deputados que têm alguma restrição ao Ministério Público.

Por falar em responsável...
Em conversas reservadas, muitos debitam a absolvição de Donadon na conta do presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves, que começou a sessão tarde da noite, numa semana em que o plenário ficaria restrito a debates na quinta-feira, sem que fosse obrigatório o registro da presença. Isso permitiu que muitos voltassem a seus estados ainda na quarta-feira à noite, contribuindo para as ausências.

Há quem diga ainda que a data para votar o processo de Donadon foi mal escolhida, uma vez que estamos a oito dias do Sete de Setembro e da perspectiva de uma grande manifestação. Agora, com a manutenção do mandato, há quem aposte em um aumento no número de pessoas dispostas a participar dos protestos por todo o país, especialmente, em Brasília. Talvez, se Henrique Eduardo Alves estivesse esperado passar o Dia da Independência ou a aprovação do voto aberto para efeito de cassação de mandato, o resultado tivesse sido outro.

Enquanto isso, no Planalto...
Quem observa tudo a distância é a presidente Dilma Rousseff. Dentro do governo e do parlamento, muitos consideram que o resultado em favor de Donadon é para desviar a atenção dos manifestantes no Dia da Pátria. Não se surpreendam se, em vez dos protestos serem dirigidos ao Poder Executivo, as palavras de ordem e os cartazes centrarem fogo sobre o Congresso Nacional. Aliás, leitor, pode reparar que, todas as vezes em que os congressistas decepcionam um pouco mais os eleitores, a turma do Planalto fica bem na fita. E, para sorte da presidente Dilma, quem comanda o parlamento é o PMDB, que dia sim e outro também se desgasta perante o eleitorado e fica mais dependente do governo para se manter no poder e eleger bancada. Mas essa é outra história.

Fonte: Correio Braziliense

Suicídio - Eliane Cantanhêde

Ninguém trata tão mal os políticos quanto os próprios políticos. Nem mesmo o mais ácido crítico teria tanta eficácia quanto Suas Excelências ao corroer a imagem de deputados, de senadores e, pior, do Congresso Nacional.

Há inúmeros adjetivos, além de expressões impublicáveis, para definir a decisão de quarta-feira à noite, absolvendo o presidiário Natan Donadon da cassação de mandato, mas um só basta: é inacreditável.

Os parlamentares que votaram a favor de Donadon, abstiveram-se ou ausentaram-se sem bons motivos deixam uma dúvida. Se eles são colegas de Donadon na corporação Congresso ou deveriam ser na corporação Papuda, onde o parlamentar-presidiário está preso, com uma condenação de mais de 13 anos por formação de quadrilha e desvio de dinheiro público, o popular roubo.

Para tentar contornar o clima de enterro da instituição, o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves, saca uma solução heterodoxa e sem respaldo no regimento, declarando o afastamento de Donadon e a convocação de seu suplente, Amir Lando. Está criada a seguinte situação: Donadon não é deputado, mas é; Lando é deputado, mas não é.

E, numa tentativa patética de reduzir as labaredas na opinião pública, o presidente do Senado, Renan Calheiros, desfralda uma "saída célere" anunciando a votação da PEC 18, que determina a perda automática de mandato, sem votação do Legislativo, em caso de condenação por improbidade administrativa e crime contra a administração pública.

Ah! Todos, claro, berram pelos salões, corredores e comissões contra o instituto do voto secreto para a cassação de parlamentares. Quem quiser se igualar a condenados, que vote pelo menos às claras.

Agora, porém, tudo isso é secundário, porque Inês é morta e Donadon está bem vivo. Mas, se alguém acha que isso pode ajudar Genoino, João Paulo Cunha e Costa Neto, está muito enganado. Ou será que não?

Fonte: Folha de S. Paulo

Maioria licenciosa - Dora Kramer

O que dizer diante da decisão da Câmara de preservar o mandato de Natan Donadon, ora em cumprimento de pena no presídio da Papuda (DF) por desvio de dinheiro público e formação de quadrilha?

Se ele mesmo se surpreendeu -"Não acredito!", reagiu - com o resultado da votação secreta (233 votos pela cassação, 131 pela absolvição e 41 abstenções), é de se ressaltar o caráter espantoso da decisão.

Parecia óbvio que suas excelências não cometeriam tal abuso: mais que uma agressão aos fatos, um desrespeito ao Judiciário que o condenou a 13 anos de prisão e uma afronta ao próprio Legislativo que admitiu, assim, a compatibilidade entre o exercício do mandato e a condenação penal.

Durante o dia a cassação era dada como certa. De noite, na sessão em que Donadon foi autorizado a tirar as algemas para apresentar sua defesa, nenhum discurso em prol da absolvição. Apurados os votos, contudo, emergiu a força da maioria silenciosa e, por ação e omissão, licenciosa.

Houve maior número de votos pela condenação, mas somadas as abstenções, os ausentes (108) e os favoráveis à preservação do mandato, chegamos a 280 deputados em apoio a Donadon contra 233. Faltaram 24 votos para o alcance do quórum necessário (257) à cassação.

O presidente da Câmara, Henrique Alves, fez o gesto inútil de declarar afastado do cargo o deputado que já estava afastado, confinado a uma cela desde o dia 28 de junho e, não obstante, será "excelência" ainda por um ano e meio. A maior parte de seus pares fez isso confiando na proteção do sigilo. Atingiram a todos, inevitavelmente nivelados por baixo.

O resultado não seria o mesmo se a votação fosse aberta. Nem a Câmara precisaria arcar com o inevitável acréscimo em seu robusto patrimônio de desgaste se tivesse optado pelo artigo da Constituição que determina a perda do mandato para os condenados em ações penais, e não pelo dispositivo que transfere a última palavra ao Legislativo,

As duas questões já poderiam ter sido resolvidas, caso houvesse interesse real em resolvê-las com a aprovação do fim do voto sigiloso em processos de cassação e da emenda que prevê a perda automática de mandato para condenados, ambas as propostas em tramitação no Congresso.

Mas, como ficou claro na exorbitante decisão da noite de quarta-feira, a maioria no Legislativo não está preocupada em corrigir nada. Aliás, está pouco ligando para coisa alguma que não seja a causa própria, neste caso a auto-proteção.

Está criado o precedente para que os condenados no processo do mensalão continuem deputados até o início de 2015, independentemente de o Supremo Tribunal Federal daqui até lá determinar ou não o cumprimento das sentenças.

Os quatro, José Genoino, Pedro Henry, João Paulo Cunha e Valdemar Costa Neto estavam ausentes da sessão, engrossando a tropa dos que ajudaram a absolver o condenado fazendo da Câmara merecedora do troféu vergonha alheia dò ano.

Fogo na roupa. O ministro das Minas e Energia, Edison Lobão, nega que haj a "fragilidade no sistema elétrico" ao mesmo tempo em que atribui o apagão de quarta-feira no Nordeste à queimada em uma fazenda no Piauí.

Uma contradição em termos, pois ou o sistema não é firme e seguro o bastante para evitar que nove Estados fiquem sem luz por causa de uma queimada ou a razão da queda de energia é outra.

Em dezembro, o diretor-geral do Operador Nacional do Sistema (GNS) e o secretário-geral do ministério disseram que a série de apagões País afora era provocada por raios.

Dias depois, a presidente Dilma Rousseff desmontou em público a versão: "Raio cai todo dia, se caiu o sistema, é falha humana. No dia que falarem que caiu um raio, vocês gargalhem".

Fonte: O Estado de S. Paulo