Caio Junqueira
BRASÍLIA - Os principais problemas da relação entre o Palácio do Planalto e sua ampla base aliada foram transpostos para os trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga o empresário Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira. PT e PMDB estão em constantes divergências sobre temas da comissão, os partidos médios têm demonstrando posições independentes das do governo, e a barganha política entrou em algumas transações.
A diferença é que nos plenários da Câmara e do Senado as emendas parlamentares, os cargos no Executivo e os apoios políticos nas eleições municipais deste ano permeiam as negociações para votar os projetos de interesse do governo. Já na CPI esses componentes passam pelas conversas sobre qual encaminhamento deve ser dado aos requerimentos de convocação de pessoas a depor e quebras de sigilo bancário, fiscal e telefônico dos suspeitos apontados pela Polícia Federal na Operação Monte Carlo.
O relato foi feito por um parlamentar petista com grande interlocução no Planalto. Sem mencionar nomes, ele disse que requerimentos de convocação do jornalista da "Veja" Policarpo Júnior e do procurador -geral da República, Roberto Gurgel, foram objeto desse tipo de proposta. "Ou o PT apoiaria o partido do interlocutor nas eleições, ou não haveria apoio a essas demandas petistas", afirmou, sob reserva, ao Valor.
Mas é na relação entre os dois principais partidos da base que a semelhança -e desavença- é maior. Os petistas reclamam da "falta de solidariedade" dos pemedebistas em suas reivindicações na CPI. Algo que, segundo eles, ocorreu na reunião administrativa da CPI ocorrida na quinta-feira.
Primeiro, o PT tentou aprovar um pedido para que a Polícia Federal remetesse à comissão as interceptações em que Policarpo é citado. A maioria dos parlamentares -PMDB à frente- se opôs. Na sequência, o senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES) se manifestou contra o requerimento que limitava a investigação da construtora Delta à região Centro-Oeste. Em sessões anteriores, o PMDB também se negou a apoiar a convocação de Gurgel -outro anseio petista. Na visão do PT, o partido do vice-presidente Michel Temer corre o risco de ficar isolado na comissão e ter problemas quando um dos seus correligionários estiver no foco das atenções.
Foi nesse contexto que o deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP) foi flagrado passando mensagem pelo celular ao governador do Rio, Sérgio Cabral (PMDB), dizendo: "A relação com o PMDB vai azedar na CPI, mas não se preocupe, você é "nosso" e nós somos "teu"". A mensagem, contudo, soou como prova de que há um acordo em curso entre PT, PSDB e PMDB para blindar os governadores de seus partidos. Respectivamente, Agnelo Queiroz (DF), Marconi Perillo (GO) e Cabral, todos ligados aos investigados na Operação Monte Carlo..
O PMDB reconhece a divergência com o PT na CPI e avalia que ela decorre do fato de a agenda do governo no Congresso não ser a mesma que os petistas estão tentando impor na CPI, para a qual têm sido acompanhados pelo senador Fernando Collor (PTB). "Temos compromisso de governo com o PT. Mas a agenda que está em debate na CPI não é de governo, é ideológica. E não somos obrigados a defender essa agenda", disse o vice-líder do PMDB na Câmara, Eduardo Cunha (RJ).
O líder do partido na Casa, Henrique Alves (RN), disse que a orientação que deu aos dois deputados de sua bancada indicados à CPI - Íris de Araújo (GO) e Luiz Pitiman (DF) - era de que os trabalhos não deveriam visar "vingança pessoal". "Não vamos cercear a imprensa. Qual a prova de ilícito grave que comprometa esse jornalista? Nenhuma. Esse foco não é o do PMDB", declarou.
Outros integrantes da bancada aumentam o tom contra os petistas. Relatam um desânimo geral na base com o tratamento privilegiado que o Planalto dá aos petistas na concessão de cargos e emendas parlamentares, o que fará com que nas eleições deste ano o PT dispare no número de prefeituras conquistadas. Reclamação, aliás, existente desde a entrada oficial do PMDB na base aliada, ainda no governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. "A manutenção dessa situação faz com que não nos empenhemos em ficar colocando a cara para os interesses do PT na CPI. Não vamos ser massa de manobra do PT. As bases deles estão sendo atendidas e as nossas agredidas", disse um pemedebista.
O PT identificou esse movimento e trabalha para revertê-lo. "O que falta na CPI é a formação de uma maioria. Falta um núcleo majoritário que combine as intervenções conjuntas e as leve adiante", afirmou o líder do PT na Câmara, Jilmar Tatto (SP). Segundo ele, a construção dessa convergência tem sido diária e deverá, em breve, surtir os efeitos desejados.
FONTE: VALOR ECONÔMICO
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