“O modelo da arte que assume um
compromisso político teve em Brecht uma referência. Brecht almejava
desestabilizar a percepção do espectador para que, no espaço da obra, ele visse
como absurdo aquilo que considerava normal, produzindo assim alguma
transformação em seu espírito, que poderia ser canalizada em energia para ações
transformadoras. Esse raciocínio é muito problemático, claro. “Desestabilizar a
percepção” era um princípio surrealista que Brecht tentou transmutar em
pedagogia política. Isso nunca produziu efeitos políticos verificáveis, só
produziu uma certa concepção do que uma “arte política” deveria ser. Mas há
outro modelo de compromisso político, que está um pouco esgotado mas precisa ser
renovado, que concebe o trabalho político do artista como a investigação de
determinado aspecto da realidade que está enquadrado, estereotipado ou
formatado pelo senso comum, na tentativa de devolvê-lo à realidade sensível.
Esse modelo é importante para pensarmos na arte não como uma pedagogia ou
explicação do mundo, e sim como uma reconfiguração do mundo sensível. Vejo isso
no trabalho do cineasta português Pedro Costa, por exemplo. Em seus filmes com
comunidades de imigrantes em Portugal (como “Juventude em marcha” e “O quarto
de Vanda”), ele não está interessado apenas em descrever a miséria ou denunciar
a exploração, mas sim em tornar sensível esse universo, em restituir a força da
experiência e da palavra aos excluídos”
Jacques Rancière, filósofo francês Em entrevista (embaixo)
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