Maioria do STF condena José Dirceu e cúpula do PT por corrupção; Tribunal
conclui que homem forte de Lula comandou compra de votos ex-ministro afirma que
foi "linchado"
Sete anos e quatro meses após o ex-deputado Roberto Jefferson (PTB) revelar
à Folha a existência do mensalão, a maioria dos ministros do Supremo Tribunal
Federal concluiu que José Dirceu (PT), então ministro da Casa Civil e homem
forte do governo Lula, comandou o esquema de compra de votos no Congresso.
Chamado de "chefe da quadrilha" pela Procuradoria-Geral da
República, Dirceu foi condenado por corrupção ativa por 6 dos 8 ministros que
já votaram — faltam outros dois. Para eles, o petista foi o principal
responsável por corromper congressistas com o uso de dinheiro público.
Lewandowski e Dias Toffoli o absolveram.
Também foram considerados culpados o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, o
ex-presidente da sigla José Genoino e Marcos Valério, o operador do mensalão.
Dirceu alega ter sido "linchado" e ataca o STF, que, segundo ele,
agiu "sob forte pressão da imprensa". Para o petista, houve "um
juízo político e de exceção". "Vou acatar a decisão, mas não me
calarei", afirmou. Genoino disse que, "como inocente", está "revoltado".
Em reunião fechada, Lula conclamou petistas a reagir sempre que forem chamados
de mensaleiros.
Supremo condena
Dirceu por compra de voto no Congresso
Supremo alcança maioria para condenar ex-homem forte e dois ex-dirigentes do
PT. Petista afirma que foi "linchado"
BRASÍLIA - O Supremo Tribunal Federal condenou ontem por corrupção ativa o
ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, 66, e firmou o entendimento de que o
governo federal organizou o mensalão. Seis dos dez ministros do tribunal
apontaram Dirceu como o responsável pelo esquema que distribuiu milhões de
reais para parlamentares que apoiaram o presidente Luiz Inácio Lula da Silva no
Congresso em seu primeiro mandato (2003-2006). A existência do mensalão foi
revelada pelo ex-deputado Roberto Jefferson em entrevista à Folha em 2005. O STF
também condenou por corrupção o ex-presidente do PT José Genoino e o
ex-tesoureiro Delúbio Soares.
Plenário
acolhe tese de que ex-ministro criou o esquema
Felipe Seligman, Flávio Ferreira, Márcio Falcão, Nádia Guerlenda e Rubens Valente
BRASÍLIA - O plenário do Supremo Tribunal Federal reconheceu ontem a tese
central do mensalão, formulada pela Procuradoria-Geral da República.
Segundo a acusação, agora aceita pelo STF por 6 votos a 2, Dirceu engendrou
e colocou em prática, "entre quatro paredes" do Palácio do Planalto,
o esquema de compra de parlamentares com recursos públicos desviados e
empréstimos obtidos de forma fraudulenta pelas empresas de Marcos Valério
Fernandes de Souza e pela cúpula do PT.
A decisão derruba a tese, defendida desde 2005 pelo ex-presidente Lula e por
líderes do PT, e usada pelo partido para concentrar as acusações no então
tesoureiro da sigla, Delúbio Soares, de que tudo não passou de mero pagamento
de dívidas eleitorais por meio de caixa dois.
Com a sessão de ontem, já votaram pela condenação de Dirceu os ministros
Joaquim Barbosa, Rosa Weber, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Marco
Aurélio. Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli absolveram o ex-ministro, dizendo
não terem encontrado provas no processo.
Dirceu ainda será julgado pelo crime de formação de quadrilha. Os ministros
do STF só definirão as penas de Dirceu e dos outros condenados no fim do
julgamento.
A maioria seguiu o voto do relator Joaquim Barbosa, para quem Dirceu teve no
esquema "posição central, posição de organização e liderança da prática
criminosa, como mandante das promessas de pagamento de vantagens indevidas aos
parlamentares que viessem a apoiar as votações de seu interesse".
Autor do voto que selou a condenação de Dirceu, Marco Aurélio disse que
seria "subestimar a inteligência mediana" imaginar que Delúbio tenha
sido o maior responsável por engendrar o esquema.
"Ao chegar ao poder, o PT realmente buscou essa base de apoio no
Congresso, até mesmo se desfigurando", disse Marco Aurélio. "José
Dirceu realmente teve uma participação acentuada nesse escabroso
episódio."
O ministro avaliou os favores prestados por Marcos Valério a Maria Ângela
Saragoça, ex-mulher de Dirceu, para concluir que o ministro "valeu-se da
estrutura do grupo para resolver problemas particulares da ex-cônjuge".
Em seu voto, Cármen Lúcia ressaltou o papel do ex-ministro no objetivo
político do mensalão ao dizer que "a ligação de Valério com José Dirceu
fica comprovada".
Cármen fez um duro ataque ao fato de o advogado de Delúbio, Arnaldo
Malheiros Filho, ter admitido "o ilícito" do caixa dois ao fazer sua
defesa oral no STF, uma admissão que a ministra qualificou de fato
"inusitado e inédito na minha vida profissional".
"Acho estranho e muito, muito grave, que alguém diga com toda
tranquilidade que "ora, houve caixa dois". Caixa dois é crime. Caixa
dois é uma agressão à sociedade brasileira... Fica parecendo que isso pode ser
praticado e confessado e tudo bem".
Para Gilmar Mendes, o papel de Dirceu no esquema ficou claro: "Diante
do contexto, não há como não se chegar à conclusão que Dirceu não só sabia do
sistema de irregularidades de verba como contribuiu intelectualmente para sua
estruturação".
Na semana passada, os ministros Luiz Fux e Rosa Weber já haviam acolhido a
tese de que Dirceu foi o principal protagonista do esquema.
"Principal figura"
Ao denunciar Dirceu, a Procuradoria acentuou seu papel protagonista do
esquema. Em manifestação no plenário do tribunal no dia 3 de agosto, o
procurador-geral Roberto Gurgel declarou que se podia afirmar, "sem risco
de cometer a mais mínima injustiça", de que José Dirceu foi "a principal
figura" do apurado no processo.
"Foi o mentor da ação do grupo, o seu grande protagonista. Foi José
Dirceu quem idealizou o sistema ilícito de formação da base parlamentar de
apoio ao governo mediante o pagamento de vantagens indevidas aos seus integrantes
e comandou a ação dos demais acusados para consecução desse objetivo."
Também ontem, por maioria de votos, o tribunal decidiu absolver o
ex-ministro dos Transportes Anderson Adauto e Geiza Dias, ex-funcionária de
Marcos Valério.
O julgamento deste capítulo deve ser concluído hoje, com os votos dos
ministros Celso de Mello e Carlos Ayres Britto, presidente do tribunal.
Fonte: Folha de S. Paulo
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