segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Mensalão: Dilma diz que acata sentença

Em entrevista ao jornal espanhol "El País" a presidente afirmou que não discute as sentenças do STF no julgamento do mensalão, mas ressaltou que isso não significa "que ninguém neste mundo de Deus está acima dos erros e das paixões humanas". Dilma se disse "radicalmente" favorável ao combate à corrupção por "questão ética" e "critério político".

"Ninguém está acima dos erros e das paixões"

Dilma fala sobre julgamento do mensalão, diz que acata decisão do STF, mas faz ressalvas

UM JULGAMENTO PARA A HISTÓRIA

A presidente Dilma Rousseff falou pela primeira vez sobre o julgamento do mensalão pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que já condenou petistas como o ex-ministro da Casa Civil, José Dirceu, e o ex-presidente do partido José Genoino, entre outros. Em entrevista ao jornal espanhol "El País", publicada ontem, Dilma afirmou que acata e não discute as decisões do STF, mas ressaltou que "ninguém está acima dos erros e das paixões humanas", sobretudo as relacionadas à política.

A entrevista foi concedida pela presidente no último dia 12, quando foram anunciadas as penas para Dirceu e Genoino pela participação no mensalão. Apontado como o chefe do esquema, Dirceu foi condenado a dez anos e dez meses de prisão, além do pagamento de R$ 676 mil.

- Como presidente da República, não posso me manifestar sobre as decisões do Supremo Tribunal Federal. Acato suas sentenças, não as discuto. O que não significa que ninguém neste mundo de Deus está acima de erros e das paixões humanas - afirmou Dilma, que foi questionada na entrevista se a política não estaria entre as paixões citadas por ela. - Talvez estas sejam as maiores - acrescentou.

Presidente cita combate à corrupção

Durante a entrevista ao "El País", a presidente Dilma fez questão de ressaltar o combate à corrupção no Brasil e o controle dos gastos públicos por parte do governo federal. Citou ações que foram implantadas na gestão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

- Poucos governos fizeram tanto pelo controle dos gastos públicos, como o do presidente Lula. Abrimos o Portal da Transparência, com todas as contas públicas disponíveis para quem quiser consultá-las. Nós também fizemos uma lei de acesso à informação que obriga a divulgação dos salários dos dirigentes. Estou radicalmente a favor do combate à corrupção, não só por uma questão ética, mas por um critério político.

Dilma ressaltou estar tratando da corrupção dos governos e não das empresas:

- Um governo é 10.000 vezes mais eficiente quanto mais controla, mais fiscaliza e mais impede.

Na entrevista, concedida a Juan Luis Cebrián, fundador do "El País", foi abordado que, quatro décadas depois do "Maio de 1968", muitos líderes dos movimentos de resistência em todo o mundo passaram a ocupar posições de poder estratégicas e importantes na economia, na política e na cultura, e hoje são objetos de protestos semelhantes aos que encabeçaram no passado. O jornal questionou se valeu a pena tudo aquilo.

- Necessariamente a gente evolui. Em dezembro de 1968, eu não estava envolvida com a política e nem havia me incorporado à clandestinidade. Então, aconteceu o que se conhece no Brasil como o golpe dentro do golpe, um endurecimento da ditadura militar - afirmou a presidente, referindo-se à instituição do AI-5. - A partir disso, qualquer pessoa da minha geração que tivesse a menor vontade democrática era violentamente perseguida. De modo que, desde o meu ponto de vista, sim, valeu a pena e muito - respondeu.

A presidente considerou que uma parte da juventude brasileira foi generosa ao lutar em favor do país, mesmo que alguns erros tenham sido cometidos.

- Pode ser que aqueles métodos não conduzissem a nada, não tivessem futuro e constituíssem uma visão equivocada sobre a saída da ditadura. Mas nas pessoas havia um sentimento de urgência, acreditavam que no Brasil não poderia haver uma reforma democrática. Com os anos, comprovei nosso excesso de ingenuidade e romantismo e nossa falta de compreensão da realidade. Não percebíamos que esta era muito mais complexa, que podiam haver diferentes soluções de futuro - defendeu.

- Meu tempo na prisão me ajudou a entender que o regime militar não sobreviveria porque não podia deter, torturar e matar todos os jovens - ressaltou.

Indagada se junto às transformações econômicas o Brasil manterá seu sistema político, Dilma respondeu que um dos trunfos da democracia brasileira é sempre ser rica em termos de debate:

- Estamos acostumados a discutir em torno de uma mesa, é um hábito nosso. Isso chamou a atenção de Bill Clinton ( ex-presidente dos Estados Unidos). Em alguns países pode causar estranheza ou pavor que a presidente da República converse com as centrais sindicais. Para nós, é normal. Às vezes estamos de acordo, às vezes, não.

Ainda ao abordar temas ligados à política, Dilma citou o presidente do Uruguai, José Mujica, que lutou contra a ditadura em seu país. A presidente contou que, durante um encontro com ele, Mujica afirmou que ambos são representantes de uma "geração que lutou muito e cometeu alguns atos estúpidos". Nesse encontro, Mujica disse que ele teve a época da política, a da paixão, e, quando se tornou presidente, estava na época das flores (que gosta de plantar).

- Essa é também a minha época, estou na época das flores - disse Dilma ao encerrar a entrevista.

Dilma viajou à Espanha para participar da 22ª Cúpula Ibero-Americana, em Cádiz, encerrada no último sábado. Sem compromissos oficiais ontem, a presidente aproveitou a manhã de domingo para visitar o Museu de Arte Thyssen-Bornemisza. Dilma estava acompanhada do ministro da Educação, Aloizio Mercadante; da secretária de Comunicação Social, Helena Chagas; e do embaixador do Brasil na Espanha, Paulo César de Oliveira Campos. Após a visita, Dilma foi a Toledo, onde almoçou. A presidente retornou à tarde para Madri e passou o restante do domingo descansando no hotel.

A presidente Dilma abre sua agenda oficial de hoje com um encontro na Casa do Brasil com estudantes que integram o programa "Ciência sem Fonteiras" e que participam do ProUni. Em seguida, se reúne com o primeiro-ministro espanhol Mariano Rajoy, no Palácio de Moncloa.

Após a reunião, Dilma participa de um almoço oferecido pelo rei Juan Carlos I e a rainha Sofia, na sala de banquetes do Palácio Real. A presidente ainda participará da abertura do seminário "Brasil no caminho do crescimento", promovido pelos jornais "El País" e "Valor Econômico". O evento vai analisar o crescimento econômico do país e os rumos escolhidos no enfrentamento da crise que atingiu o mundo todo. De acordo com a Presidência, Dilma retorna hoje para Brasília.

Fonte: O Globo

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